Sexo, tragédias e muitos tumores: a receita de ‘Grey’s Anatomy’ para manter o drama
Escritores “jogam o jogo de piorar, deixar mais triste” agora que o seriado médico de sucesso entra na 21ª temporada
A dra. Meredith Grey quase morreu sete vezes. O hospital onde ela trabalha enfrentou uma bomba, um terremoto, tiroteios e uma inundação. Pacientes e funcionários foram diagnosticados com mais de 140 tumores.
Durante quase duas décadas no ar, os roteiristas do seriado de TV de sucesso “Grey’s Anatomy” tiveram de bolar um fluxo aparentemente interminável de casos médicos na vida complicada, sensual e muitas vezes trágica de seus personagens.
O drama é um queridinho da TV aberta americana e também da era do streaming, com cerca de 300 horas de conteúdo. Seriados de sucesso também “maratonáveis” e com apelo para o humor como “Friends” e “Seinfeld” terminaram há muito tempo, mas “Grey’s Anatomy” continua a produzir novos episódios, iniciando em sua 21ª temporada em 26 de setembro nos Estados Unidos.
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“Casos médicos e pacientes insanos” são uma constante, disse a showrunner Meg Marinis, que se juntou à equipe de roteiristas como assistente em 2006. Quadros de mensagens revestem as paredes de um bangalô em Los Angeles, onde cerca de uma dúzia de roteiristas, dois assistentes, um pesquisador e três médicos se reúnem em um estúdio para mapear a melhor forma de combinar sangue e bisturis com encontros românticos e amizade.
“Grey’s Anatomy” estreou em 2005, narrando as façanhas de cirurgiões estagiários ultracompetitivos em um hospital fictício de Seattle. O seriado começa depois de um caso de uma noite entre Grey e um estranho que ela conheceu no bar, que acaba sendo um neurocirurgião casado que trabalha no mesmo local onde ela é uma novata.
Desde então, os roteiristas enfrentam um desafio constante de como sujeitar os personagens à quantidade certa de mágoa, obstáculos profissionais e perdas.
Desde 2020, Grey’s apareceu 122 vezes na lista semanal feita pela empresa de classificação Nielsen dos dez programas de streaming mais assistidos. Só quatro programas chegaram nos três dígitos.
“Vamos ter sangue. Vamos ter uma conversa assustadora sobre pessoas morrendo e, como estamos falando sobre ‘Grey’s Anatomy’, então haverá sexo”, disse Marinis.
Os personagens se casam em segredo, perdem amigos, revivem pacientes terminais, fazem julgamentos precipitados, estabelecem conexões no almoxarifado e dançam nas salas de descanso. Os pacientes sangram, convulsionam, têm paradas cardíacas e morrem — às vezes quando parecem estar a caminho da recuperação.
“Você é um monstro”
Quando os roteiristas têm a ideia de uma nova reviravolta para um personagem, eles “jogam o jogo de piorar, deixar mais triste” a situação, disse Marinis.
“Às vezes pensamos: ‘por que você diria isso! Isso é horrível! Você é um monstro.’ Estamos todos tentando superar uns aos outros”, contou ela.
Mais recentemente, os escritores tiveram que se adaptar à decisão da estrela Ellen Pompeo de reduzir o número de episódios em que ela aparece.
Eles passam cerca de um mês escrevendo cada episódio, seguido por três semanas de produção e duas semanas de edições. Um documento chamado “Bíblia de Grey’s Anatomy” acompanha todos os enredos, narrações, casos médicos e temas abordados.
Eles tentam encontrar um equilíbrio para manter o show dramático sem causar estragos aos personagens. Um personagem principal desmaiou na sala de cirurgia no final da 19ª temporada, por exemplo, então os roteiristas optaram por uma turbulência emocional no final da temporada seguinte.
Choque instantâneo
“Tentamos não machucar muito nem deixar nossos personagens muito doentes”, disse Marinis. “É um recurso fácil porque é um choque e um drama instantâneos quando um personagem corre o risco de morrer, mas tentamos não fazer isso com muita frequência.”
Elizabeth Washington, de 27 anos, começou a assistir ao seriado em abril depois de terminar um relacionamento e assistiu a 19 temporadas em cinco meses. Ela viu a personagem-título quase morrer repetidamente, sobrevivendo a um acidente de avião, quase se afogando na água gelada de Seattle e tapando com o dedo o buraco no corpo de um homem para impedir que uma bomba detonasse.
“Ela tem a vida mais traumática de todas”, mas é resiliente, comentou Washington, que é de Grand Rapids, no Michigan.
As plataformas de streaming deram início a uma base de fãs mais jovem, alguns dos quais não estavam vivos quando o programa foi ao ar pela primeira vez na ABC. Os episódios estreiam na ABC e estão disponíveis no Hulu nos EUA no dia seguinte; as temporadas anteriores estão acessíveis na Netflix e no Hulu.
As frases dos personagens, como “seriously” (sério) a “pick me, choose me, love me” (me veja, me escolha e me ame) e McDreamy, são hoje parte da cultura pop, com memes de cenas famosas ganhando nova vida nas plataformas de rede social.
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Ashley Boren, de 28 anos, de Norman, em Oklahoma, começou a assistir ao programa com sua mãe na estreia, e assistiu novamente às primeiras dez temporadas várias vezes.
“Se você está tendo um dia difícil e quer desligar o cérebro ou assistir pelas partes engraçadas, isso é possível. Ou se você quiser chorar, também dá”, afirmou ela.
Em todos os serviços de streaming da Disney em todo o mundo, “Grey’s Anatomy” acumulou 3,6 bilhões de horas de visualização. Grey’s atraiu mais horas de exibição entre os assinantes da Netflix americana do que qualquer outro programa na plataforma entre o primeiro trimestre de 2021 e os primeiros três meses deste ano, de acordo com a empresa de análise Digital I.
Algumas ideias para as condições do paciente — como uma ainda no começo da série em que os médicos salvam um adolescente preso em um bloco de cimento — vêm diretamente de Shonda Rhimes, a criadora série, conhecida por outros programas viciantes, como “Bridgerton”, “Scandal” e “How to Get Away With Murder”.
Para manter a medicina do programa atualizada, o drama tem uma bolsa para residentes cirúrgicos desde 2013. Residentes de todo o país podem se inscrever para trabalhar na sala de redação de “Grey’s Anatomy” e receber crédito para sua residência cirúrgica como consultor do seriado.
“As pessoas encontram novas maneiras de se machucar todos os dias”, disse Marinis.
— Sarah Krouse contribuiu para este artigo.
traduzido do inglês por investnews