Na agenda de inovações do Sistema Financeiro Nacional (SFN), o Open Banking é um das apostas do Banco Central para levar mais alternativas de produtos e serviços financeiros a um custo menor. Além disso, a intenção é dar mais autonomia aos clientes sobre seus dados financeiros. Afinal, ele poderá escolher de que forma e com quais empresas vai compartilhar essas informações pessoais.
De olho na implantação do Open Banking no Brasil, o InvestNews preparou este guia para explicar tudo o que está rolando sobre esta nova ferramenta. Confira a seguir:
O que é Open Banking?
O Open Banking, ou sistema financeiro aberto, é um conjunto de práticas e tecnologias que permitem o compartilhamento das informações de um cliente entre instituições financeiras autorizadas pelo Banco Central (BC).
A medida surge na linha de inovações da Agenda BC, que tem como pilares a inclusão financeira, competitividade e transparência. A expectativa do BC é que o Open Banking crie um o ecossistema financeiro mais competitivo e eficiente entre as instituições, além de possibilitar a criação de novos modelos de negócio e serviços que beneficiam o consumidor.
O Brasil não é o único país a pensar um sistema financeiro aberto: ao redor do mundo, países como Austrália, México, Japão e Singapura caminham em direção ao Open Banking. Além disso, o Reino Unido concretizou sua implementação em 2018.
O que muda com o Open Banking?
O sistema bancário tradicional restringe as informações do cliente à instituição financeira à qual ele é vinculado. Na prática, é como se os dados dessa pessoa fossem do banco, e não dela própria. Esse modelo dificulta a oferta de serviços mais baratos e personalizados porque apenas uma instituição conhece o perfil e as necessidades do cliente.
Segundo Arthur Igreja, especialista em tecnologia, inovação e finanças, esse sistema bancário é “assimétrico para o lado das instituições financeiras, e quem sai perdendo é o consumidor”.
Ele acredita que o Open Banking equilibra essa assimetria de informações ao garantir ao cliente a portabilidade dos dados. Caso o usuário queira checar ofertas e serviços de outras instituições financeiras, ele pode requisitar que o banco no qual tem conta compartilhe as informações necessárias com outra instituição autorizada.
Nedyr Pimenta Filho, diretor de Inovação da Provider IT, explica que o Open Banking só se tornou possível depois da definição da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que diz que o indivíduo é dono dos próprios dados e tem o direito de solicitar o compartilhamento quando achar necessário.
Quais os benefícios do Open Banking?
Personalização de serviços
Segundo Nedyr, a personalização de produtos a partir do Open Banking será vantajosa tanto para a instituição quanto para o cliente. De um lado, a instituição terá menos risco ao oferecer um produto, já que entenderá mais rápido o perfil do consumidor. Do outro, o cliente terá um escopo maior e mais adequado de produtos financeiros disponíveis.
O diretor afirma que, hoje, uma grande parcela da população é desbancarizada porque a estrutura bancária de massa existe para atender a maioria das pessoas, sem distinções – com isso, alguns grupos são deixados de fora. Com a possibilidade de personalização desses serviços, pequenas empresas têm a oportunidade de atender esse mercado consumidor deixado de lado.
Competitividade
Estabelecendo o sistema financeiro aberto, o Banco Central atua como um catalizador de mudança no mercado brasileiro, que hoje é formado por uma alta concentração de bancos. “Se ele fosse esperar o mercado se organizar, ia demorar muito. Então ele foi um agente de mudança e estabeleceu o Open Banking”, explica Nedyr.
Com a portabilidade dos dados, o cliente poderá alocar seus recursos e consumir serviços da instituição que lhe for mais vantajosa, aumentando a corrida das empresas pela atenção do consumidor.
Novos negócios e serviços
Como vimos, a personalização abre espaço para novos modelos de negócio no atendimento de um público cada vez mais nichado. Além disso, outra vantagem do Open Banking para as empresas é a redução dos custos de coleta e documentação de dados dos usuários.
São muitas as novas possibilidades. Arthur Igreja aponta, por exemplo, o possível surgimento de marketplaces de serviços financeiros e comparadores de taxa. Isso porque empresas no setor poderão operar produtos de terceiros, saindo do formato vertical e institucionalizado de operação.
“A Amazon, por exemplo, vende produtos dela mesma e de terceiros. Assim, o cliente tem relação com a Amazon, mas o produto não é necessariamente dela. Soluções como essa podem ser possíveis para o mercado financeiro com o Open Banking”, explica.
As vantagens para o consumidor, segundo ele, são portfólio e oferta de preços maiores e no mesmo lugar.
Como funciona o Open Banking na prática?
Suponhamos que Bruno seja um bom cliente do Banco A, com compromissos
honrados e pagamentos sempre em dia. Mas, no sistema bancário tradicional, se
Bruno quisesse um empréstimo do Banco B, de nada adiantaria o histórico de bom
pagador com o Banco A. Nesse cenário, o cliente precisaria passar por experiências
com valores pequenos iniciais até criar uma relação de confiança com o Banco B,
para só então ter acesso a empréstimos maiores da instituição.
Com o Open Banking, esse caminho fica mais curto: Bruno poderia requisitar ao Banco A o compartilhamento de seu histórico financeiro com o Banco B. Assim, ele teria acesso ao crédito de forma mais rápida e cômoda.
Dados compartilhados
- Dados cadastrais: nome, CPF/CNPJ, telefone, endereço
- Dados transacionais: renda, perfil de consumo, conta corrente, entre outros.
- Outros dados sobre produtos e serviços prestados ao cliente, como informações sobre empréstimos ou financiamentos, por exemplo
Passo a passo do compartilhamento de dados
O compartilhamento acontece sempre a pedido do cliente, que deve solicitá-lo pela plataforma da instituição que receptora dos dados. Segundos após a solicitação, a instituição em posse dos dados confirma com o cliente se ele de fato requereu o compartilhamento. Depois da confirmação, também em segundos, os dados são compartilhados entre as duas instituições.
Quais instituições participam?
Somente as instituições autorizadas pelo BC podem participar do ecossistema de compartilhamento. Entre elas, a regulamentação prevê participantes obrigatórios e voluntários.
As maiores instituições financeiras, classificadas como S1 (com porte igual a 10% ou mais do PIB do país ou com atividade internacional relevante) e S2 (com porte entre 1% e 10% do PIB), são obrigadas a participar do Open Banking. Demais instituições, como bancos de menor porte, instituições de pagamento e fintechs, participam de forma voluntária.
Até junho de 2021, 1001 instituições estavam cadastradas no diretório de participantes.
Instituições classificadas como S1
- Bradesco
- Banco do Brasil
- BTG Pactual
- Caixa Econômica Federal
- Itaú
- Santander
Instituições classificadas como S2
- Banrisul
- Banco do Nordeste do Brasil
- BNDS
- Citibank
- Credit Suisse
- Safra
- Votorantim
Quando começa o Open Banking?
A implementação plena do sistema foi adiava mais uma vez pelo BC e o Conselho Monetário Nacional (CMN) na quarta-feira (24). Antes, a operação havia sido dividida em 4 fases ao longo de 2021. Agora, a integração de todos os meios de pagamento ao Open Banking será feita de forma escalonada até 30 de setembro de 2022, com a terceira fase subdividida em várias etapas.
O adiamento se deu por conta da necessidade de testagem do sistema. Veja
o cronograma:
Fase 1 (01/02/2021)
Neste primeiro momento, nenhum dado do cliente foi compartilhado. As instituições
participantes começaram a disponibilizar informações padronizadas sobre os seus
canais de atendimento e os produtos e serviços bancários que oferecem.
Fase 2 (13/08/2021)
A partir daqui os clientes estão em posse dos seus dados e podem, caso queiram, solicitar o compartilhamento entre instituições participantes. As instituições, com o consentimento do cliente, estarão aptas a enviar e receber dados cadastrais (como nome, CPF, endereço etc), informações sobre transações bancárias, produtos contratados, entre outros.
Fases 3 e 4 (escalonadas)
Consumidores passam a ter acesso a serviços de pagamento e crédito de
outras instituições financeiras, bem como uma gama maior de produtos
financeiros elegíveis para compartilhamento. É a partir daqui que o usuário pode
“construir seu próprio banco” a partir da integração de produtos financeiros de
instituições diferentes.
(30/08/2021) Início do compartilhamento de serviços de transferências pelo PIX.
(15/12/2021) Troca de
informações entre as instituições sobre os outros produtos financeiros, como
câmbio, investimentos, previdência e seguros. Aqui, o Open Banking se amplia e
passa a chamar Open Finance.
(15/02/2022) Compartilhamento
de serviços de transferências entre contas do mesmo banco e TED.
(30/03/2022) Compartilhamento
do envio de propostas de operações de crédito a clientes que aderirem ao Open Banking.
(31/05/2022) Compartilhamento
de dados de clientes sobre as outras operações financeiras, como câmbio,
investimentos, previdência e seguros.
(30/07/2022) Compartilhamento
de serviços de pagamento por boleto.
(30/09/2022) Compartilhamento de serviços de débito em conta.
O Open Banking é seguro?
Como vimos, o Open Banking nasce a partir da LGPD. Isso significa que, além de considerar o cliente titular dos seus dados, o Open Banking também garante que o uso dessas informações deve ocorrer sempre com finalidades determinadas, prévia e claramente consentidas.
Assim, o consentimento do usuário precisa ser explicito, abrangente e com prazo de validade determinado (o período máximo é de 12 meses).
Além disso, as instituições participantes também atuarão tendo em vista a Lei do Sigilo Bancário, que proíbe a venda de informações dos clientes, bem como o compartilhamento com instituições não participantes do Open Banking.
Em termos de segurança da tecnologia, Nedyr explica que o que torna o Open Banking seguro são as essas diversas camadas de proteção aplicadas ao sistema. Como o modelo brasileiro de Open Banking está seguindo o que foi feito no Reino Unido, algumas otimizações foram feitas a partir dos erros e acertos do modelo inglês.
“O
processo é: as pessoas tentam invadir e você vai melhorando. A princípio, o Brasil
está pulando algumas etapas de falhas porque a gente está pegando um modelo (do
Reino Unido) e melhorando. É muito risco? Não. É um risco que o mercado já tem
em outros lugares”.
Segundo o Banco Central, todas as
fraquezas potenciais nos processos de comunicação foram identificadas e corrigidas.
E como o Open Banking impacta a vida do investidor?
De acordo com Igreja, o mundo dos investimentos será diretamente impactado pelo novo ecossistema financeiro. A expectativa do especialista é que o número de novos investidores no país cresça significantemente: “o brasileiro ainda investe pouco, o Open Banking vai catapultar o número de novos investidores”, afirma.
Ele destaca principalmente a ampliação da capacidade de comparação, já que, hoje em dia, o investidor ainda depende muito da figura de assessor de investimentos para aplica o seu dinheiro. Com autonomia maior para o cliente, pode-se esperar taxas de administração caindo e novos players no mercado.