As icônicas phonebooths londrinas estão virando uma nova tradição paulistana, mas fora das calçadas e dentro dos escritórios. Com pelo menos um metro de largura e de profundidade por 2,20 metros de altura, acabamento em madeira, melamina de baixa pressão ou vidro, essas cabines podem ter parede única ou dupla e diversos tamanhos, para atender às novas necessidades do trabalho presencial.
E elas estão aparecendo com urgência acentuada à medida que os prédios comerciais voltam a ser frequentados diariamente, obrigando as empresas a repensarem o CEP com melhor custo-benefício e o desenho das lajes alugadas. O trabalho presencial está de volta, ainda que muitas empresas adotem flexibilidade nas atividades e modelos híbridos.
Nesse cenário, a cabine, batizada lá fora de “hush office”, se transformou num oásis de silêncio laboral no meio do frenesi do trabalho coletivo.
Mas, calma: essa não é uma reportagem sobre “o fim do home office”. É sobre como o espaço dos escritórios está mudando e como a volta do presencial já afeta preços em São Paulo.
Paula Casarini, CEO da consultoria Colliers Brasil, empresa de serviços imobiliários, rejeita a dicotomia “remoto x in loco“. Na empresa que ela comanda, com sede no Brooklin (zona sul de São Paulo), é possível cumprir algumas tarefas de casa e escolher horários fora do pico para o deslocamento até o escritório.
A executiva explica que o futuro dos negócios vai passar pelo equilíbrio desse pêndulo.
“Toda mudança no mercado de escritórios, de alguma forma, passa por todo esse dilema de como é que o meu pessoal vai usar o escritório.”
paula casarini, ceo da colliers brasil
Se antes da quarentena o escritório se resumia a mesas coletivas, salas de reunião e o cantinho do café, agora, o design vai incluir salas para reuniões internas, outras para atendimento ao cliente, espaços abertos ou fechados para trabalhar concentrado, sempre em quantidades variáveis. “Esse mix não está definido e não vai ser definido nem no médio ou longo prazo”, diz ela.
No caso das cabines, o conceito já era visto em feiras europeias desde ao menos 2014, mas entrou no Brasil há quatro anos e ganhou força com o retorno do trabalho presencial. Augusto Bomfim, um dos sócios da fabricante Mcad Offices, diz que hoje vende entre 12 e 15 dessas cabines todo mês. Para o modelo de entrada, com espaço para uma pessoa, o valor começa em R$ 19 mil.
Segundo Bomfim, a cabine entra no conceito do “open space”, em alta atualmente e que inclui outros produtos, como os sofás com laterais altas, que permitem maior isolamento.
Sangue novo no coração financeiro
A mudança no mobiliário está relacionada não só ao novo modelo de trabalho, mas à atenção das empresas aos custos de locação de imóveis comerciais e à menor oferta em algumas áreas disputadas, especialmente em São Paulo.
No fim de abril, o relatório trimestral da Colliers mostrou que a soma da área de escritórios alugada entre janeiro e março em São Paulo foi a maior dos últimos oito anos, superando inclusive a dinâmica do mercado antes da pandemia.
Nas veias mais importantes do coração financeiro – o entorno da Avenida Brigadeiro Faria Lima –, a taxa de vacância abaixo de 10% já começa a puxar o preço médio para cima:
Considerando que esse mercado tradicionalmente é mais aquecido na segunda metade do ano, o recorde do primeiro trimestre é um sinal forte de que a retomada do trabalho no escritório seguirá como tendência ao longo de 2024.
A SiiLA, empresa de monitoramento do mercado imobiliário comercial (incluindo escritórios, condomínios logísticos e shoppings), ressalta que a dinâmica varia de acordo com a região. Na Faria Lima, coração financeiro de São Paulo, por exemplo, a recente alta do preço médio levou à saída de várias grandes empresas, que entregaram escritórios ali para gastar menos com aluguel em regiões como as avenidas Rebouças e Chucri Zaidan, e mesmo na região da Avenida Paulista.
VEJA MAIS: Assista à série “Brasil em Wall Street”
Outros indicadores também reforçam a retomada da ocupação nos escritórios. Um levantamento da LCA Consultores com os dados mais recentes do Novo Caged mostra que, das dez atividades que mais geraram vagas formais em abril, quatro estão diretamente ligadas à volta das empresas.
No topo do ranking estão os serviços de escritório e apoio administrativo, com mais de 62 mil novos postos de trabalho no acumulado de 12 meses. Somados aos serviços para apoio aos edifícios, como as equipes de limpeza e segurança, o saldo chega a cerca de 92 mil vagas no período, a quarta alta mensal consecutiva para o acumulado de 12 meses.
Paula Casarini diz que não é só a taxa de escritórios vagos que está caindo: a quantidade de pessoas de fato frequentando regularmente os imóveis já alugados também cresceu de uma média de 35% da lotação máxima para, no fim de 2023, superar os 50% em nove de cada dez imóveis no inventário.
E o trânsito paulistano às sextas-feiras, o dia preferido do home office e que no ano passado ficou mais leve do que em outros dias úteis, em 2024 voltou ao topo, empatado com as quintas-feiras, segundo levantamento até 19 de junho.
Retorno para o ‘new office‘
A REAG Investimentos, consultoria de gestão de ativos, é uma das empresas que expandiram sua ocupação física nesse ano no coração financeiro de São Paulo. Além de já ser locatária de um conjunto no Plaza Iguatemi Business, uma das torres mais clássicas da Faria Lima, ela agora tem um segundo endereço a 200 metros de distância: é o novo Edifício Bothanic, uma construção de quase 2,4 mil metros quadrados, minimalista e arborizada, que absorveu cerca de 100 funcionários de uma empresa recém-adquirida pela REAG.
Ele é um exemplo daquilo que o mercado passou a chamar de Boutique Offices. Sabe um “hotel boutique”? Então. É a mesma filosofia: prédios pequenos, com ambientes bem personalizados. A imagem abaixo fala por mil palavras:
O contrato de aluguel foi assinado em dezembro, o escritório novinho em folha ficou pronto em junho e já está repleto de funcionários. Diretor e sócio da REAG, Silvano Gersztel já havia trocado o trabalho remoto pelo Plaza Iguatemi no fim da quarentena, em 2022, com os demais funcionários da consultoria. Mas diz que o novo endereço é tão agradável que decidiu descolar um segundo office no Bothanic.
“É tão bonito que tenho me dividido entre os dois”, disse ele, ressaltando que a empresa já planeja usar o espaço aberto no térreo para construir um café ou restaurante, considerando que a circulação maior de pessoas de volta ao bairro também aqueceu a demanda por serviços na região. “A gente quer fazer um espaço híbrido, aberto para a rua, uma coisa que dialogue com a cidade.”
Do lado de lá das catracas, na área restrita aos funcionários, tanto o escritório recém-projetado quanto o tradicional da REAG já seguem as novas tendências do trabalho presencial.
“A grande novidade são as salas para conference call. Isso veio para ficar, foi adaptado tanto na sede atual quanto nesse novo lugar.”
Silvano Gersztel, diretor e sócio da reag investimentos