Com US$ 125 milhões (cerca de R$ 695 milhões) em novos investimentos em gás natural, a PetroReconcavo, a mais antiga das petroleiras independentes, acelera a consolidação do insumo como um segundo pilar estratégico de sua operação, garantindo maior previsibilidade de receita. Em paralelo, a petroleira do Recôncavo Baiano também vem investindo para diversificar as rotas de escoamento de petróleo e reduzir a dependência de poucas refinarias.
O pacote voltado ao gás inclui a construção de uma planta de processamento na Bahia, em um investimento total de US$ 60 milhões, e a aquisição de 50% da infraestrutura da Brava Energia no Rio Grande do Norte, por US$ 65 milhões — estrutura que reúne unidades de tratamento, gasoduto e contrato firme de fornecimento até 2030.
“Hoje o gás já representa cerca de 40% da nossa produção e da receita anual. Isso nos dá previsibilidade e fortalece nosso caixa, mesmo com o Brent oscilando”, afirma o CFO Rafael Procaci, em entrevista ao InvestNews. No primeiro semestre deste ano, a PetroReconcavo produziu cerca de 4,8 milhões de barris de óleo equivalente (boe), sendo 3,1 milhões em petróleo e 1,7 milhão em gás natural.
Atualmente, a companhia opera 57 concessões — 55 sob sua gestão direta — e mais de 700 poços ativos. De 2019 a 2025, sua produção média diária saltou de 4,5 mil para 26,9 mil barris, entre crescimento orgânico e aquisições.
Para reduzir riscos operacionais, a companhia também tem desenvolvido rotas alternativas de escoamento de petróleo. A estratégia inclui a assinatura de memorandos de entendimento (MoUs, em inglês) com empresas como Ultracargo, Shell e o Porto de Pecém para o transporte do óleo, além de um contrato com a Dislub Equador voltado à tancagem e bombeio de petróleo no porto cearense.
Os valores dessas iniciativas não foram divulgados, mas o objetivo da empresa é claro: ganhar flexibilidade logística, ampliar sua base de compradores e, eventualmente, abrir caminho para exportações. “O objetivo é não depender de poucos compradores ou de uma infraestrutura específica que, se parar, comprometa toda a produção”, prossegue Procaci.
Novo gás
A virada estratégica da PetroReconcavo para o gás ganhou fôlego com a aprovação do Novo Marco Legal do Gás, em 2021. A nova lei buscou romper o monopólio da Petrobras no setor e abrir espaço à concorrência, estimulando investimentos privados em produção, processamento e comercialização.
Com esse ambiente regulatório mais favorável, a empresa passou a atuar com mais autonomia em toda a cadeia do gás natural. Como resultado, a participação do insumo na receita total saltou de 7% para os atuais 40%, impulsionada por contratos de longo prazo com concessionárias e grandes consumidores.
Na Bahia, a nova planta de processamento deverá ser concluída em 2027, a depender do licenciamento. Já no Rio Grande do Norte, a aquisição de metade da planta da Brava Energia marca o avanço da companhia no midstream (tratamento e transporte de gás). “Com essa aquisição, passamos a ter controle sobre os investimentos e sobre a gestão da infraestrutura. Isso nos permite planejar com mais eficiência e garantir a entrega do gás no longo prazo”, diz Procaci.
Segundo ele, essa estratégia ajuda a suavizar a volatilidade do petróleo e garante mais previsibilidade no caixa. Desde o pico de preços do óleo em 2022, o barril tem oscilado em patamares mais baixos, atualmente perto da média histórica de US$ 70 — nível ainda confortável para investir e gerar caixa. “Abaixo de US$ 65 [o barril], a indústria como um todo sofre. Mas com nosso perfil de custo e contratos de gás, seguimos resilientes.”
Estratégia para o petróleo
Além da diversificação logística, a PetroReconcavo vai testar neste semestre uma tecnologia ainda inédita na empresa — e rara no Brasil — para aumentar a produtividade de seus campos: os poços horizontais.
No modelo tradicional, os poços são perfurados verticalmente até o reservatório. Já os horizontais, comuns na produção de xisto nos EUA, fazem uma curva e se estendem lateralmente por centenas de metros, como se “deitassem” dentro da camada produtora. Isso aumenta o contato com o óleo ou gás e pode multiplicar por três a produtividade, embora exija investimento maior.
Os testes devem ocorrer nos campos do Polo Potiguar, no Rio Grande do Norte. Segundo o executivo, a geologia da região oferece bom potencial para a técnica.
Outro diferencial estratégico da empresa é a verticalização da operação. A PetroReconcavo conta com 16 sondas de workover (revitalização de poços) e 3 de perfuração próprias, o que garante mais agilidade e menor custo. No primeiro trimestre deste ano, bateu recorde de 3.630 metros perfurados e alcançou o menor lifting cost de sua história: US$ 13,93 por barril de óleo equivalente.
Crescimento e oportunidades
A história da PetroReconcavo começou em 1999, quando a Petrobras testou um novo modelo de operação para campos maduros: pela primeira vez, transferiu parte da produção do Recôncavo Baiano a um operador privado, mantendo participação nos resultados.
A empresa nasceu de um consórcio entre a PetroSantander, operadora criada pelo americano Christopher Whyte; o Banco Opportunity, do empresário Daniel Dantas; e a Perbras, tradicional no setor de sondas. Hoje, é uma das principais petroleiras independentes (“junior oils“) do país ao lado de Brava Energia e Prio. A especialidade da PetroReconcavo são campos de petróleo em terra firme (“onshore“).
A partir de 2015, com o programa de desinvestimentos da Petrobras, a companhia cresceu por meio de aquisições e conseguiu abrir capital em 2021. Em 2022, chegou a negociar a compra do Polo Bahia Terra, por US$ 1,4 bilhão, em consórcio com a Eneva — mas o negócio foi suspenso após a estatal rever sua política de vendas.
Sem conseguir o novo ativo, a PetroReconcavo fez outras aquisições, como a dos campos de petróleo onshore da Maha Energy por R$ 1 bilhão, que hoje garantem uma das melhores produtividades da empresa, além já citados investimentos em gás natural e escoamento do óleo.
O CFO acrescenta ainda que a PetroReconcavo segue em busca de novas oportunidades. Procaci diz que há interesse em novos ativos onshore e que a companhia mantém disciplina nos investimentos.
“A gente estuda dez ativos e fecha um. Se estivesse levando todos, é porque estaria pagando caro”, afirma Rafael Procaci. A empresa encerrou o primeiro trimestre de 2025 com dívida líquida de R$ 1,07 bilhão e alavancagem de 0,62 vez, o que garante espaço no balanço para novos movimentos.