A briga pela criação da MBRF Global Foods esquentou. Na disputa para aprovar sua fusão com a BRF, a Marfrig partiu para o contragolpe no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) contra a concorrente Minerva Foods

Em resposta ao recurso apresentado pela Minerva, que tenta barrar a operação alegando riscos à concorrência, a Marfrig acusou a rival de recusar, “de forma reiterada e injustificada”, o fornecimento de cortes bovinos essenciais — como dianteiro sem osso e recortes industriais usados na produção de hambúrgueres, salsichas e linguiças.

Segundo a companhia, a interrupção nas entregas começou em novembro de 2024 e violaria contratos com cláusulas de preferência firmadas entre as partes. Isso porque, em meados de 2023, a Minerva comprou 15 plantas frigoríficas da Marfrig por R$ 7,5 bilhões — e, como parte do acordo, a Marfrig teria preferência na compra das carnes produzidas nessas unidades.

A Marfrig alega que há nove meses a Minerva promove uma recusa “ilícita e injustificada” de fornecimento, mesmo com contratos em vigor. A prática, de acordo com a empresa, desmontaria a tese de que a Minerva estaria em posição de vulnerabilidade frente à fusão com a BRF, uma vez que demonstraria ter acesso a canais suficientes para operar com autonomia.

A empresa de Marcos Molina afirma que essa conduta motivou a abertura de um procedimento preparatório no Cade — mecanismo utilizado pelo órgão para investigar indícios iniciais de condutas anticompetitivas antes de decidir se abre um processo formal.

“A Minerva tenta se apresentar como vulnerável, mas é alvo de procedimento no Cade por conduta que ameaça a concorrência e o consumidor”, afirmou a Marfrig no documento assinado pelo escritório Mudrovitsch Advogados.

Salic, Marfrig, BRF e Minerva

A empresa também rebateu a preocupação levantada pela Minerva sobre a participação cruzada do fundo soberano saudita para segurança alimentar (Salic, em inglês) nas duas companhias, o que poderia facilitar alinhamento entre concorrentes. Segundo a Marfrig, esse eventual aumento de participação do fundo na companhia, via conversão de ações da BRF, é “meramente hipotético” e teria de ser analisado em um processo separado, caso se concretize.

Do outro lado, a Minerva sustenta que a atuação cruzada da Salic nas duas companhias pode reduzir os incentivos à rivalidade entre os grupos e defende que o caso representa um risco de “coordenação branda” — um tipo de alinhamento estratégico implícito entre empresas concorrentes com o mesmo acionista relevante. O argumento se baseia na tese de common ownership, ou propriedade cruzada, cada vez mais debatida no direito concorrencial internacional.

Além disso, a Minerva também questiona o fato de a operação ter sido aprovada em rito sumário, modelo reservado a fusões consideradas de baixo impacto concorrencial. Para a companhia, os efeitos combinados no mercado de alimentos processados e no canal foodservice — incluindo riscos de contratos de exclusividade — justificariam uma análise aprofundada por parte do Cade.

Marcos Molina, controlador da BRF, e Miguel Gularte, CEO da BRF
Marcos Molina, controlador da BRF, e Miguel Gularte, CEO da BRF (Divulgação)

A Marfrig sustenta que a incorporação das ações remanescentes da BRF não altera o controle da empresa — que já estava sob seu comando — e não representa novos riscos de concentração de mercado.

O caso será julgado pelo Tribunal do Cade, ainda sem data marcada. Procurada, a Minerva não respondeu até a publicação deste texto.