Ao contrário de rivais que cederam o controle a conglomerados como LVMH ou Kering, Armani manteve sua empresa privada, respondendo apenas a si mesmo e administrando-a com a precisão de um empresário e o olhar de um costureiro.
Defensor ferrenho dessa independência, ele foi o único acionista de um grupo que gerou cerca de US$ 2,7 bilhões (cerca de R$ 14,85 bilhões) em vendas no ano passado e criou salvaguardas para garantir que a maison resistiria a uma aquisição externa.
A empresa agora enfrenta seu maior teste: se vai conseguir ir além da era de seu fundador e, ao mesmo tempo, preservar seu legado.
Armani não tinha herdeiros
Sem filhos ou cônjuge, o controle da maison passará para a Fundação Giorgio Armani, que o estilista e empresário criou há quase uma década para garantir a continuidade e preservar a independência.
Muito antes de sua morte, Armani disse que havia selecionado três pessoas para supervisionar a fundação quando ele partisse, embora detalhes não tenham sido divulgados ainda.
“Sempre preparei meus colaboradores para o próximo capítulo”, disse Armani ao The Wall Street Journal no ano passado. “Há pessoas que estão no nível que precisam estar, outras um pouco abaixo.”
O círculo íntimo de Armani inclui Pantaleo “Leo” Dell’Orco, seu antigo assistente e chefe de moda masculina; Silvana Armani, sua sobrinha que há muito supervisiona a moda feminina; e Roberta Armani, outra sobrinha que gerencia as relações com celebridades.
Seu sobrinho, Andrea Camerana, é o diretor-gerente de sustentabilidade e sua irmã, Rosanna Armani, faz parte do conselho.
Limites para mudanças
Juntamente com a fundação, inaugurada em 2016, Armani elaborou um novo estatuto que entrará em vigor após sua morte. Ele cria várias categorias de ações com diferentes direitos de voto, embora a alocação desses blocos não tenha sido divulgada. Ele também estipula uma abordagem cautelosa para aquisições e dívidas e estabelece limites claros para qualquer mudança de propriedade.
A listagem na bolsa de valores não é proibida, mas só pode ser considerada com a aprovação da maioria dos diretores.
Mesmo com tais salvaguardas, a morte de Armani provavelmente despertará o interesse pela compra do grupo.
“Marcas como essas raramente chegam ao mercado”, disse Luca Solca, analista da Bernstein. “Espero um interesse significativo do setor.”
Historicamente, as casas de moda não sobrevivem além da vida de seus fundadores.
Em tempos mais recentes, no entanto, a morte de um fundador icônico não significou necessariamente o fim de uma marca.
Balenciaga, Chanel, Dior, Givenchy e Saint Laurent prosperaram muito depois da morte de seus criadores, transformando-se em negócios globais sob novos administradores.
A morte de Armani ressalta o fim de uma era em que um punhado de designers exercia amplo poder sobre suas casas de moda, comandando tudo, do estúdio à loja. Eles não eram apenas talentos criativos, mas também donos de empresas, definindo a estratégia e o ritmo da expansão global.
Esse modelo praticamente desapareceu. Nos últimos tempos, a Armani — fundada em 1975 — competiu em uma indústria de luxo dominada por conglomerados em expansão que empregam vasto poder financeiro para entrar em novos mercados, abocanhar imóveis e promover campanhas de marketing globais. Diretores criativos tornaram-se, em grande parte, mercenários contratados para revitalizar uma marca e substituídos quando as vendas caem.
Ao longo dos anos, muitos admiradores se juntaram a eles. No final da década de 1990, Bernard Arnault e Armani exploraram uma possível parceria na qual a LVMH teria uma participação de 20% nos negócios italianos, com o estilista permanecendo como diretor criativo. O acordo nunca se concretizou.
Mais tarde, Armani explicou o motivo: “Eu teria sido manipulado”, disse ele ao WSJ em 2012. “E então pensei comigo: se eles quiserem, podem me ignorar.”
Arnault estava entre os que prestaram homenagem a Armani na quinta-feira (4), dizendo que o estilista havia “expandido a elegância italiana para uma escala global”.
Vendas em queda
Luca Solca, da Bernstein, disse que, apesar do reconhecimento global da Armani, o prestígio da marca havia diminuído e precisava de um controle mais rigoroso de sua distribuição, sugerindo que ela se beneficiaria de uma revitalização e de uma nova perspectiva.
As vendas da Armani caíram 5% no ano passado, e o lucro operacional caiu quase um quarto em meio ao arrefecimento do mercado de luxo. A empresa respondeu elevando os investimentos a níveis recordes, impulsionada pelas reformas das lojas e pela decisão de trazer o e-commerce para dentro de casa.
Além de sua marca principal, a Armani opera em vários áreas da moda: Armani Privé é a linha de alta costura da casa; Emporio Armani oferece prêt-à-porter jovem e voltado para as tendências; e Armani Exchange oferece moda urbana mais acessível.
A marca expandiu-se para empreendimentos de estilo de vida que refletem o desejo de Armani de influenciar os ambientes que seus clientes habitam. O grupo opera a Armani Casa, uma linha de móveis para casa; a Armani Dolci, uma confeitaria; e uma rede de restaurantes e cafés. Armani também emprestou seu nome a hotéis em Milão e Dubai que incorporam a estética discreta do designer à hospitalidade.
Independência
Mesmo depois de completar 90 anos, Armani continuou a aparecer no escritório todas as manhãs, comandando seu vasto império empresarial com mão firme. Embora a doença o tenha obrigado a perder os três desfiles de moda que realizou em junho e julho, ele permaneceu envolvido em cada detalhe por videoconferência.
Na quinta-feira (4), a empresa afirmou que Armani sempre prezou pela independência de pensamento e ação e que “sua família e funcionários levarão o grupo adiante com respeito e continuidade a esses valores”.
A lição mais importante que Armani queria transmitir àqueles com quem trabalhava? Seja humilde, disse ele ao WSJ no ano passado. “Às vezes, as pessoas neste ramo têm egos fortes, e é importante manter a modéstia”, disse Armani.
Traduzido do inglês por InvestNews
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