Colunistas
Devagar se vai ao lucro: por que analistas que demoram a mudar vão melhor
Estudo mostra que um portfólio que levava 20 meses para sofrer alguma alteração rendeu de 5% a 10% a mais do que um que mudava a cada seis meses.
Na conhecida fábula da lebre e da tartaruga, o animal mais lento é capaz de ganhar a corrida contra um muito mais rápido não por disparar atrás do resultado, mas por seguir devagar e sempre. Afinal, como diz o ditado, “devagar se vai ao longe”. Ou será que foi o chef capaz de preparar um risoto à perfeição respeitando o lento cozimento do prato?
Não faltam exemplos da virtude de uma abordagem mais calma em determinada situação. Mas um estudo recente, de autoria de três economistas e professores, Chay Ornthanalai,e Kent Womack (Universidade de Toronto) e Romain Boulland (ESSEC Business School), e publicado no Journal of Financial and Quantitative Analysis, sugere que a máxima também vale na análise de ações.
O trabalho foi o último publicado por Womack, um ex-analista do Goldman Sachs antes de mudar para a área acadêmica, falecido em 2015. Junto com os colegas, ele examinou as recomendações de compra, venda ou de manter ações de 4,5 mil analistas entre 1996 e 2013. Os pesquisadores então dividiram as análises em três categorias – lenta, média e rápida, de acordo com a velocidade com que mudavam uma recomendação..
Um estudo adicional examinou 2 mil análises para entender a lógica de um analista ter mudado de opinião sobre determinado papel. Verificaram que mesmo profissionais que não mudam muito as recomendações costumam atualizar suas análises e estimativas sobre o valor de mercado das empresas analisadas. Mesmo sem ver mudanças de longo prazo nas empresas, adaptam as projeções de lucro ou prejuízo aos novos cenários.
É uma estratégia que parece funcionar para a carreira dos analistas. Verificando a carreira de cada um deles e sua reputação no mercado, o estudo constatou que os mais lentos em mudar de opinião tinham mais espaço no mercado do que os apressadinhos ou mesmo os ponderados. Recebiam melhores salários, trabalhavam nas melhores gestoras, e, além de adquirir sólidas reputações, suas opiniões eram mais influentes.
Mas o que importa para alguns: na média, um portfólio que levava 20 meses para sofrer alguma alteração rendeu de 5% a 10% a mais do que um portfólio que mudava a cada seis meses. E, de quebra, o trabalho ressaltou que, numa era em que a inteligência artificial é cada vez mais usada, as análises produzidas por humanos importam.
O trabalho da I.A. se assemelha ao de um analista rápido, baseando as recomendações na divulgação de resultados ou qualquer outra informação que costuma estar disponível a todos. Analistas lentos tendem a uma abordagem mais complexa, dando menos peso a notícias sobre as operações da empresa e mais à possibilidade que venha a se fundir com uma concorrente e outros dados que impactam mais fortemente o valor de mercado da empresa.
A abordagem mais interpretativa, aliada a uma estratégia de longo prazo, combina com outro fator: a experiência dos analistas, que costumam ser mais velhos do que os analistas que mudam rápido de opinião. Os resultados sugerem que triunfar no mercado se parece menos com uma corrida do que com uma caminhada. E que, devagar, se vai ao lucro.
*Samy Dana é Ph.D em Business, apresentador do Cafeína/InvestNews no YouTube e comentarista econômico. |
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
Veja também
- Saber mais sobre o risco altera decisões? Um estudo sobre calorias e mercado
- Uma história de hackers, fraude e aversão ao risco nas bolsas americanas
- Por que as pessoas são enganadas por golpistas como o do Tinder?
- ‘Efeito Sideways’ e as mudanças irracionais nos mercados
- Quando a superstição move as bolsas?
- Nos jogos de tênis e nas bolsas de valores: como os campeões reagem aos riscos?