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Por que o GPA precisou rever sua estratégia em plataformas digitais?
Depois de tentar alavancar sua própria plataforma de entregas, o Grupo Pão de Açúcar precisou retomar a parceria com diversas plataformas digitais em 2021.
Em 2018, o Grupo Pão de Açúcar (PCAR3) decidiu investir em sua própria plataforma de entregas, rompendo a parceria que tinha com a Rappi. Para isso, o GPA comprou um aplicativo de entregas fundado em Curitiba, o James Delivery.
Rappi, iFood e Uber Eats fazem serviços de entregas de produtos no varejo alimentar dentro do que chamamos de ‘última milha’, ou last mile. Naquele momento, a estratégia dessas empresas envolvia muitos investimentos em tecnologia e aquisição de clientes. Dessa forma, dificilmente elas permitiriam que um grupo varejista, mesmo grande como o GPA, conseguisse construir uma plataforma própria e ter a escala necessária para competir com elas.
Outro motivo que contribuiu para o insucesso da estratégia do GPA foi que, neste tipo de aplicativo, o consumidor quer muita variedade, opções de lojas diferentes. É o famoso termo ‘one stop shop’, e a Rappi, iFood, Uber Eats oferecem esse tipo de conveniência.
O James Delivery, por outro lado, ficava preso aos próprios interesses do GPA, de suas lojas e de alguns parceiros. Como resultado, não conseguiria ter o efeito de rede tão necessário para plataformas e super apps crescer o número de clientes.
Nova mudança de estratégia
Em março de 2021, o GPA voltou com a parceria com o Rappi e foi desacelerando o aplicativo James Delivery, que tinha menos usuários comparado com outras plataformas.
Na mídia, a gestão do GPA comentou que o mercado ficou muito competitivo com elevados investimentos no setor, por isso decidiram mudar a estratégia. De fato, para brigar nesse setor de plataformas de last mile, tendo um negócio próprio como o James Delivery, iria demandar do GPA um grande investimento e muita dedicação para conseguir novos clientes e atuar em mais regiões com ganhos de escala. Foi também comentado na mídia que o GPA queria evitar que as informações e dados de compra dos seus clientes fossem acessados por empresas fora do grupo, por exemplo, com parceiros externos como Rappi.
Seguindo princípios de centralidade no cliente, o GPA deve tentar se adaptar ao que é melhor para o cliente, e não apenas para a empresa – e o cliente queria variedade ao comprar no varejo alimentar por meio de plataformas de last mile.
Depois disso, e aí com uma iniciativa mais centrada no cliente (consumidor), o GPA adaptou sua estratégia e resolveu usar outras plataformas já consolidadas em vez de criar sua própria. Isso permitiu a ele concentrar-se na busca pelo aumento da participação na venda de alimentos, bebidas e outras categorias que oferece.
Por sua vez, o retorno do GPA acabou sendo bom para o Rappi, que quer ser um super app. O Rappi declarou na mídia que o aplicativo nunca quis sair do GPA.
Vale ressaltar também que o Rappi é parceiro de entregas de diversos varejistas que concorrem com o GPA, como o Carrefour (CRFB3) e até outros varejistas regionais como o Savegnago, uma grande rede no interior de São Paulo, presente em cidades que tem loja do GPA, como Ribeirão Preto. Ou seja, o serviço de entrega rápida está cada vez mais comoditizado para os varejistas, que deverão buscar novas formas de ganhar o cliente.
Outras parcerias
O GPA, por exemplo, começa agora a ampliar parcerias com outras plataformas além do Rappi, simultaneamente. Anunciou parceria com o iFood em maio de 2021, logo em seguida, em junho de 2021, anunciou parceria com o Mercado Livre de (MELI34). Assim, os consumidores poderiam fazer compras no Pão de Açúcar diretamente na plataforma, inclusive em locais onde não há lojas físicas da rede. Já o processo logístico fica por conta do Mercado Livre, que se beneficia ao adicionar diversos novos produtos para serem vendidos.
Na sua plataforma, em linha com a competição no varejo de alimentos imposta no e-commerce brasileiro, principalmente a partir de 2019, vale lembrar que tudo isso acontece enquanto essas empresas concorrem com plataformas online de itens de supermecado, como a Shopper, que em 2021 fechou o ano com aportes de R$ 290 milhões em rodada de investimento liderada por um fundo de Singapura.
Atualmente, a empresa anunciou que conta com mais de 1 mil colaboradores e mais de 500 mil pessoas cadastradas na plataforma, e espera chegar a 1 milhão de clientes até outubro de 2022.
A verdade é que, diante de tanta inovação, está cada vez mais complexo entender, atuar e escolher em quais empresas investir a partir da análise de seus modelos de negócios.
O GPA tentou fazer tudo para o cliente e tomou decisões que beneficiaram mais a empresa. Enquanto isso, empresas especializadas em menos atividades para o cliente, ou seja, focadas na entrega de produtos e alimentos, como Rappi, iFood e Uber Eats, cresceram pelas beiradas.
Agora, com a entrada da Shopper e de outros e-commerces no varejo de alimentos, esses três anos podem custar caro para o GPA. Um melhor caminho para a execução de sua transformação digital poderia ter sido pela colaboração com outras plataformas desde o início da sua estratégia digital. Em seu favor, o GPA tem uma marca forte, com competências valiosas no varejo alimentar e é um varejista multicanal, podendo potencializar bem o negócio a partir da integração entre o físico e o digital.
*Leandro Guissoni é Ph.D., professor de estratégia no Brasil e Estados Unidos, empresário, palestrante e autor de livros, artigos e casos de empresas por Harvard. Assessora grandes empresas em inovação digital e analytics. |
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
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