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Por Dentro do Negócio

A revolução das insurtechs e as reações de seguradoras tradicionais

Entenda a dinâmica por trás da inovação no setor de seguros e como empresas tradicionais, como a Porto Seguro, buscam reagir.

Adicionar inovação a um setor arcaico como o de seguros parecia improvável. Desde o início da atividade seguradora no Brasil, por volta de 1808, os processos têm sido, na maioria das vezes, complexos, burocráticos e lentos para os clientes.

Mas, hoje, os clientes pedem uma experiência equivalente ao que já encontram em empresas inovadoras, como Uber (U1BE34), Nubank e Netflix (NFLX34), demanda negligenciada pelas empresas tradicionais de seguros.

Este novo contexto encorajou o surgimento de negócios desafiantes no setor: as startups de seguros, ou insurtechs, que usam tecnologia para tornar a contratação de seguros igual a de qualquer outro serviço online que proporciona simplicidade, transparência e conveniência.

Como parte da transformação digital em seguros, um relatório da WTW revelou que o investimento global em startups de insurtech totalizou US$ 10,5 bilhões nos primeiros nove meses de 2021, ultrapassando o recorde histórico de US$ 7 bilhões investidos em 2020.

Uma das primeiras insurtechs a oferecer seguro sob demanda, de curta duração e direto aos consumidores, foi a Trōv, baseada no Vale do Silício. Com o aplicativo criado por essa startup, o seguro poderia ser ativado por meio de um smartphone, com um simples toque, e desativado quando a cobertura não fosse mais necessária.

Uma pessoa poderia, por exemplo, fazer o seguro de sua bicicleta para a duração de um passeio e, se algo acontecesse, fazer o sinistro pelo aplicativo e rapidamente teria a situação resolvida. Ou poderia também fazer o seguro de uma câmera fotográfica valiosa durante a duração de uma viagem.

Scott Walchek, cofundador e CEO da Trōv, notou que o comportamento do consumidor, principalmente dos jovens, girava em torno de uma nova economia on-demand, ou seja, as pessoas obtendo o que precisavam, quando e onde queriam, convenientemente engajadas em dispositivos móveis conectados. 

A inovação é que usando o aplicativo móvel, os consumidores não precisam mais suportar o tedioso processo burocrático de obtenção de uma apólice de seguro. 

Mas a Trōv tinha dois grandes desafios: o primeiro era o alto gasto necessário para adquirir clientes no setor de seguros. O segundo era a frequência e retenção do cliente, já que, ao facilitar a contratação e cancelamento de maneira muito simples, aumentar o valor vitalício ou as margens geradas por um cliente em períodos futuros era desafiador. 

Por isso, a Trōv começou a mudar seu modelo de negócio: em vez de focar no consumidor final, passou a agir como uma ponte que conecta sua tecnologia com a de outras empresas que desejam oferecer seguros.

De um lado, ela oferece a plataforma com produtos de seguro, tecnologia e infraestrutura com a capacidade de subscrição, que é a análise prévia de risco do consumidor que quer fazer um seguro. De outro, estão as empresas parceiras que usam a infraestrutura da Trōv para oferecer seguros aos clientes com uma experiência de contratação e uso otimizado.

Assim, a tecnologia permite que qualquer empresa com presença digital incorpore facilmente as etapas de cotação, vinculação, gerenciamento, cobrança e sinistro de seguros em seus aplicativos e websites. Nessa área há empresas que oferecem serviços similares, como a 180º Seguros no Brasil, que surgiu em 2020, captou R$ 44 milhões em 2021 junto a alguns fundos, e quer construir uma plataforma que permitirá a qualquer empresa vender seguros. 

  • Confira as ações da IRB Brasil RE (IRBR3)

O cenário brasileiro no setor de seguros

Em 2020, houve um avanço regulatório no Brasil e a Superintendência de Seguros Privados (Susep), passou a flexibilizar a atuação de insurtechs que já estão transformando a experiência do cliente no Brasil em um movimento que só tende a acelerar.

Uma das maiores seguradoras da América Latina, a Sura, anunciou em 2020 uma parceria com a própria Trōv para trazer o seguro sob demanda ao país, por meio de vários canais de distribuição.

Em decorrência dessa abertura da Susep, também foi criada a Justos Seguros que atua, inicialmente, com seguros de automóveis e quer tornar a contratação mais justa em termos de preços. Para isso, são utilizados sensores nos celulares dos motoristas para avaliar a qualidade de condução, o que levará a uma revisão mensal de preços. De acordo com a empresa, ela poderá oferecer planos até 30% mais baratos.  

Essa insurtech captou mais de R$ 190 milhões em outubro de 2021 e quer oferecer a possibilidade de fazer seguro em nome do condutor, independentemente de ser proprietário do veículo, e também oferecer o seguro sob demanda. 

Não à toa, seguradoras tradicionais, como a Porto Seguro e Caixa Seguradora, vem tentando adicionar inovações nos seus negócios. A Caixa Seguradora já oferece um seguro 100% online de automóveis, residências e de vida, e começou a testar uma modalidade de seguro automotivo com cobrança por quilômetro rodado.

Já a Porto Seguro concluiu, em junho de 2021, a compra de 13,5% na Petlove, o maior petshop online do Brasil, e passará a alavancar sua unidade de plano de saúde para animais, a Porto Pet.

Ela também anunciou, no mesmo período, a aquisição de 50% das ações da Conectcar por R$ 165 milhões. A ideia é potencializar a conexão entre a mobilidade e os serviços financeiros que a Porto Seguro têm oferecido, ampliando os benefícios para o cliente

Em outubro de 2021, a Porto também adquiriu quase 75% da fintech Atar, que desenvolve soluções conhecidas como “banking as a service”, quer dizer, oferece a infraestrutura bancária de vários serviços financeiros para que outras empresas façam uso e criem suas próprias soluções financeiras. E, em novembro de 2021, anunciou uma joint venture de assinatura de veículos e gestão de frotas entre a Porto Seguro e a Cosan (CSAN3), empresa de energia e logística. 

Neste mercado de soluções de mobilidade, ou mobitech, a Porto Seguro já vinha oferecendo planos de 12 a 24 meses de aluguel de veículos leves, com preços próximos a R$ 2 mil até cerca de 5 mil mensais. Dessa forma, o cliente fica livre de passar por burocracias ou custos adicionais no licenciamento, seguro e manutenção do veículo. 

Agora, a Porto Seguro precisará provar ao mercado a capacidade de atuar e crescer nas suas diferentes verticais de negócios para além da contratação e uso de seguro. Ao mesmo tempo, deverá provar a capacidade de inovar e atualizar a experiência do consumidor no seu negócio de seguro residencial e automotivo, e aí vem adicionando novas formas de comunicação digital com os clientes e seus vários corretores. 

Mas ainda é uma interrogação como será a transformação digital tendo em vista a grande participação dos corretores nos negócios.

As insurtechs, como a Trōv, a 180º Seguros, e a Justos Seguros não nascem com a dependência de corretores e fazem a desintermediação para acessar diretamente o consumidor final, ou oferecer seus serviços para serem distribuídos por outras empresas de várias áreas. 

Ter corretores pode ser bom, mas será necessário provar que a empresa consegue balancear o negócio entre os corretores, além das melhorias de experiência e taxas aos consumidores finais.

Ao diversificar seus negócios, a Porto Seguro também aumentará a sobreposição com outros modelos de fintechs, ao mesmo tempo em que terá que competir com várias insurtechs que vão se proliferar no mercado.

É uma estratégia ousada, os resultados de crescimento de clientes e lucro em 2021 da Porto Seguro são positivos, mas não há muita margem para erros por causa da competição entre empresas que serão generalistas e outras focadas exclusivamente em seguros.

Ninguém acorda querendo contratar seguros. Seguindo a lógica apresentada no livro de negócios “Desvendando a Cadeia de Valor do Cliente”, de Thales Teixeira, a partir de 10 anos de sua pesquisa na Harvard Business School, a maior parte das atividades feitas pelos clientes é o que chamamos de “erosão de valor”, ou seja, um mal necessário para contratar e usar o seguro quando for preciso. Por isso, quanto mais rápido, com menos esforço, menor custo e mais conveniente para o consumidor, melhor.

*Leandro Guissoni é Ph.D., professor de estratégia no Brasil e Estados Unidos, empresário, palestrante e autor de livros, artigos e casos de empresas por Harvard. Assessora grandes empresas em inovação digital e analytics.

As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação. 

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