A Argentina eliminou a maior parte dos controles cambiais e vai permitir, a partir de segunda-feira (14), a flutuação do peso dentro de bandas prestabelecidas, segundo informaram nesta sexta (11) à noite o Banco Central e o Ministério da Economia do país. O anúncio foi feito pouco antes de o Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgar que liberou um empréstimo de US$ 20 bilhões ao país, sendo US$ 12 bilhões com desembolso imediato.
De acordo com o Banco Central argentino, um dólar poderá ser negociado dentro do intervalo de 1.000 a 1.400 pesos. Essa banda será ampliada a uma taxa de 1% ao mês, encerrando efetivamente o regime de desvalorização controlada (conhecido como crawling peg) em vigor até então. Com a medida, é possível que o BC argentino tenha que vender parte dos dólares de suas reservas, que serão reforçadas com os US$ 12 bilhões do FMI.
Nesta sexta, o dólar oficial era negociado a 1.097,50 pesos argentinos, enquanto o “blue” (informal) era cotado a 1.375 pesos.
No mercado, a medida é vista como mais um passo para a abertura econômica e para o plano de estabilização do país. O fim do controle cambial era visto como essencial para que o país voltasse a atrair capital estrangeiro.
Acordo com FMI e outras medidas
Os recursos do FMI “nos permitirão, a partir de segunda-feira (14), pôr fim às restrições cambiais que tanto dano causaram, que foram implementadas em 2019 e que limitam o funcionamento normal da economia”, afirmou o ministro da Economia, Luis Caputo, em coletiva de imprensa na Casa Rosada..
Na entrevista, o ministro da Economia anunciou também o fim do chamado “dólar blend”. Os dólares obtidos com as exportações do país passam agora a ser liquidados no mercado oficial de câmbio da Argentina – uma medida que busca fortalecer as reservas internacionais do Banco Central.
As autoridades também informaram que será eliminado o limite mensal de US$ 200 para que pessoas físicas possam comprar dólares, bem como as taxas aplicadas a essas operações. O governo permitirá que as empresas enviem ao exterior parte dos dividendos do ano vigente – os dividendos acumulados de anos anteriores levarão mais tempo para serem liberados. Paralelamente, as empresas poderão pagar imediatamente por importações, revertendo uma restrição anterior.
O mercado financeiro reagiu positivamente à guinada da Argentina, que afasta o país de boa parte dos controles e é vista como um passo importante para, eventualmente, retomar o acesso aos mercados internacionais de dívida após a reestruturação soberana de 2020. O ETF Global X MSCI Argentina subiu mais de 5% nas negociações pós-mercado de sexta-feira.
“Os títulos devem subir com a notícia”, disse Aaron Gifford, analista de dívida soberana de mercados emergentes da T. Rowe Price, em Baltimore. “Essa era a peça que faltava para permitir que a Argentina voltasse a ter acesso ao mercado. Vai levar um tempo, dadas as condições externas difíceis, mas sou otimista de que conseguirão.”
Fim dos controles
Eliminar os controles, conhecidos coletivamente na Argentina como “o cepo”, pode representar uma mudança significativa de rumo para o governo Milei, que vinha enfrentando dificuldades para acumular reservas em moeda forte no último mês e restaurar a confiança de investidores que aguardavam detalhes sobre o acordo com o FMI.
“O anúncio é mais ousado do que se esperava”, avaliou Marcelo Garcia, diretor para as Américas da consultoria Horizon Engage. Segundo ele, Milei está dando “um salto de fé ao levantar o cepo. É uma medida mais arrojada do que se imaginava no início de um ano eleitoral.”
O anúncio da Argentina foi feito poucas horas antes da esperada aprovação pelo conselho executivo do FMI de um novo acordo de US$ 20 bilhões, com duração de quatro anos, com o país sul-americano. Caputo afirmou que os recursos — dos quais US$ 12 bilhões chegarão em 15 de abril — reforçarão imediatamente as reservas do Banco Central. Outros US$ 2 bilhões estão previstos para junho, com mais US$ 1 bilhão até o final do ano.
As autoridades monetárias também buscam complementar os recursos com financiamentos adicionais do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Caputo disse que a Argentina espera obter mais US$ 2 bilhões por meio de acordos de recompra (repos) e afirmou que o objetivo do governo é alcançar um superávit de US$ 4 bilhões em reservas líquidas até o final do ano.
Oficialmente, a Argentina planeja usar os recursos do FMI para quitar dívidas do Tesouro junto ao Banco Central, bem como vencimentos principais que o governo deve pagar ao próprio FMI nos próximos quatro anos, referentes ao programa anterior iniciado em 2022.
Mais recursos do FMI devem ajudar na recuperação da economia argentina, que encolheu por dois anos consecutivos. Analistas consultados pelo Banco Central projetam um crescimento de 5% para 2025, com inflação anual de 27,5% até dezembro, após os preços ao consumidor terem subido quase 300% no primeiro ano de mandato de Milei.
Investidores demonstravam crescente inquietação diante das dúvidas sobre se o acordo com o FMI exigiria uma nova desvalorização da moeda — seria a segunda desde a posse de Milei. Nas semanas que antecederam o anúncio, operadores apostavam que o peso cairia cerca de 10% frente ao dólar no mercado oficial até o fim de abril, taxa superior ao ritmo de 1% ao mês estabelecido pelas autoridades.
O governo vinha controlando o ritmo da desvalorização do peso, permitindo uma queda de apenas 1% ao mês, muito abaixo da inflação. Muitos consideravam essa política insustentável, alertando que ela tornava os negócios argentinos menos competitivos no comércio internacional e encarecia os custos para turistas.