Economia
Como cobrar um cliente: 6 técnicas para não desgastar o relacionamento
Especialistas consultados pelo InvestNews mostram os passos para ter sucesso na comunicação.
A crise inflacionária brasileira levou ao aumento da criação de empresas no país. O número de profissionais freelancers ou optantes pelo Simples Nacional (MEIs) cresceu desde o começo da pandemia, fazendo com que muitos tenham que se deparar com a necessidade de cobrar por seus serviços ou produtos.
Seja para criar uma renda extra e conseguir melhorar o planejamento financeiro até dar os primeiros passos nos investimentos, esse tipo de relacionamento com o cliente pode ser a chave entre o sucesso ou fracasso de uma empreitada comercial.
Tarefa normalmente delegada ao setor de atendimento ao cliente das empresas, cobrar um cliente pode ser difícil e desgastar a relação. Por isso, consultamos especialistas na indústria para saber o que fazer e como cobrar um cliente da melhor maneira possível.
Entender como você agrega valor
Segundo Alexander Trevisan, fundador e CEO da uMov.me, o mais importante na relação entre cliente e fornecedor é entender onde o último agrega valor ao primeiro. “Tudo está ligado à geração de valor. O grande norte da relação tem que ser, quando se ergue um negócio, o quanto eu consigo realmente aumentar seus ganhos.”
Esse argumento, diz Alexander, deve voltar na hora de realizar uma cobrança. “No ato de cobrar, essa geração de valor, que foi prometida lá no começo da relação, deve estar presente. Se você entregou um alto valor, vai ser difícil argumentar contra a cobrança de um alto preço”.
O executivo diz que há dois ângulos principais para entender qual o valor da sua entrega para um cliente.
“O primeiro é olhar o retorno real daquele produto ou entrega para você – apesar de isso não ser fácil em todas as ocasiões. Quanto aquele serviço gerou de lucro? Achar a quantificação disso é o que vai te dar o argumento de venda e de cobrança”, diz ele.
“Um segundo ângulo é entender isso como um problema: quanto te custa não ter esse problema resolvido e quanto eu estou te cobrando para resolvê-lo?”. Nessa abordagem, destaca ele, é necessário olhar o quanto você cobra e quais outras soluções no mercado também resolvem esse problema. “É aqui que você vai brigar por qualidade, e não preço. No preço você normalmente sai perdendo”.
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Ser flexível com o cliente
Pedro Janot, ex-diretor da Zara e da Azul (AZUL4), com experiência no Pão de Açúcar (PCAR3) e na CVC (CVCB3) destaca que, na relação com os fornecedores, é necessário ser flexível.
“Durante a minha atuação em diversas empresas de varejo, vi muitos armazéns e magazines dando calote em fornecedores de tecidos, peças e bases. O que esses fornecedores não sabem é que eles possuem grande força de negociação. Se um magazine é minimamente respeitoso, mantendo os pagamentos, ele tende a atrair todas as novidades do mercado”, diz ele.
Segundo Janot, a renegociação é sempre uma alternativa para conseguir os melhores preços e as melhores condições: “Houve uma vivência minha na Richards em que nós ficamos sem caixa. Nós sentamos e combinamos os pagamentos, por mais improváveis que fossem. Fizemos muito isso na Zara também. O respeito pela forma de pagamento é essencial.”
O empresário afirma que há muita força nos fornecedores ao oferecerem benefícios além dos produtos. “Isso aumenta a chance dos seus fornecedores de trazer novos produtos, informações e técnicas”, destaca ele.
Analisar seus indicadores de pagamento
Fabio Beckenkamp, CTO da Smark CRM e investidor-anjo de startups pela WOW Aceleradora, viu diversas empresas nascerem e se desenvolverem. Ele indica quais indicadores um empreendedor deve ficar atento para evitar a inadimplência.
“O principal é o churn, o indicador de evasão do serviço ou produto. Tive a experiência de ter atuado como consultor para uma startup que tinha um churn de 8% ao mês, algo altíssimo. Apesar de comum no B2C (relação entre empresas e o consumidor final), é gravíssimo em negócios B2B (interação entre empresas). A leitura desse indicador é: se ele está perdendo cliente, tem um problema de relacionamento, confiança, ou produto – está prometendo e não está entregando.”
Segundo ele, o churn costuma ser um bom indicador de inadimplência, fazendo com que a melhora de um gere melhora no outro. Outros indicadores são a abertura de chamados ou dúvidas: o ideal é que estes diminuam com o tempo. Caso eles permaneçam os mesmos, as chances de inadimplência aumentam consideravelmente.
Quando o tópico vai para a cobrança, existem dois atores distintos: o financeiro da outra empresa, e o usuário. “Normalmente é o financeiro quem é mais responsável, a primeira frente de negociação. Aqui o importante é ser o mais flexível possível, onde haverão dois financeiros distintos – o seu e o do seu cliente – disputando as próprias metas.”
“Já quando essa inadimplência está subindo ou indo para muitos meses, o CS (sucesso do consumidor) entra para verificar o que está acontecendo. Se não há engajamento nem pagamento, é uma questão de reengajar o cliente. Se há engajamento, mas não há pagamento, é o caso de acionar o cliente ou usuário final.” E aqui, segundo o especialista, a ação recomendada é, em dois meses de atraso, a ameaça de cessar os serviços.
“Resumindo, no B2B é mais ou menos um mês de flexibilidade, dois de acompanhamento, três de bloqueio de serviços ou produtos. Já no B2C é algo mais direto, pode-se cortar o acesso sem problemas, o mercado já tem essa educação.”
Ter clareza no contato inicial com o cliente
Nélio Xavier, professor de oratória e comunicação, destaca que existe uma zona de inconveniência que deve ser evitada quando se vai cobrar um cliente. A melhor maneira de evitar essa zona, segundo o professor, é sendo o mais claro possível no contato inicial.
“Esse primeiro contato com definição de prazos e formas de pagamento e como precisa ser feito de forma muito clara. Eu jogo mais para o final do meu ‘pitch’ de vendas. Nessa estrutura, você não começa falando de valores, você começa gerando valor, para então entrar em preço”.
Não confundir intimidade com permissividade
Durante a construção de uma relação cliente-fornecedor, é natural que o fornecedor busque alguma proximidade com o cliente. Essa proximidade pode agregar ao seu valor como autoridade ou ser um valor adicional a ser acrescentado em seu produto final. Entretanto, Nélio destaca como custa pouco para essa intimidade virar permissividade.
“O pagamento ou atraso é uma falta de respeito – que pode ser ocasionado por essa ausência de credibilidade. Existe também o extremo oposto – a pessoa que vai confundir a aproximação que teve com você com a permissividade de ‘pagar quando quiser’”, destaca ele.
“O que a gente não quer é ser o ‘seu Barriga’ (personagem do desenho Chávez): cobrar a 14ª vez do aluguel. É preciso entender que existem estilos de comunicação diferentes, e o momento da cobrança é muito delicado”, acrescenta.
Ter um estilo de aproximação
Ao aproximar um cliente para realizar uma cobrança, é necessário realizar alguma preparação para ser assertivo na medida certa. Nélio Xavier destaca que vale prestar atenção ao perfil do seu cliente, e usa os parâmetros do método DISC para isso.
“Existem, de acordo com esse método, quatro perfis de pessoas: dominante, influente, estável e o conformado. Cada um vai pedir um estilo de aproximação específico.” Entretanto, o professor destaca um estilo padrão que pode ser adaptado para os quatro perfis:
“Primeiro, é necessário que na sua abordagem – seja ela por e-mail, WhatsApp, telefone, videochamada ou ao vivo – você comece com uma saudação e um quebra-gelo. Eu prefiro canais que deixem o máximo de elementos de comunicação disponíveis: imagem, som, “texto” da fala, etc”. Sobre o quebra-gelo, Nelio afirma que ele não deve ser um elemento de riso, mas um tema para iniciar a conversa – um problema comum que ambos enfrentem ou uma situação que seja retratada na mídia.
“Depois, é preciso entrar estruturalmente no assunto. Use alguma abordagem como ‘você lembra do pagamento’, ou ‘ficou clara a data do pagamento’, e por aí vai”. O objetivo, destaca o professor, é que você construa a afirmação de modo que o cliente possa agir como se fosse um engano, e não má fé.
“Aí entra a parte de se comunicar. Nessa hora, tem que ser olho no olho. Na chamada de vídeo, olhe para a câmera, e não para os olhos da pessoa na tela”, ressalta ele. “Ombros abertos e acentuar a sua voz nos instantes de importância ajudam a passar a mensagem com sinais para além do que é dito”.
Por fim, o professor acrescenta: finalize a chamada com uma pergunta fechada. “O objetivo da pergunta fechada é que ela dá a ilusão de opção. Assim, se eu perguntar ‘você prefere pagar na terça, ou na quinta-feira?’, você nem cogita a ideia de pedir para pagar na sexta.”
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