Os líderes mundiais deixaram Belém (PA) após uma semana de discursos fortes e alertas unânimes: o combate às mudanças climáticas avança devagar demais.

Agora, após a cúpula de líderes mundiais que ocorreu entre os dias 6 e 7, começa a parte mais difícil.

Nesta segunda-feira (10), a 30ª edição da Conferência das Partes da Convenção da ONU sobre Mudança do Clima abre oficialmente seus trabalhos.

Nas próximas duas semanas, negociadores de quase 200 países tentarão resolver detalhes técnicos que vão desde como reduzir emissões até a estrutura dos fundos de ajuda aos países mais pobres, que enfrentam eventos climáticos cada vez mais extremos.

Qualquer acordo final exigirá consenso entre nações e interesses tão díspares como potências petroleiras e pequenos países insulares que sofrem com o aumento do nível do mar — em um momento em que a guerra, o comércio e disputas geopolíticas vêm tirando o clima do topo da agenda internacional.

Um teste para o protagonismo brasileiro

Com a conferência sediada em Belém, o governo Lula tenta reafirmar o Brasil como liderança global no debate climático.

Mas o desafio será transformar o discurso político dos líderes em acordos concretos entre países profundamente divididos — sobre quem deve pagar, quem deve agir primeiro e como conciliar a economia com o clima.

“Esta será uma COP muito diferente das anteriores”, afirmou o embaixador André Corrêa do Lago, presidente da COP30.

“O tema toca todos os setores da economia, e nenhum país está realmente preparado para a transição”, disse Corrêa do Lago. “Mas precisamos começar a agir como se estivéssemos.”

Disputa pela agenda

Um dos primeiros embates da conferência ocorre na definição da agenda oficial de temas. Cada país tenta garantir que suas prioridades entrem nas discussões formais, e isso exige consenso entre todos os delegados.

O grupo de Países em Desenvolvimento de Pensamento Similar (LMDC), que inclui Arábia Saudita e Índia, quer debater o financiamento climático previsto no Acordo de Paris, pressionando para que nações ricas aumentem o apoio financeiro aos países pobres.

Também querem incluir as chamadas “medidas comerciais unilaterais” — em referência à nova taxa da União Europeia sobre importações com alta emissão de carbono, que entra em vigor em 2026.

Por outro lado, a Aliança dos Pequenos Estados Insulares (AOSIS) quer debater o relatório recente da ONU que mostra que o mundo está muito distante da meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C.

O grupo pode enfrentar resistência de países como a Arábia Saudita, contrários a reforçar compromissos de maior ambição climática.

O Brasil propôs unir esses tópicos — finanças, mitigação e adaptação — em uma trilha única de negociação, o que abriria caminho para uma decisão final mais ampla.

Segundo fontes próximas às negociações, o governo brasileiro busca evitar um impasse e costurar um grande acordo político com os chefes de delegação ainda neste fim de semana.

Roteiro para o fim dos combustíveis fósseis

Após o acordo de US$ 1,3 trilhão em financiamento climático fechado na COP anterior, os países desenvolvidos tentam redirecionar o foco para a redução de emissões, defendendo que o mundo ainda pode manter viva a meta de 1,5°C.

Na abertura da COP30, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva defendeu a criação de um “roteiro para superar a dependência dos combustíveis fósseis” — tema considerado central por ambientalistas e governos progressistas.

“O mundo precisa de um caminho claro para deixar o petróleo e o carvão para trás”, disse Lula.

Na prática, porém, ainda não há consenso sobre como implementar essa transição. Na COP28, em Dubai, os países concordaram em “transitar para longe dos combustíveis fósseis”, mas sem definir metas ou prazos concretos.

“Todos os países produtores de combustíveis fósseis já concordaram em fazer essa transição, então temos um mandato”, afirmou Corrêa do Lago. “Está na hora de discutir o que isso significa.”

O chanceler das Ilhas Marshall, Kalani Kaneko, foi mais direto:

“A indústria de combustíveis fósseis não está se preparando para uma transição justa e ordenada.
O que vemos é um futuro de choques de oferta, conflitos por recursos e ativos encalhados — e o fardo das mudanças climáticas recaindo sobre nós para atender aos interesses de outros.”

Os EUA de Trump fora do Acordo de Paris

Os Estados Unidos anunciaram sua saída do Acordo de Paris, com a retirada oficial prevista para 27 de janeiro de 2026, e não registraram delegação para participar da COP30.

Mesmo assim, autoridades americanas ainda podem aparecer nas negociações até o encerramento, já que o país permanece membro da Convenção-Quadro da ONU sobre o Clima.

A ausência física, porém, não elimina a influência dos EUA.

Sob o governo Donald Trump, Washington voltou a defender abertamente os combustíveis fósseis e boicotou acordos multilaterais sobre temas como emissões marítimas e plásticos.

A postura americana paira sobre as negociações e pode dificultar consensos em Belém.

Adaptação ganha destaque

Diferentemente das edições anteriores, a COP30 não tem um grande anúncio programado, mas pode avançar em adaptação climática — tema que ganhou força após o furacão Melissa, que causou até US$ 4,2 bilhões em prejuízos na Jamaica.

As discussões buscam reduzir de 400 para cerca de 100 os indicadores de resiliência climática, para criar critérios mais claros de avaliação e financiamento.

O atual compromisso internacional de dobrar o financiamento para adaptação expira neste ano, e delegados esperam definir uma nova meta.

“Esta COP precisa aprovar um pacote de adaptação com um novo objetivo de financiamento em seu centro”, disse Kaneko, das Ilhas Marshall. “Nossas necessidades são imensas.”