Conversas de alto nível entre as duas maiores economias do mundo começaram neste sábado (10) na Suíça, oferecendo a oportunidade mais clara até agora para que Estados Unidos e China reduzam a escalada da guerra comercial.

O secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, e o vice-primeiro-ministro chinês, He Lifeng, lideram as negociações em Genebra, com duração prevista de dois dias.

Este é o primeiro encontro presencial e publicamente divulgado desde que o presidente Donald Trump impôs tarifas de 145% sobre produtos chineses, e Pequim respondeu com tarifas de 125% sobre bens americanos e novos controles de exportação de terras raras. O chefe de comércio dos EUA, Jamieson Greer, também deve participar.

Ambos os lados tentam demonstrar que estão em vantagem, mas manter o atual impasse representa riscos significativos.

A troca de tarifas abalou os mercados financeiros e ameaça causar escassez de produtos e aumento de preços para os consumidores americanos, pressionando Trump a encontrar uma saída para o confronto com Xi Jinping. O líder chinês buscou fortalecer sua economia antes das conversas, mas os dados indicam fragilidade.

Trump tem dado sinais contraditórios sobre o que espera das negociações. Ele já afirmou que não reduzirá tarifas sem concessões da China, mas na sexta-feira (9) disse que uma tarifa de 80% “parece razoável”.

“Temos que fazer um grande acordo para a América”, disse Trump a jornalistas na Casa Branca. “Acho que vamos voltar com um acordo justo tanto para a China quanto para nós.”

Bessent minimizou as expectativas, dizendo ao Congresso que as conversas estavam em estágio inicial e focadas na redução de tensões, não em um acordo abrangente. Mas o próprio Trump disse na quinta-feira (8) que esperava “avanços substanciais”. Outros membros do governo ressaltaram que o momento é de tentar desarmar o conflito.

O secretário de Comércio, Howard Lutnick, afirmou na Fox News que “não há chance” de uma suspensão completa das tarifas, qualquer que seja o resultado das conversas. Segundo ele, caso haja progresso, as tarifas “descem para um nível humano. Para um nível de negócios”. Mas reforçou: “O presidente vai manter tarifas significativas. Esse é o objetivo dele, e deve ser a expectativa de todos”.

A China adota uma postura cautelosa, com expectativas baixas e tratando o encontro como exploratório, e não como um momento decisivo. Representantes de Xi vão avaliar o quão sério é o esforço americano por um avanço, segundo Wu Xinbo, diretor do Centro de Estudos Americanos da Universidade Fudan.

As duas economias, com um PIB combinado de US$ 46 trilhões, têm muito a perder se as conversas fracassarem. Segundo estimativas da Bloomberg Economics, tarifas nesse nível podem eliminar 90% do comércio bilateral.

Os impactos da guerra já são visíveis. O volume de exportações da China para os EUA despencou, fábricas reduziram ou paralisaram a produção de itens básicos. O comércio bilateral gira em torno de US$ 700 bilhões por ano, e a China tem cerca de US$ 1,4 trilhão investidos em portfólios americanos.

Enquanto isso, Pequim amplia relações com outros mercados: as exportações para os EUA caíram 21%, mas os embarques para a União Europeia subiram 8% no último mês.

Internamente, a China enfrenta queda na produção industrial e um ciclo deflacionário. Já nos EUA, analistas alertam para falta de produtos e possíveis demissões em setores como transporte, logística e varejo. O Federal Reserve apontou aumento da incerteza. A economia americana encolheu no início do ano, pela primeira vez desde 2022, embora a demanda doméstica siga forte.

Os efeitos do conflito comercial estão se espalhando globalmente. A OMC reduziu sua previsão de comércio para 2025 e agora espera queda de 0,2% no volume — quase 3 pontos percentuais abaixo do que seria sem a guerra. O FMI também cortou suas projeções em abril.

Para Trump, o principal objetivo é reequilibrar a balança comercial, forçando Pequim a abrir seu mercado. Segundo ele, o acesso ao mercado americano é sua maior moeda de troca. “Eles têm muito a ganhar com isso”, disse Trump. “Mais do que nós, de certa forma.”

Já para a China, o conflito é visto como parte de um movimento mais amplo dos EUA para conter sua ascensão. “Não é só uma guerra comercial”, diz Regina Ip, legisladora em Hong Kong. “A China vê isso como uma ameaça existencial.”

“Eles estão determinados a resistir — ‘não ajoelhar’ — e adotaram uma linha dura”, diz Ip. “Mas ambos os lados precisam jogar com cuidado para não escalar.”

Até dias antes da reunião, Washington e Pequim ainda trocavam acusações sobre quem havia proposto o encontro.

Um dos focos dos EUA é pressionar por alívio nas restrições chinesas à exportação de terras raras — minerais essenciais para fabricação de motores, robôs, jatos e outros equipamentos estratégicos.

Outra prioridade americana é conter o tráfico de fentanil, buscando maior controle da China sobre precursores químicos. Esse tema, porém, deve seguir por outro canal de negociação, separado da agenda em Genebra.

Pequim afirma que já combateu firmemente o tráfico do opioide e cobra dos EUA um “obrigado” pelo esforço.

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