Fim da isenção para a LCI pode desestabilizar o crédito imobiliário

O fim da isenção de imposto de renda sobre as letras de crédito imobiliário (LCI) vai afetar o próprio crédito imobiliário. No mínimo, tende a encarecer os empréstimos para a compra da casa própria. Mas, no limite, pode até causar um grave dano na captação de recursos para as linhas de financiamento dentro do sistema financeiro de habitação. Isso porque o SFH tem usado cada vez mais a LCI como fonte de recursos (funding).

A Associação das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip), que representa os bancos que atuam no mercado de financiamento imobiliário, criticou a proposta de criação de uma alíquota de 5% de IR sobre os ganhos com as letras e acabar com a isenção dos instrumentos, conforme o plano apresentado no domingo pelo ministro da Fazenda Fernando Haddad. A mudança foi listada como uma das medidas para compensar as mudanças no IOF após a reunião de líderes do Congresso.

O alerta é claro: se o custo subir muito, a própria sustentabilidade do financiamento habitacional pode ficar em perigo. “Alterações que aumentem seu custo, como o eventual fim da isenção de IR, resultam na elevação do custo da moradia e podem comprometer o acesso à casa própria.”

A Abecip afirma ver a LCI como um instrumento estratégico para o financiamento habitacional. Isso porque a letra tem sido o principal produto de captação usado pelos bancos para suprir a lacuna deixada pela crise da poupança. A tradicional caderneta já acumula vários anos de saques líquidos. A sangria já alcança R$ 287 bilhões de janeiro de 2021 a março de 2025.

A poupança é, historicamente, a principal fonte de recursos para o crédito imobiliário dentro do SFH. Isso porque a legislação exige que 65% do saldo do instrumento nas instituições financeiras sejam direcionados a linhas para compra da casa própria ou construção de unidades de habitação com valor até R$ 1,5 milhão. Outro ponto importante é que a caderneta fornece o funding de menor custo do mercado: 0,5% ao mês mais a variação da taxa referencial de juros (TR), o que representa 6,17% mais TR ao ano.

Com ajuda da poupança, os bancos têm conseguido manter o custo médio do crédito imobiliário no SFH abaixo da taxa básica Selic. O problema é que com a crise da caderneta esse funding barato tem ficado mais escasso.

É aí que entram as LCIs. Como são isentas de IR, as letras costumam ter um custo de captação para os bancos abaixo da taxa básica. No mercado, as LCIs têm sido ofertadas com remunerações entre 85% e 90% do CDI, que acompanha a Selic. Se o instrumento perder a isenção, esse rendimento terá de subir para compensar a cobrança de imposto.

A Abecip explica que as LCIs “têm desempenhado um papel cada vez mais relevante na sustentação do mercado de crédito imobiliário, especialmente em um cenário em que a caderneta de poupança vem apresentando retração nos volumes disponíveis”. Segundo a entidade, as letras contribuem diretamente “para mitigar os impactos no mix de taxas dos financiamentos e assegurar a continuidade da oferta de crédito imobiliário a taxas que viabilizem a aquisição da habitação”.

A associação ressalta ainda ser importante analisar o papel das LCIs além da ótica do mero investimento financeiro. A Abecip considera ainda ser necessário ao mercado ter uma estrutura de funding estável, previsível.

A proposta do governo, portanto, pode trazer mais uma fissura na fundação desse mercado, que já tem sofrido com a crise da poupança.

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