Na mitologia do Superman, existe o “Mundo Bizarro”: uma versão paralela da Terra onde tudo acontece ao contrário – o planeta é quadrado, Superman opera no crime… Nesta quarta-feira (12), o Brasil virou o Mundo Bizarro.
Enquanto o mercado global festeja a inflação zero dos EUA em maio, com bolsas em alta e juros dos títulos públicos em baixa, por aqui temos o contrário. Mais um oferecimento da baderna fiscal.
A confiança de que o governo iria compensar a alta nos gastos públicos com mais fontes de arrecadação caiu a zero. Ficou claro que o Ministério da Fazenda simplesmente não tem um plano B à medida provisória que restringe a compensação de créditos tributários – barrada pelo Congresso no final da tarde de ontem. O próprio Haddad admitiu isso.
Na visão de investidores, analistas e empresários, esse quadro coloca o ministro em uma posição frágil, o que abre espaço para rumores sobre uma eventual saída dele. “É um boato fraco, baseado nesse quadro incerto, mas que acaba contaminando o humor”, diz uma fonte.
O ponto é que Haddad ainda é visto como um bom interlocutor para o mercado financeiro – um ministro que compreende o problema atual: Lula não considerar cortes de gastos para equilibrar as contas públicas.
Agora, sem plano B ou C para tanto, fica a perspectiva de juros altos “para sempre” nos títulos públicos – já que o governo terá de pagar mais caro para administrar uma dívida que tende ao inadministrável. E aí cai a bolsa, sem ter como concorrer com a renda fixa.
Em outra frente, o dólar sobe. A irresponsabilidade fiscal torna a moeda brasileira em si menos atraente. Com mais dinheiro circulando, via gastos do governo, cresce o risco de uma inflação fora do controle, capaz de evaporar com o poder de compra do real. Aí cresce a demanda por dólar, e a moeda americana sobe.
A perspectiva de inflação também joga água no chope dos cortes na Selic – má notícia para a economia, que precisa de juros baixos (sem risco de inflação) para respirar adequadamente.
Em suma, um corredor polonês de maus agouros.
Enquanto isso, no mundo normal, o “IPCA” dos EUA zerou em maio, baixando a inflação anual de 3,4% para 3,3%. Isso aumenta a chance de o banco central dos EUA reduzir a carga de juros. E bastou para deixar o mercado eufórico.
61% dos agentes financeiros passaram a apostar num primeiro corte em setembro, de acordo com a pesquisa em tempo real Fed Watch, da CME. Antes do dado feliz sobre a inflação, eram 46%. E a parcela mais otimista, que acredita em três cortes de 0,25% ainda este ano (o que reduziria os juros do Fed de 5,50% para 4,75%) subiu também. Antes, eram 13%; agora, 25%.
Em suma, o otimismo lá fora e o terror aqui dentro geraram um descasamento completo entre a Faria Lima e Wall Street. Veja aqui, em tópicos:
Bolsa
Lá fora: S&P 500 e Nasdaq renovaram suas máximas histórica. O primeiro índice fechou o dia em 0,85% (a 5.421 pontos) e o segundo avançou 1,53% (a 17.608 pontos).
Aqui dentro: O Ibovespa caiu 1,40%, a 119.936 pontos. Até a vista, “Ibov 120k”.
Juros longos
Lá fora: As taxas dos Treasuries de 10 anos, título que serve de referência para o mercado de renda fixa em dólar, caíram de 4,39% para 4,31% – bons oito pontos base
Aqui dentro: Os juros do nosso título de referência subiram 12 pontos base: o IPCA+2035 saltou dos já pesados 6,27% de ontem para estonteantes 6,39% hoje (talvez já haja no mercado de RF quem esteja cantando: “IPCA+7/Cade você?/Eu vim aqui só pra te ver…”).
Dólar
Lá fora: O dinheiro verde caiu 0,54% frente ao DXY, a cesta de moedas fortes que serve de referência para o mercado global de câmbio. Pois é: caem os juros dos títulos públicos americanos, cai o dólar – ao menos em condições normais de temperatura e pressão, o que não temos no Brasil neste momento, claro.
Aqui dentro: O dólar subiu 0,67%, a R$ 5,40, maior patamar desde janeiro de 2003. Ou seja, o real na contramão do mundo.
E é isso. Na gringa, para o alto e avante. Por aqui, para baixo – e para trás.
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