O aperto de política monetária mais agressivo e sincronizado do mundo em 40 anos entra em uma nova fase, à medida que bancos centrais se preparam para diminuir o ritmo de aumentos dos juros e seguir rotas distintas até o objetivo.
A mudança rumo a uma política monetária mais leve e menos uniforme reflete, em parte, as crescentes disparidades em uma economia global que ainda sente o impacto da pandemia e da invasão da Ucrânia pela Rússia. Outra explicação é que os encargos da dívida tornam algumas economias mais sensíveis do que outras ao crédito mais restrito.
O crescimento econômico dos EUA continua resiliente apesar dos repetidos aumentos da taxa de juros pelo Federal Reserve. Na semana passada, o Fed sinalizou que deve elevar os juros para um pico mais alto do que o esperado anteriormente, embora talvez em doses menores. Muitos em Wall Street veem a taxa básica dos EUA em 5% no próximo ano.
Por outro lado, Reino Unido, Austrália e Canadá já recuam ou indicam que não serão tão contundentes nos próximos meses em meio a preocupações de que a política do Fed possa levar suas economias à recessão.
Deixar de lado o que o economista da TS Lombard, Dario Perkins, chama de “sincronização monetária do pico” não será simples.
A alta do dólar deste ano impulsionada pelo Fed já causa estragos entre países em desenvolvimento muito endividados e economias avançadas dependentes de energia e de outras importações cotadas na moeda americana.
“As coisas podem ficar ainda mais confusas” se as autoridades monetárias nos EUA avançarem com mais aumentos dos juros, e bancos centrais com economias mais fracas decidirem não seguir pelo mesmo caminho, escreveu Perkins em relatório a clientes.
A divergência ficou evidente na semana passada. Enquanto o Fed e o Banco da Inglaterra subiram as taxas de juros em 0,75 ponto percentual, seus respectivos líderes adotaram tons diferentes sobre o que está por vir.
O presidente do Fed, Jerome Powell, enfatizou que o banco central dos EUA tem “um caminho a percorrer” antes de encerrar o ciclo de aperto monetário, mesmo ao admitir a possibilidade de um aumento menor em dezembro. A taxa de referência dos EUA está agora entre 3,75% e 4%.
Já o presidente do Banco da Inglaterra, Andrew Bailey, confrontou as expectativas do mercado sobre a escala de aumentos futuros em meio a temores de que essa rota aprofunde uma recessão que é praticamente certa.
Durante grande parte do ano passado, os bancos centrais estiveram engajados no que o economista do Bank of America (BOAC34), Ethan Harris, chamou de “competição para ver quem consegue subir mais rápido”, em referência às taxas de juros.
Fazia sentido, já que a inflação os pegou de surpresa ao subir para os maiores níveis em uma década com juros historicamente baixos.
Mas agora a situação começa a mudar, mesmo com a inflação ainda muito acima das metas na maioria dos países.
Os custos de financiamento são significativamente mais altos e começam a afetar o crescimento econômico ou os mercados de trabalho.
Algumas economias também são mais sensíveis do que outras a juros crescentes por causa do endividamento de famílias e empresas ou mercados imobiliários que são influenciados por hipotecas de taxa variável. Entre eles, segundo Perkins: Reino Unido, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e Noruega.
Um índice do Credit Suisse Group (C1SU34) mostra que decisões surpresa “dovish” de bancos centrais, ou seja, de alívio monetário, recentemente começaram a superar as “hawkish”, ou de aperto.
Mas defensores de juros mais altos dizem que, apesar de toda a conversa sobre uma guinada da política monetária, o pico das taxas globais ainda não foi alcançado e isso pode não acontecer até o fim do primeiro trimestre de 2023, ou além desse prazo, se a inflação não diminuir.
A inflação global agregada está em 9%, quase cinco vezes acima dos 2% que a maioria dos bancos centrais vê como estabilidade de preços, segundo economistas do Citigroup, que projetam probabilidade de 50% de uma recessão global no próximo ano.
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