Do total das exportações brasileiras, 10% vão para os Estados Unidos. Isso representa 2% do PIB. Adicionalmente, a pauta de exportação brasileira para os EUA é fortemente concentrada em commodities como petróleo, minério de ferro, aço, carne bovina e máquinas e equipamentos para geração de energia. Itens de maior valor agregado, como papel e celulose ou bens de capital, têm peso reduzido nessa balança comercial.
Com isso, o impacto direto da tarifa tende a ser limitado pela alta demanda global por commodities e pela capacidade de redirecionamento parcial desses produtos a outros mercados, analisa Gabriel Barros, economista-chefe da ARX Investimentos.
“Nossas estimativas iniciais sugerem que, em um cenário de tarifa de 40% sem retaliação brasileira, o PIB cairia pouco menos de 0,2%, com queda modesta nas exportações reais e nos investimentos”, afirma Barros.
Para o Goldman Sachs, se forem “duradouras e sem grandes retaliações”, as novas tarifas de Trump podem causar um impacto negativo de 0,3 a 0,4 ponto porcentual no PIB brasileiro. O cenário-base do banco americano já contempla efeito de 0,1 ponto porcentual.
“Como a pauta exportadora do Brasil é predominantemente composta por commodities, o mais provável é que haja um deslocamento para outros mercados, com impacto relevante, mas menos dramático sobre as exportações brasileiras”, dizem os analistas da Monte Bravo, em relatório.
Entender o imbróglio de relações comerciais só é possível quando colocamos luz nos dados comerciais entre Brasil e EUA, junto dos outros dois principais parceiros, China e Argentina.
Principais parceiros comerciais do Brasil, além dos EUA
Atualmente, a balança comercial do Brasil é superavitária nas trocas com Argentina e China, mas desde 2009, deficitária com os Estados Unidos, em aproximadamente US$ 13,5 bilhões, segundo dados do Ministério da Economia (Comex Stat). Enquanto as exportações para os EUA foram de US$ 35,2 bilhões, em 2024, as importações somaram US$ 48,7 bilhões no mesmo ano.
Em outras palavras, os dados mostram que a afirmação de Donald Trump de que a relação comercial com o Brasil é deficitária para o mercado americano não confere.
Somos, principalmente, um exportador de commodities e basicamente 40% de todas as exportações brasileiras em 2024 foram para China e Estados Unidos, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic).
A China recebeu 28% de tudo o que o país exportou no ano passado, com destaque para soja em grão, petróleo e minério de ferro. Os EUA foram o destino dos outros 12% em exportações do Brasil, sendo petróleo, semiacabados de aço e aeronaves os principais itens exportados.
Empresas como Embraer e WEG, que têm boa parte de suas vendas concentradas para os americanos, além de empresas de agro, podem ser mais afetadas, apontam analistas. Outras que estavam em processo de compra ou fusão com concorrentes americanas também podem ser afetadas.
Sobre o que compramos dos nossos dois principais parceiros, 24% das importações brasileiras vieram da China e 12% dos Estados Unidos, em 2024.
“Fim do mundo não será, mas que tudo isso pode afetar fortemente as exportações brasileiras, pode. Porque, por mais que possamos buscar novos parceiros, não se transforma um mercado em outro rapidamente, ainda mais em um cenário de tanta incerteza global”, Lia Valls, economista da FGV IBRE.
O que está agora em negociação
Os dados de realidade, aliados ao tom da carta de Trump ao presidente Lula, fazem com que os analistas acreditem que a medida foi motivada em grande parte por fatores políticos, e não econômicos.
Paul Krugman, americano Nobel de Economia, publicou um artigo ontem, logo após o anúncio de Trump, também defendendo a ideia de que não havia justificativa econômica para tal medida.
“Essas exportações para os EUA representam menos de 2% do PIB brasileiro. Trump realmente imagina que pode usar tarifas para intimidar uma nação enorme, que nem sequer depende muito do mercado americano, a abandonar a democracia?”, escreveu ele.
A expectativa, então, é que o Brasil tente negociar antes de optar pela retaliação.
Gabriel Barros calcula que, caso o Brasil opte por retaliar com tarifas próprias, o impacto sobre o PIB seria mais negativo, com contração próxima a 0,3%. Além disso, ele acredita que haveria uma aceleração inflacionária adicional decorrente do aumento de preços internos e da incerteza cambial, o que poderia forçar o Banco Central a elevar a taxa de juros.
É que uma retaliação – o aumento de tarifas de produtos importados dos Estados Unidos – e, assim, reduzir ou encarecer os produtos vindos daquele país. Como importação é sinônimo de entrada de dólares, isso poderia fazer o real se desvalorizar. E isso pode provocar efeitos ainda mais negativos sobre os investimentos e sobre a inflação. Logo, para o economista uma resposta imediata do Brasil pode ser contraproducente.
“A estratégia mais eficaz para o Brasil seria a adoção de medidas de estímulo fiscal, parafiscal e de crédito direcionado para amortecer o impacto negativo pontual, sem necessariamente adotar uma retaliação tarifária ampla”, defende.