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Bolsa brasileira caminha para fechar 2022 sem IPOs pela primeira vez desde 1998

Juros altos e cenário macro pessimista desmotivaram estreias, dizem especialistas.

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O mercado de ações brasileiro caminha para fechar 2022 sem nenhuma estreia na bolsa de valores. A exceção seria a gestora carioca Urca, que nesta quarta-feira (7) abriria seu capital na B3 ao emitir BDRs (Brazilian Depositary Receipts) – mas a oferta foi cancelada por falta de demanda.

A escassez de IPOs (Oferta Pública Inicial, na sigla em inglês) vem após um boom nos dois anos anteriores, quando cerca de 70 empresas estrearam na B3 (B3SA3). 

Fachada da entrada principal da B3 em São Paulo, Brasil 22/12/2017 REUTERS/Paulo Whitaker

Como a oferta da Urca não aconteceu, essa foi “a primeira vez desde 1998 que a bolsa não teve nenhuma oferta inicial”, como destaca Murilo Breder, analista de investimentos da NuInvest.

“Normalmente as aberturas de capital acontecem em época de bonança no mercado. Afinal, os diretores certamente gostariam de ver as ações da sua companhia valendo o maior valor possível. Há até uma piada no mercado financeiro: IPO = It’s Probably Overpriced (está provavelmente muito caro)“, comenta Breder.

Juro mais alto impactou ofertas

Os especialistas atribuem essa mudança de tendência, especialmente, à mudança no cenário dos juros. Com a taxa Selic mais alta, encerrando 2022 em 13,75% ao ano, o mercado de ações naturalmente fica menos atrativo.

“Com a virada da curva de juros – ou seja, o Brasil saindo dos antigos 2% de taxa Selic ao ano para os atuais 13,75% –, as ações tendem a ficar mais baratas, tem um processo de depreciação”, afirma Leandro Petrokas, diretor de research e sócio da Quantzed. “Ficou mais difícil de ter IPO a preços atrativos ou que chamassem atenção de novas empresas.”

Outro ponto é o histórico – ou seja, o alto número de estreias em 2020 e 2021. “Os principais IPOs vieram logo em 2020 já que, apesar de ‘apenas’ 28 aberturas de capital naquele ano, eles somaram um total de R$ 117 bilhões em captação. Em 2021, apesar dos 45 IPOs, a captação total foi bem menor – R$ 65 bilhões, já demonstrando uma certa saturação por parte do mercado“, analisa Breder.

Mas o cenário mais pessimista para o mercado de renda variável, de maneira geral, também está entre as explicações, como aponta Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset Management. 

“O motivo de várias empresas cancelarem ou adiarem o seu IPO vem do cenário macroeconômico bastante desafiador, marcado principalmente pela a alta de juros por diversos países para combater o aumento da inflação, o que aumenta os receios para uma possível recessão”, afirma Gonçalves.

Ele complementa: “Tensões do período eleitoral e incertezas políticas no Brasil, os conflitos entre Rússia e Ucrânia que continuam até os dias de hoje. Todos esses motivadores corroboram para um ano marcado sem IPO na bolsa de valores.”

Cenário adverso afastou investidores

Bruno Madruga, sócio e Head de Renda Variável da Monte Bravo Investimentos, acrescenta que o cenário adverso faz com que grandes investidores prefiram aportar seu dinheiro em empresas já consolidadas, reduzindo ainda mais a atratividade de possíveis estreantes. 

“Tem um movimento global, dúvidas quanto ao crescimento global. Investidores estrangeiros, até vendo a movimentação dos papéis das empresas no Brasil, preferem aportar diretamente em bolsa em empresas já listadas, sem ser uma situação de aposta nas empresas. Então, diminui a atratividade nesse cenário global para novos investimentos em empresas que não têm um histórico de negociação nem de divulgação de resultados. Então diminui a atratividade na parte dos IPOs.”

De qualquer forma, Madruga ressalta que não é porque houve redução de IPOs que as empresas estão necessariamente deixando de captar recursos. “Só o veículo é que mudou”, diz ele. “Como elas estão preferindo no ano de 2022 fazer essa captação? Através de títulos de renda fixa, exatamente por ter uma maior atratividade do investidor. Ou seja, através dos CRAs, CRIs, debêntures (que a gente teve um fluxo de emissão bastante representativo).”

Oportunidades à vista?

Breder, da NuInvest, comenta que “a [quase] ausência de IPOs reforça ainda mais os sinais de quão barata nossa bolsa está“. “Apesar do cenário ainda desafiador que ainda impede novas aberturas de capital de acontecerem por aqui, isso também significa uma boa oportunidade para o investidor de longo prazo comprar ações de excelentes companhias com desconto”, diz o analista de investimentos.

Mas ele lembra que, ao escolher uma ação em busca de boas oportunidades, o investidor deve ficar atento. Aguardar novas estreias, por exemplo, pode não ser uma estratégia certeira. “Há vários estudos que indicam a ineficiência de se comprar ações no IPO. Eles indicam que a maioria dos investidores perdem dinheiro ao comprar ações durante o processo de abertura de capital.”

Exemplo disso é o que ocorreu nos últimos meses na bolsa brasileira. “Com o mercado em queda por aqui, as ações das companhias que realizaram IPOs em 2021 sofreram ainda mais, com a maioria acumulando uma rentabilidade negativa no período – ou seja, são ações que valem menos do que quando foram lançadas na bolsa“, lembra Breder.

O que esperar em 2023?

Madruga afirma que, “no ano que vem, caso tenhamos a possibilidade de uma redução da taxa de juros“, o mercado pode ver uma reversão desse movimento de queda das estreias na bolsa, se “as empresas acharem um cenário mais atrativo para oferta pública de ações”. 

“Pode acontecer de, no segundo semestre de 2023, a gente ter alguma oferta de ações no mercado brasileiro. Vai depender da equipe econômica do novo governo, do cenário de inflação global e também interna, e possibilidade de redução de taxa de juros”, resume o especialista.

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