O governo foi, voltou, mas boa parte do aumento no IOF ficou. Vamos focar aqui em como a medida afeta a sua vida financeira. 

Ponto número 1: viajar para fora vai ficar mais caro. Antes, gastos com cartão de crédito no exterior pagavam 3,38%; no cartão de débito, 1,1%. Cartão de débito, nesse caso, são aqueles das “contas globais” – tem a da Wise, a do Nubank, a do C6… A instituição financeira abre uma conta em dólar ou em euro para você e te dá um cartão de débito que passa nas maquininhas gringas.  

Essa era a forma mais econômica de levar dinheiro para uma viagem. Dinheiro em espécie, vale lembrar, também pagava 1,1%, mas aí entram as taxas das casas de câmbio, geralmente maiores que as das contas globais, já que alguém tem de pagar pelo transporte de dinheiro físico.

Agora, os cartões de débito globais perderam a vantagem tributária. A partir desta sexta (23), eles pagam o mesmo Imposto sobre Operações Financeira (IOF) dos cartões de crédito. Na verdade, pagam um novo IOF, de 3,5% – que agora vale para o de crédito, o de débito e também para a compra de dinheiro de papel nas casas de câmbio. Não há saída

Resumindo: para cada R$ 10 mil que você gastava no débito da sua conta global, você pagava R$ 110 de IOF. Agora, cada R$ 10 mil vão custar R$ 350 de IOF. A cobrança vem na hora que você deposita o dinheiro na conta global, que é o momento em que o dinheiro sai do país.

Aí você voltou da viagem e sobraram alguns dólares na sua conta global. Você quer trazer de volta para a sua conta normal. A taxa aí é menor, e não mudou: 0,38%. Sobrou R$ 10 mil, você paga R$ 38 de IOF. 

A filosofia aí é simples. IOF sobre câmbio existe para desencorajar a saída de dinheiro do país – do mesmo jeito que IPVA existe para a manutenção do asfalto e dos semáforos. É natural, então, que na volta o dinheiro pague menos imposto. Mas claro: da mesma forma que o dinheiro do IPVA entra no balaio geral e o Estado pode gastar como bem entender, o do IOF sobre câmbio também serve para aumentar a arrecadação do governo.

IOF sobre investimentos lá fora

Até agora, falamos em dinheiro de viagem. Agora vamos entrar na parte de investimentos. Essa modalidade tinha um imposto menor, mas ele subiu também. 

Quando o governo anunciou a turbinada no IOF, na tarde de quinta, disse que o dinheiro enviado para uma corretora lá de fora, como a Avenue, pagaria 3,5% na ida – igual o das contas que alimentam cartões de débito globais. Depois, deu uma de Trump e voltou atrás.

Ficou assim: quer mandar dinheiro para comprar ações americanas direto na fonte? Ok. Até ontem, você pagava 0,38% de IOF. Agora, 1,1%.

Isso na ida do dinheiro. Na volta, vale a filosofia de não desestimular o retorno de dinheiro para o Brasil: segue o imposto magrinho, de 0,38%.

Resumindo: mandou R$ 100 mil para a corretora, paga R$ 1.100 de IOF. Trouxe R$ 100 mil de volta? Paga R$ 380.

Outra volta atrás do governo foi sobre o IOF em cima dos investimentos que fundos brasileiros fazem no exterior. A tarifa aí era zero. Tinha saltado para 3,5%. E voltou a zero. Haddad usou metade do vocabulário da língua portuguesa para explicar:

“Recebemos, depois do anúncio de ontem às 17 horas, uma série de subsídios de pessoas que operam nos mercados, salientando que aquilo poderia acarretar algum tipo de problema e passar uma mensagem que não era a desejada pelo Ministério da Fazenda.” 

O grande “subsídio de pessoas que operam nos mercados” foi o seguinte: o de que taxar em 3,5% os investimentos no exterior, seja de fundos seja de pessoa física, significaria uma medida de “controle cambial”, uma forçação de barra para reduzir a troca de reais por dólares. Assim, a demanda por moeda americana diminui, e o real desvaloriza menos.

Mas tudo às custas de destruir o rendimento, e minar a atratividade, de fundos multimercado que investem no exterior, incluindo ETFs com ações e títulos gringos. Seria como matar uma formiga com um míssil; você alivia uma pressão sobre o câmbio, só que arrasa um dos pilares do mercado financeiro no processo.

Como escreveu Tony Volpon, ex-diretor do BC, no X: “Colocar IOF de 3,5% em todo investimento feito por brasileiro no exterior é o início do fechamento da conta de capital, isso é controle cambial”. “Conta de capital” é o jargão para descrever o dinheiro que entra e sai não pelo comércio, mas por compra e venda de ativos, como ações. Seja como for, o recado estava claro.

E o governo acabou aliviando nessa parte, mas o arranhão na imagem fica para sempre. Como falou William Castro Alves, estrategista-chefe da Avenue, numa live sobre o assunto na sexta: “Warrren Buffett já disse: você demora anos para conquistar a confiança de alguém, e segundos para que ela desmorone”.