Finanças
Projeto que regula criptomoedas no país aumenta segurança, mas pode elevar taxas
Especialistas ouvidos listam os prós e contras do texto que define diretrizes para a prestação de serviços de ativos virtuais .
O Senado aprovou no último dia 26 de abril o projeto de lei que estabelece regras para os criptoativos, chamado de o primeiro marco legal das criptomoedas no Brasil, que passará por outra rodada de votação após ajustes. Segundo especialistas ouvidos pelo InvestNews, a mudança deve elevar a segurança nas transações com estes ativos digitais, mas também pode encarecer o custo do serviço das exchanges.
A proposta define diretrizes para as corretoras e outras empresas que prestam serviços com ativos virtuais, pretende proteger o investidor, prevê a criação de um órgão regulador e estabelece regras para o impacto ambiental da mineração de ativos digitais. O texto substitutivo ao PL 4.401/2021, aprovado pelo Senado, segue agora para análise na Câmara dos deputados e, caso aprovado, deve ir para sanção presidencial.
O que diz o projeto que regula criptoativos no Brasil?
O texto estabelece que ativos virtuais são representações digitais de valores que podem ser negociadas ou transferidas por meios eletrônicos e utilizadas para fazer pagamentos ou com propósito de investimento, com exceção de moedas nacionais, estrangeiras e eletrônicas.
O documento prevê ainda a proteção e defesa do consumidor e o combate a crimes financeiros, tipificando o crime de pirâmide financeira e estabelecendo pena para fraude em prestação de serviços de ativos virtuais, estabelecida entre dois a seis anos de reclusão e multa, acrescentando um novo artigo ao código penal.
Quanto às prestadoras, o texto define como pessoas jurídicas que prestam os serviços de troca entre ativos virtuais e moeda nacional, ou moeda estrangeira; troca entre um ou mais ativos virtuais, transferência de ativos virtuais; custódia ou administração de ativos virtuais ou de instrumentos que possibilitem controle sobre ativos virtuais ou participação em serviços financeiros e prestação de serviços relacionados à oferta por um emissor ou venda de ativos virtuais.
O relator do projeto, Irajá Abreu, disse em sessão deliberativa que o mercado de cripto movimentou, só no ano de 2021, R$ 215 bilhões em compra e venda de ativos virtuais, fora o mercado como método de pagamento, que cresceu na ordem de 6%.
Por ora, a regulamentação de ativos como NFTs (non-fungible token, termo em inglês para tokens não fungíveis) ainda é limitada no projeto de lei, e poderá ser regulada pelo Executivo após a lei ser aprovada e sancionada.
Impactos da regulação de criptomoedas no Brasil
Especialistas afirmam que as novas regras exercerão impacto positivo sobre os investidores.
Rodrigo Caldas, advogado especialista em blockchain e sócio da Carvalho Borges Araújo Advogados, afirma que a regulamentação de criptomoedas tende a trazer maior segurança, visto que impõe às exchanges a necessidade de autorização para funcionamento, em conformidade com padrões de KYC (Know Your Customer, termo em inglês para “conheça seu cliente”) e KYT (Know your transactions, termo em inglês para “conheça suas transações).
Já Helena Margarido, especialista em criptomoedas da Monett, que participou da audiência pública do Congresso sobre o projeto de lei original, de 2015, pondera que, apesar da maior segurança dada ao usuário, regulações, quando mais rigorosas, podem deixar o mercado menos atrativo para o investidor.
“Acho que elas tendem, num curto prazo, a desincentivar o empreendedorismo e a inovação, principalmente quando falamos de tecnologia. A partir do momento em que você tem um ambiente regulado, você dá menos espaço para as pessoas poderem criar e desenvolver soluções e serviços novos. Acho que tem esse lado ruim”, comenta.
Regulamentação específica ainda por vir
Embora o PL estabeleça diretrizes como a necessidade de licença de operação das exchanges, muitas das questões relativas à norma dependerão de regulamentação específica do Poder Executivo para se tornarem efetivas, explica Rodrigo.
Segundo o texto aprovado, o Poder Executivo ficará responsável por escolher o órgão regulador de criptomoedas no país, que ainda não foi definido.
Os especialistas mencionam que, se as regras vierem muito pesadas, um dos efeitos negativos gerar uma diminuição do número de players no mercado, e o consumidor poderia, eventualmente, ter menos opções para transacionar criptomoedas no país.
“A depender da regulamentação específica e dos parâmetros exigidos para obtenção de licença pelas exchanges, a exemplo do capital social mínimo, os pequenos players poderão enfrentar dificuldades no cumprimento dos requisitos em questão, resultando em maior concentração do mercado”, afirma Caldas.
Segundo Helena, com as corretoras internacionais, atualmente, a competição está bem acirrada e, por isso, o cenário é benéfico para o consumidor, que pode optar por exchanges que cobram menos taxas, ou por aquelas que operam somente dentro do país. Mas ela afirma temer que a regulamentação de criptomoedas restrinja a quantidade de opções dos usuários.
Margarido e Caldas comentam ainda que a regulamentação não terá muito impacto no preço dos ativos, mas que pode influenciar nas taxas que as corretoras cobram, no preço do serviço. Rodrigo acrescenta, no entanto, que a lei não deve produzir muito efeito para quem não negocia por meio das exchanges.
Prós e contras da regulação de criptoativos
O advogado comenta também que, dentre os pontos positivos do PL como está agora, estão mais um avanço no reconhecimento do setor, a definição de ativos virtuais, o alinhamento às diretrizes internacionais de combate à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo, a alíquota zero de impostos para importação, e a industrialização de hardwares e softwares necessários ao desenvolvimento do setor.
Além disso, ele acrescenta como benefício o fato de que o texto também determina ao Poder Executivo a regulamentação específica, possibilitando uma regulamentação mais técnica e ágil.
Já quanto aos possíveis pontos negativos, Caldas destaca a ausência de prazo para definição do ente responsável pela regulamentação específica e pela sua edição, a falta de definição de questões específicas relativas a DeFi, DAO e NFTs, e o não estabelecimento de parâmetros quanto às bases da autorização para as prestadoras de serviços de ativos digitais.