Apesar de o índice do segmento na B3, o Ifix, ter caído desde então, os investidores ainda mantêm a expectativa de que uma alta consistente e mais duradoura – o tal rali – vá acontecer no futuro próximo. Talvez em algum momento entre o quarto trimestre e o início de 2026. A senha para o início de um movimento de subida sustentada dos FIIs será a sinalização do Banco Central de que o primeiro corte de juros deste ciclo está perto.
Mas o que presidente americano tem a ver com o mercado de FIIs? Tem muito a ver, porque as tarifas elevaram as incertezas no Brasil e no mundo. Com a subida do prêmio de risco, a curva de juros futuros também se elevou. E as cotas dos fundos historicamente reagem mais ao movimento de juros do que ao próprio mercado imobiliário.
Isso acontece tanto porque nessas situações os investidores tiram os recursos de aplicações mais arriscadas, como a renda variável, classe da qual os FIIs fazem parte, como pelo fato de a remuneração dos fundos, na prática, espelhar a dos títulos públicos atrelados à inflação – o Tesouro IPCA+.
Grosso modo, é como se a valorização do imóvel no longo prazo pagasse a inflação, e a renda mensal que o fundo deposita na conta se torne o ganho real, aquele recebido além do IPCA. Acaba que quando há uma elevação na curva de juros futuros longos (como ocorreu com o episódio das tarifas) o preço das cotas cai, e o seu saldo em FIIs tomba junto.
Já quem compra nessa baixa garante um dividend yield (DY) maior. Por exemplo: se uma cota custa R$ 100 e paga R$ 0,66 por mês, temos aí um yield de 8% ao ano (R$ 0,66 x 12 meses = R$ 8). Aí, num momento de vacas magras do mercado, a cota cai para R$ 90. Como os aluguéis continuam chegando do mesmo jeito, a cota segue segue pagando R$ 0,66 por mês/R$ 8 por ano. O yield de quem compra a R$ 90, portanto, vai a 11%.
Por conta disso, o momento está atrativo para investir nos FIIs. Não faltam descontos nos preços das cotas e, o que leva a um rendimento com dividendos a um patamar historicamente alto. Para quem foca em renda passiva, é música aos ouvidos.
O DY médio do iFix está justamente em 11%. É bem acima da média dos últimos 10 anos, que foi de 8%.
Entre os diferentes tipos de FIIs há retornos ainda mais atrativos. Os fundos de papel, que investem não em imóveis, mas em títulos de dívida relacionados ao mercado imobiliário, têm apresentado yields anuais entre 12% e 14%, ou seja, entre 80% e 95% do CDI. Isso significa que apenas o dividendo distribuídos pelos portfólios garante o tão desejado retorno de 1% ao mês.
Já os fundos de tijolo, que compram imóveis de fato e colocam para alugar, têm apresentado um yield entre 9% e 10% ao ano. Apesar de menor comparado aos rivais de papel, historicamente os portfólios que investem em propriedades, como lajes corporativas, shoppings e instalações logísticas, tendem a se destacar em momentos de queda de juros ou encerramento de ciclos de alta. Segundo Bernardo Assis e Luis Noel, analistas de FII da Genial, “esse movimento está diretamente relacionado à queda dos rendimentos dos fundos de papel”.
Traduzindo: fundos de papel tendem acompanhar a Selic vigente. Se ela cai, o rendimento tomba junto. Com os fundos de tijolo é diferente. Compre uma cota que hoje rende 9% e, no futuro, caso tudo corra bem com o fundo, esse DY fica “travado”. Se a Selic/CDI cair a 8%, por exemplo, seu FII passará a render 112% do CDI.
Preços abaixo do valor real
Além do yield atrativo, existe atualmente uma diferença significativa entre o valor de mercado dos fundos listados e o valor patrimonial (P/VP). Ou seja, a soma do valor das cotas negociadas na bolsa está bem abaixo do valor real dos ativos dentro dos portfólios.
Em um ambiente de juros mais equilibrado, a distância entre os valores patrimonial e de mercado diminui, o que significa um ganho de capital para quem comprou na baixa. E se o juro básico cair para um dígito, os FIIs podem até chegar a ser negociados com ágio, ou seja, acima do valor patrimonial. Em ralis passados, o Ifix chegou a negociar com um ágio superior a 20%, como ocorreu entre 2020 e 2021, quando a Selic atingiu a mínima histórica de 2% ao ano. Na época, o rendimento dos FIIs era muito superior ao do CDI – por isso o ágio.
O Ifix negocia hoje com um desconto médio de 5% sobre o valor real dos ativos. Quando olhamos por segmento, entretanto, os descontos se revelam ainda maiores. Há, por exemplo, cotas de fundos de escritórios com preços até 30% abaixo da avaliação patrimonial. Na média desse grupo, essa diferença atinge 15%.
Enquanto isso, o segmento de shoppings ainda está com valor de mercado médio 7% menor na mesma métrica. A diferença se dá porque, mesmo cinco anos após a pandemia, a demanda pelo aluguel de lajes corporativas segue baixa. Os shoppings não têm esse problema, logo, negociam a preços mais próximos do valor patrimonial.
Já os fundos de papel, que concentram investimentos em certificados de recebíveis imobiliários (CRIs), têm sido negociados 6% abaixo do valor de face dos títulos.
Quando houver uma normalização no descompasso entre os valores de mercado e patrimonial, o ganho de capital pode alcançar os dois dígitos. E tem mais. Se essa eventual valorização das cotas for somada com os yields que você consegue capturar agora, o retorno absoluto pode passar de 20% em muitos casos. “Se o investidor esperar o cenário clarear e as incertezas cessarem para começar a investir, pode ter certeza que os preços serão outros”, afirma Marx Gonçalves, analista-chefe de FIIs da área de pesquisa da XP.
Oportunidades nas incertezas
Mas os FIIs não podem desvalorizar nos próximos meses? “Pode até ser, mas uma hora as cotas voltam a subir, porque os juros vão cair”, enfatiza Danny Gampel, sócio de chefe de crédito da Cy Capital. É liquido e certo que haverá volatilidade no curto prazo. Mas o especialista enxerga, dentro de um horizonte de médio prazo, uma janela de oportunidade para o investidor com perfil mais arrojado, ou seja, capaz de aguentar o sobe e desce do mercado nesse meio tempo.
Até porque o caminho até lá deve ser muito acidentado. Há vários fatores que podem fazer o mercado desandar de novo, além do próprio desenrolar das tarifas de Trump. Se houver, por exemplo, um cenário de maior deterioração das contas públicas e descontrole no endividamento por parte do governo, aumentam as chances de o BC demorar mais para cortar os juros. E, no caso de volta das pressões inflacionárias, como ocorreu em 2024 devido à desvalorização do real, a autoridade pode, no limite, até voltar a subir a taxa básica.
É aí que mora o risco.
Investidores escaldados
No início de julho, o mercado quase engatou um rali. No dia 4, o Ifix chegou a alcançar a máxima histórica. Apenas cinco dias após o recorde, porém, o otimismo do mercado bateu de frente com a muralha do anúncio das tarifas de 50%. Daí a renda variável como um todo ficou sem rumo. Os FIIs não foram exceção.
Em meio à confusão causada por Trump, os investidores têm mantido a cautela, mas não entraram no modo pânico, como mostra o próprio comportamento do Ifix. O índice apresenta uma queda de 1,54% desde o recorde em 4 de julho até o dia 22. Mas no ano, o referencial ainda acumula alta de 10,43%.
O que mudou de 2024 para cá
O cenário é diferente do ano passado. Os FIIs chegaram a ensaiar, entre junho e julho, uma alta sustentada de olho em um possível início do ciclo de queda de juros no fim de 2024. Mas o que se viu ali foi o contrário, o BC teve de voltar a subir os juros e, de agosto a dezembro de 2024, o Ifix amargou uma queda acima de 14%.
Agora, mesmo com as tarifas, a visão dos investidores permanece mais para a de um copo meio cheio no médio prazo. Isso porque o BC não só parou de subir os juros como tem mantido a sinalização de que a maior possibilidade é de que o próximo movimento da Selic será para baixo.
No boletim Focus, do BC, o consenso do mercado aponta para o início do ciclo de baixa da Selic em 2026, talvez já no primeiro trimestre. Além disso, a proposta do governo de passar a taxar em 5% os ganhos dos FIIs a partir de janeiro de 2026 pode acrescentar um impulso extra ao mercado nos próximos meses, antes de acabar a isenção.