Uma virada nas tendências globais de inflação está reacendendo o interesse por títulos públicos de mercados emergentes, especialmente os emitidos em moeda local.

Pela primeira vez em mais de três décadas, os preços ao consumidor nos países emergentes estão subindo mais lentamente que nos desenvolvidos, segundo índices compilados pela Bloomberg — algo visto apenas brevemente durante o período atípico da pandemia.

Gestoras como Morgan Stanley Investment Management (MSIM) e Ninety One Plc estão entre as que apostam em novas altas para esses papéis, sustentadas pela expectativa de que os bancos centrais de países emergentes poderão cortar juros mais rapidamente do que os de economias desenvolvidas.

A mudança promete acrescentar mais fôlego a um ano já excepcional para investidores, com fortes ganhos em ações e títulos de dívida em dólares.

Inflação dos emergentes abaixo da dos ricos — algo inédito em 35 anos

O que anima os mercados é a queda acentuada da inflação.

De acordo com a Bloomberg, a inflação média anual nos emergentes caiu para 2,47% no terceiro trimestre, o menor nível desde o início de 2021.

Nos países desenvolvidos, o índice subiu para 3,32% no mesmo período.

“A implicação é que a política monetária pode se tornar mais favorável nos mercados emergentes”, afirmou Jitania Kandhari, vice-diretora de investimentos da MSIM.

Rendimentos reais atraem investidores

Os títulos de dívida em moeda local de países emergentes acumulam ganhos médios de 7% em 2025, superando os Treasuries americanos.

Em alguns mercados — como Hungria, Brasil e Egito —, os retornos ultrapassam 20% no ano.

O movimento é sustentado pelas expectativas de cortes expressivos de juros, e as novas leituras de inflação reforçam o cenário para uma flexibilização monetária mais profunda e rápida.

Brasil, México e Turquia lideram ciclo de cortes

Vários bancos centrais emergentes já iniciaram ciclos de redução de juros.

México e Polônia foram os mais recentes a afrouxar a política monetária, enquanto Tailândia, Coreia do Sul, Turquia e Índia devem seguir o mesmo caminho até o fim do ano.

Mesmo assim, as autoridades monetárias têm agido com cautela, mantendo taxas de juros reais elevadas — ou seja, bem acima da inflação.

No Brasil, o Banco Central manteve a taxa básica estável pela terceira reunião consecutiva, ainda que o juro real esteja em torno de 10%, um dos maiores do mundo.

Na Turquia, a taxa real é de cerca de 7%, enquanto Índia, África do Sul e Colômbia oferecem retornos acima de 3,5%.

Segundo Grant Webster, co-diretor de mercados emergentes da Ninety One, as taxas reais nesses países estão próximas do maior nível em mais de 20 anos.

“Esses mercados de maior rendimento ainda têm espaço para valorização — como a África do Sul e boa parte da América Latina, onde a inflação já não é uma preocupação, mas a política monetária segue apertada”, disse.

Moedas fortes e dólar contido

A atratividade das taxas elevadas também tem sustentado as moedas emergentes, com o real brasileiro e o forinte húngaro acumulando ganhos de dois dígitos frente ao dólar em 2025.

Ainda assim, flutuações do dólar continuam sendo um risco. Desde julho, a leve valorização da moeda americana gerou pequenas perdas em alguns índices de dívida local.

Mas analistas avaliam que o espaço para mais alta do dólar é limitado, já que é amplamente esperado que o o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) mantenha o ciclo de cortes de juros.

Mesmo investidores que preveem um dólar mais firme continuam otimistas com os títulos emergentes. O estrategista Alejandro Cuadrado, do BBVA, por exemplo, reduziu a exposição a moedas, mas mantém posição positiva em dívida soberana, apostando em ganhos de duration com a queda das taxas.

Da mesma forma, analistas do Amundi Investment Institute classificam os títulos locais de emergentes como uma “aposta de forte convicção”, com destaque para a América Latina — especialmente Brasil e México, por conta da melhora nas dinâmicas inflacionárias.

Menor risco relativo e confiança renovada

O esfriamento da inflação nos emergentes em relação ao mundo desenvolvido também tem beneficiado o mercado acionário.

Segundo Derrick Irwin, gestor sênior da Allspring Global Investments, a diferença de risco entre os dois blocos vem diminuindo de forma consistente.

“Pela primeira vez em muito tempo, o mundo emergente parece relativamente menos arriscado do que o desenvolvido”, afirmou.