Pedrinho BH, como é mais conhecido, ficou bilionário com seus supermercados. É o fundador da rede Supermercados BH, que já estampava como patrocinador não só a camisa do Cruzeiro, seu time do coração, mas também a dos rivais Atlético Mineiro e América. Uma política da boa vizinhança importante para uma varejista que lidera as vendas no Estado. São 395 lojas espalhadas por Minas e, mais recentemente, Espírito Santo.
Com um faturamento que supera os R$ 21 bilhões anuais, o grupo, fundado em 1996 ainda como uma mercearia, já é a 4ª rede em faturamento no país, à frente do GPA, dono das tradicionais bandeiras Pão de Açúcar e Extra.

O grupo é só um retrato de um movimento maior no varejo alimentar. Pela contabilidade da Abras (associação que representa o setor), 69% do faturamento dos supermercados brasileiros vem de grupos regionais. Há 10 anos, as redes locais respondiam por apenas 19% do bolo.
As contas acima se restringem aos 20 grupos que mais faturam, mas desenham perfeitamente um fenômeno: o da nova geografia dos supermercados, com as mega redes perdendo espaço para regionais, como Grupo Mateus, do Nordeste, e o próprio Supermercados BH. Em faturamento, as duas estão atrás apenas de Carrefour e Assaí.
O Grupo Mateus, aliás, é um caso emblemático de super-regional. A empresa criada por Ilson Mateus no Maranhão chegou à bolsa em outubro de 2020 com status de “joia garimpada no Nordeste”, nas palavras do time da XP.
Com uma estratégia de expansão bem-sucedida, o grupo concentrou seus esforços no Nordeste para virar o líder na região. E agora ensaia um avanço mais relevante também no Norte — já chegou a 70 lojas no Pará. No total, são 271.
A presença forte com diferentes formatos de lojas (varejo e atacado), é apontada por analistas como uma pedra no sapato das líderes, as nacionais Carrefour e Assaí.
Mas até o Mateus sentiu o peso que tem uma bandeira local no varejo alimentar: para crescer mais rapidamente em Pernambuco, Alagoas e Paraíba foi preciso se juntar a outro regional, o pernambucano Novo Atacarejo. Em junho deste ano concluiu a fusão com o grupo, do qual passou a ter 51%.
Tese de investimento
A força do varejo regional nos supermercados virou tese de investimento até para uma gestora de fundos. Há quatro anos, o Patria Investimentos colocou em operação a Plurix, uma empresa que controla uma série de marcas regionais como a Paraná Supermercados e a Boa, que atua no interior paulista.
No ranking divulgado neste ano, saltou nove posições em relação à lista do ano passado e hoje ocupa a 11ª colocação entre as maiores varejistas alimentares do Brasil. São 170 lojas e, de acordo com a companhia, existem “conversas avançadas” para mais aquisições nos próximos meses.
“Há dois anos, a Plurix faturava R$ 3,5 bilhões. Neste ano, devemos fechar em R$ 10 bilhões. É uma tese bem-sucedida”, diz Jorge Faiçal em entrevista ao InvestNews. CEO da rede desde agosto de 2023, o executivo é íntimo do setor. Foi CEO do GPA, dono do Pão de Açúcar e do Extra, e diretor, por anos, da operação brasileira do Walmart e do Carrefour.
A estratégia da Plurix tem respaldo no que boa parte dos especialistas no varejo alimentar atestaram nos últimos anos: os grupos regionais podem ser mais fortes do que grandes cadeias nacionais. Um exemplo disso foi a saída do Carrefour de Belo Horizonte, em 2023.
Naquele período, o grupo francês entregou 16 lojas ao grupo DMA, dono das redes EPA, Mineirão e Brasil Atacarejo. Todas marcas regionais. Antes disso, em 2021, já vinha operando as lojas sob a marca do também mineiro Supernosso. Em todo o Estado a quantidade de hipermercados com a marca Carrefour não chega a 10 unidades.
“Os vencedores do varejo alimentar são os regionais. Eles conhecem os hábitos locais, decidem rápido e atuam onde a concorrência é menos acirrada”, diz Faiçal.
Alberto Serrentino, especialista em varejo e fundador da Varese Retail, completa: “Os regionais têm um mix de produtos mais talhado para cada mercado específico”.
A Plurix, de qualquer forma, também retrata o outro lado desse fenômeno: o da consolidação de pequenos grupos em redes mais robustas, ainda que regionais.

“Muitas empresas sabem que, organicamente, não vão conseguir crescer o suficiente para poder ser competitivas, outras têm dívidas ou questões sucessórias. A perenidade depende de uma incorporação, depende da venda pra quem tem mais bala pra poder fazer as expansões necessárias. É aí que entramos”, prossegue Faiçal.
A grande expansão
Além da Paraná e da Boa, a Plurix reúne uma porção de marcas de supermercados que os moradores de cidades do interior de São Paulo, Paraná ou de Santa Catarina conhecem bem: Superpão, Avenida, Compre Mais, Empório Dom Olívio e Amigão.
Desde o início da operação, em 2021, a holding fez 12 aquisições. A mais recente, em 2024, foi a da Amigão, uma rede com 65 lojas espalhadas pelo interior de São Paulo e do Paraná, e que adicionou R$ 4 bilhões ao faturamento.
O formato é o do supermercado de bairro, com lojas de até 2.000 m², e ancorado em perecíveis e frescos, o que garante frequência. “Nosso cliente vai quase duas vezes por semana”, diz Faiçal.
O fundo de R$ 2,7 bilhões que o Patria usou para montar a Plurix ainda tem cerca de 10% do dinheiro disponível, o que garante caixa para mais compras. Segundo o executivo, há conversas avançadas com mais redes.
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A holding, diz Faiçal, prioriza expandir onde já opera, com o objetivo de ganhar densidade e escala regional. No radar, estão a macro-região de Campinas/Jundiaí, o oeste paulista (na região de Presidente Prudente) e Araçatuba.
Outra característica da Plurix é manter os sócios-fundadores dos supermercados como minoritários, atuando na gestão. “Quero a inteligência local. O time de cada praça sabe o que vende, a peça de açougue que o cliente prefere, a dinâmica do hortifruti, a sazonalidade da padaria”, diz Faiçal.
Ganhos de escala
É pela Plurix que acontecem as negociações nacionais com grandes indústrias, como Ambev, Unilever, Nestlé, e de serviços, como taxas de cartão. O back-office e os sistemas de software também são centralizados na operação da holding em São Paulo, bem como a gestão do e-commerce de todas as empresas do grupo e um programa de fidelidade único, o Mais Amigo, que já tem mais de 5 milhões de cadastrados.
Se você é dono de um supermercado regional independente não terá poder de barganha com os fornecedores, por não ter como comprar em volumes comparáveis aos de uma rede. É aí que o Patria coloca sua tese com a Plurix à prova. A holding centraliza caixa, estratégia e, claro, ganhos de escala.
O desafio, no fim das contas, é ganhar escala sem pasteurizar a rede, de modo que cada bandeira mantenha a personalidade de negócio local. Há um limite além do qual isso não seria mais possível? É exatamente isso que as redes regionais estão testando.