Enquanto os movimentos de Nelson Tanure concentram as atenções do mercado sobre o futuro da Braskem, um plano alternativo segue amadurecendo em silêncio — com apoio dos bancos credores da Novonor (a antiga Odebrecht), novos elementos de governança e conhecimento da Petrobras, que acompanha de perto as discussões.

A proposta, desenhada pela gestora IG4, do empresário Paulo Mattos, em conjunto com os bancos credores — Itaú, Bradesco, Banco do Brasil, Santander e BNDES — ganhou tração nas últimas semanas. E prevê não apenas a reestruturação da dívida e um aporte de capital, mas também a migração da Braskem para o Novo Mercado da B3, com reforço nos mecanismos de governança e maior influência da Petrobras na indicação de executivos.

“A ideia não é só resolver a dívida, mas destravar valor com uma nova governança e reposicionar a companhia em áreas estratégicas”, diz ao InvestNews uma das fontes a par do assunto, citando a produção de polímeros verdes como um exemplo. A Braskem é pioneira na produção de plásticos feitos a partir de etanol e mantém uma planta dedicada a esses biopolímeros em Triunfo (RS).

O avanço, ponderam fontes ouvidas pelo InvestNews, esbarra em uma trava formal: o contrato de exclusividade firmado entre Tanure e a Novonor em 23 de maio, com duração de 90 dias. A expectativa é que, tão logo esse prazo se encerre — em 21 de agosto — os credores retomem as conversas sobre a estrutura alternativa. Ainda assim, não está descartada a possibilidade de renovação do acordo entre Tanure e os Odebrecht.

O que parece claro neste momento é que, independentemente do cenário, a Petrobras quer ampliar sua ingerência na Braskem. Não necessariamente ampliando a participação, mas assegurando o direto de indicar mais nomes para as diretorias executivas.

Esse movimento parece natural — e até desejável, na visão de especialistas do setor –, dada a complementariedade entre o setor de petróleo e o petroquímico. Tanto é que atualmente grandes petroleiras no mundo têm investido pesado nessa indústria.

A Petrobras mantém diálogo com os bancos e foi informada da estrutura proposta por eles. A estatal também mantém diálogo com o grupo de Tanure. Para formalizar essas negociações, a companhia acionou, na semana passada, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Braskem em disputa

No centro da disputa está o poder de barganha desses cinco bancos, que acumulam quase R$ 19 bilhões em dívidas da Novonor, garantidas por ações da Braskem. No plano em discussão, a família Odebrecht pretende manter uma participação de cerca de 3,5% na petroquímica — condição considerada essencial para viabilizar o processo de recuperação judicial do grupo.

A proposta da IG4 — gestora que liderou reestruturações bem-sucedidas em companhias como a Iguá Saneamento e a CLI (Corredor Logística e Infraestrutura) — é vista com bons olhos pelos credores, por representar uma alternativa de maior recuperação financeira. Hoje, o valor de mercado da Braskem não cobre nem um terço do montante devido pela Novonor aos bancos. A empresa vale menos de R$ 8 bilhões em bolsa.

Entre os bancos, a principal resistência recai sobre o histórico de Tanure em negociações com credores — nas quais costuma buscar descontos agressivos. O receio é que, sob sua gestão, a reestruturação da Braskem preserve os interesses da Novonor, em detrimento da recuperação dos valores devidos. A proposta da IG4, por outro lado, não prevê haircuts obrigatórios e aposta na valorização das ações como via de compensação.

Nelson Tanure: empresário segue na disputa pelo controle da Braskem
Nelson Tanure: empresário segue na disputa pelo controle da Braskem (Ilustração: Daniela Arbex)

Controle dividido

Atualmente, a Novonor detém 50,1% das ações com direito a voto na Braskem, por meio da holding NSP Investimentos, enquanto a Petrobras possui 47% do capital votante. O restante está pulverizado entre minoritários.

As duas empresas compartilham o controle da companhia com base em um acordo de acionistas que exige consenso para decisões estratégicas. Além disso, a Petrobras possui direito de preferência sobre a fatia da Novonor, o que significa que qualquer proposta de mudança de controle só pode avançar com seu aval, seja por venda direta, seja via reestruturação.

A ampliação do papel da Petrobras na Braskem, inclusive, é um raro ponto de convergência entre todos os envolvidos — Novonor, Tanure, bancos e IG4. Outra avaliação consensual é que o impasse precisa ser resolvido com urgência, para que a Braskem encontre um novo rumo e a Novonor consiga avançar com seu plano de reestruturação.

Fator Alagoas

A Braskem está à venda há sete anos e teve diversas negociações interrompidas, cada uma delas por uma razão diferente. Agora, todas as partes parecem correr contra o tempo para evitar um dos riscos mais latentes nesse processo: o político. É que, paralelamente à disputa societária, a Braskem carrega um passivo bilionário relacionado ao afundamento do solo em bairros de Maceió. E esse pode ser um trunfo a ser usado na campanha eleitoral que acontecerá em 2026.

Segundo o balanço do primeiro trimestre, a companhia estima uma exposição remanescente de R$ 8,4 bilhões, além dos R$ 14,8 bilhões já desembolsados ou provisionados desde o início da crise.

Em Alagoas, o senador Renan Calheiros (MDB) — um dos nomes mais influentes da política local e pai do ex-governador Renan Filho — voltou a defender recentemente que a venda da Braskem represente uma “reparação histórica” à população afetada, com reforço nas indenizações e eventual retirada da planta do bairro Pontal da Barra.

Para qualquer candidato ao controle da empresa, o passivo ambiental de Alagoas não é apenas uma questão contábil — mas um risco jurídico, regulatório e político, especialmente em um ano pré-eleitoral.

Planta petroquímica da Braskem em Duque de Caxias (RJ)
Planta petroquímica da Braskem em Duque de Caxias (RJ) (Bloomberg)

Nos bastidores, o grupo de Tanure contratou a Aecom, empresa americana que auxiliou a Vale no caso de Mariana, para lidar com os desdobramentos técnicos do caso. Já a IG4 e os bancos trabalham para costurar um acordo com o Ministério Público e também buscar uma solução para o processo movido contra a Braskem na Holanda, relacionado ao mesmo episódio.

Apesar do caixa robusto — com cerca de US$ 2 bilhões disponíveis —, a situação financeira da Braskem gera apreensão. A alavancagem está em 7,9 vezes o Ebitda, segundo dados do primeiro trimestre, e a maior parte dos vencimentos se concentra a partir de 2028.

Procurados pelo InvestNews, IG4, bancos, Tanure e Petrobras não comentaram.