Agora, a BYD tenta reescrever essa narrativa com o lançamento de modelos de luxo com preço acima de US$ 200 mil.
A mais recente tentativa da empresa de se livrar da imagem de ser uma marca com modelos utilitários envolveu a construção de um espaço para corridas e testes automotivos, para atrair potenciais clientes das ruas para as pistas.
Pistas da BYD
A montadora, sediada em Shenzhen, inaugurou neste mês um circuito off-road em Zhengzhou, cidade com mais de 10 milhões de habitantes na China central.
O circuito faz parte de um plano de investimento de 5 bilhões de yuans (US$ 700 milhões) para criar pistas abertas ao público e projetadas especificamente para veículos de nova energia.
Por uma taxa de inscrição de 599 yuans, os fãs de carros esportivos podem experimentar uma hora de ação, incluindo um test drive em um modelo popular e uma volta na pista Yangwang U9, de 1 milhão de yuans.
Os exercícios no estilo gincana automobilística parecem uma espécie de promoção de vendas paga.
Mas por alguns dólares a mais, aspirantes a pilotos podem pagar para ter acesso a uma gama mais ampla da linha premium da BYD. É aí que as coisas ficam interessantes.
Os motoristas podem acelerar fundo em uma reta de 550 metros e tentar o slalom padrão, uma manobra em zigue-zague elegante e repetitiva; ou o moose testing, uma manobra de emergência mais agressiva, projetada para testar a estabilidade e a agilidade do carro.
Há até uma duna construída com mais de seis mil toneladas de areia que oferece uma inclinação de quase 30 metros, além de uma piscina, onde os veículos elétricos Yangwang podem ser testados na água.
Mudança de rumo
A BYD abrir tudo isso ao público em geral é uma mudança de rumo, já que montadoras tradicionais tendem a manter as pistas em sigilo para pesquisa e desenvolvimento.
Algumas marcas de luxo, como a BMW e a Porsche, oferecem testes de pista para compradores dos carros de alto desempenho, mas geralmente o foco está em uma única experiência.
A BYD não é a única montadora chinesa a entrar no automobilismo. O Zhejiang Geely Holding Group construiu várias pistas, inclusive o Circuito Internacional de Ningbo.
O fundador e presidente Li Shufu chegou a propor ao governo que as pistas de corrida que atendessem aos padrões internacionais recebessem apoio com terras e benefícios fiscais.
Enquanto isso, o protótipo SU7 Ultra, da Xiaomi, quebrou o recorde de volta na mundialmente famosa pista de Nürburgring, nas montanhas Eifel, na Alemanha, e a gigante da tecnologia já possui um clube para pilotos certificados pela Xiaomi.
Para os puristas do automobilismo, o conceito da BYD apresenta um paradoxo. A própria essência do esporte está há muito tempo ligada à experiência visceral: o rugido dos motores, a vibração da carroceria e a resposta crua e sem filtros da estrada.
Os veículos elétricos, por outro lado, são caracterizados pela operação quase silenciosa e aceleração linear instantânea.
Um piloto da velha guarda, acostumado à sensação tátil de uma troca manual de marchas, pode ver o zumbido silencioso de um motor elétrico como uma traição ao espírito do esporte.
O número crescente de recursos inteligentes e automatizados pode ser ainda mais frustrante.
Nas corridas tradicionais, a habilidade do piloto — a precisão das manobras com a embreagem, o freio e o acelerador — é o que leva o carro ao limite.
Mas correr com um veículo elétrico com funções de assistência ao motorista pode dar a impressão de que é o carro, e não o motorista, quem faz a maior parte dos ajustes.
“Depende muito da sua definição pessoal de ‘prazer de dirigir’”, disse Sean Zhou, comentarista de F1 em Xangai e influenciador do setor. “Não há dúvida de que é rápido, mas se você vai gostar ou não é uma questão subjetiva.”
Provavelmente, a BYD não tenta converter os fanáticos por carros, mas sim construir uma nova cultura de direção sem alienar a base de clientes.
Além de treinos e circuitos de corrida, a pista de Zhengzhou permite coisas mais mundanas, como tração inteligente nas quatro rodas e prática de estacionamento automatizado.