Após um início de ano difícil, a Kepler Weber aposta que a Argentina pode ser a boa notícia de seu centenário. A empresa brasileira que constrói armazéns para grãos projeta multiplicar por quatro seu faturamento no país vizinho em 2025 e consolidá-lo como seu terceiro maior mercado — atrás apenas de Brasil e Paraguai.

A retomada no mercado argentino, após anos de estagnação, é vista pela companhia como um sinal de virada no cenário internacional. “A Argentina ficou anestesiada por quase 20 anos. Agora, está saindo desse lugar”, disse Bernardo Nogueira, CEO da Kepler Weber. A meta é faturar cerca de R$ 20 milhões no país em 2025, um salto em relação aos R$ 5 milhões registrados em 2024.

Segundo o executivo, existe na Argentina uma demanda acumulada por mais de uma década. Isso porque a crise econômica acabou levando a uma espécie de sucateamento da infraestrutra. “Os caminhões são antigos, as estruturas estão deterioradas”, diz. Agora, Nogueira afirma que existe por lá uma “intenção real de modernização”. Ainda que o déficit de armazenagem não chegue a ser tão grande quanto no Brasil, a atualização do equipamento se torna necessária – o que representa uma boa oportunidade para a Kepler, conclui.

O otimismo da Kepler Weber se apoia em mudanças recentes nas regras cambiais e políticas econômicas do país, que voltaram a permitir a importação de bens industriais e o fechamento de contratos com empresas estrangeiras. No ano passado, o governo de Javier Milei também criou Regime para Grandes Investimentos (Rigi), que prevê benefícios fiscais e cambiais para projetos a partir de US$ 200 milhões.

Sem abrir muitos detalhes, Renato Arroyo, CFO da empresa, diz que há negociações avançadas para a construção de um grande projeto de armazenagem na Argentina, o primeiro desse porte em muitos anos.

Enquanto a Argentina surge como uma surpresa positiva, no Brasil, a Kepler Weber sofre com uma série de problemas enfrentados no setor agrícola. Um deles é a quebra de safra vivida pelos agricultores no ano passado. Ao mesmo tempo, a conjuntura atual é bastante desafiadora, com preços deprimidos da soja e do milho e juros elevados que travaram os investimentos no campo.

Com isso, o lucro líquido da Kepler Weber neste primeiro trimestre caiu 51%, para R$ 25,6 milhões. Já o lucro operacional (Ebitda) foi de R$ 52,9 milhões, recuo de 41,5%, com a margem recuando 9 pontos percentuais, para 14,8%.

Sinais de inflexão

Embora o segundo trimestre ainda deva apresentar margens pressionadas, a direção da empresa começa a ver no horizonte sinais de recuperação a partir da segunda metade do ano. O período forte de negociações para a Kepler Weber costuma ocorrer entre abril e outubro. E o Plano Safra, que entra em vigor em 1º de julho, é um motor de arranque para novos pedidos.

Bernardo Nogueira, CEO da Kepler Weber
Bernardo Nogueira, CEO da Kepler Weber (Divulgação)

Outra boa notícia é que a conjuntura do agro está mais favorável do que há um ano: a safra será recorde e os preços das commodities agrícolas. Esse preços ainda não estão deslumbrantes, mas contribuem para melhorar a rentabilidade do produtor rural. A previsão é que a produção brasileira de grãos alcance os 330 milhões de toneladas.

Nesse cenário, o CFO Renato Arroyo avalia que a empresa alcançou um novo “piso” operacional. Ele lembra que, entre 2015 e 2017, com a Selic também na casa dos 14%, a Kepler operou com margens próximas de zero — e chegou a registrar prejuízo em alguns trimestres.

Agora, mesmo com a taxa de juros na mesma faixa, a margem Ebitda em 12 meses está em 18,4%, bem abaixo dos 30% vistos entre 2022 e 2023, mas que reforça a leitura da companhia de que um “novo piso” de rentabilidade foi estabelecido. Para Renato Arroyo, os números mostram que a empresa alcançou outro patamar de resiliência, sustentado por diversificação e ganho de escala.

Partindo da ideia de que a rentabilidade está no “piso”, a Kepler Weber não vê alterações em seu plano de negócios. A tese da companhia é que o déficit de armazenagem no Brasil — estimado em 30% da produção nacional — vai continuar exigindo investimentos contínuos de indústrias, cooperativas e produtores.

Se a leitura estiver certa, a Kepler parece bem posicionada para colher os frutos da virada, seja em Campo Grande ou em Córdoba. “Logisticamente, estamos mais perto da Argentina do que de Porto Alegre”, diz Nogueira — uma referência à sede da companhia, em Panambi (RS), no noroeste do estado, a cerca de 130 km da fronteira com a Argentina e a mais de 370 km da capital gaúcha.