Negócios
Fabricante de chocolate BIS sente gosto amargo da disputa política no Brasil
Mondelez é alvo de campanha negativa após patrocínio a Felipe Neto e vê BDRs caírem .
A sexta-feira, 13, em pleno mês do Halloween, ocorrida na última semana, foi de travessura bem amarga no mercado financeiro. Naquele dia, os BDRs da fabricante de doces e snacks Mondelez (MDLZ34) chegaram a cair mais de 5% na B3, em meio a um suposto boicote à marca. Ao final da sessão, os recibos negociados na bolsa brasileira recuaram 3,67%.
O movimento teria sido incentivado por um acordo de patrocínio do chocolate Bis, pertencente à empresa norte-americana, que é dona da Lacta, e o youtuber Felipe Neto. Em seu perfil do X (antigo Twitter), o influenciador digital falou sobre a parceria, firmada em apoio ao evento de cultura pop e games CCXP, previsto para novembro em São Paulo.
Muito amor
— Felipe Neto 🦉 (@felipeneto) October 13, 2023
💙🩵💙🩵@BisOficial pic.twitter.com/BO16wM2W1N
Muito obrigado @BisOficial por estarmos juntos nessa jornada!
— Felipe Neto 🦉 (@felipeneto) October 10, 2023
Hoje no @Podpah 19h e em breve novidades na CCXP!#bisnaccxp23 #publi pic.twitter.com/z9DSFjYUZj
Bolsonaro x Lula
O anúncio, porém, causou a reação de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro nas redes sociais, com vários perfis incentivando sabotar o produto. Isso porque Felipe Neto manifestou publicamente apoio à candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva nas eleições presidenciais de 2022.
Daí, então, especulações dão conta de que o comportamento dos BDRs da Mondelez ao final da semana passada teve motivação política. No entanto, a sessão daquele 13 de outubro foi espremida pelo feriado na véspera (12) e o fim de semana, reduzindo a liquidez dos negócios no dia, o que, geralmente, distorce o desempenho dos ativos de risco.
Sabe-se que “números bem torturados confessam qualquer coisa”. É exatamente isso o que ressalta o cofundador da L4 Capital, Felipe Pontes, em sua comunidade de insights sobre o mercado no WhatsApp.
“Só olhando o gráfico do preço da ação, não é possível afirmar nada além de que a ação caiu”
cofundador da L4Capital, Felipe Pontes
Em busca de resposta, ele sugere olhar de forma mais ampla para o comportamento recente dos mercados globais. “O mercado todo caiu naquele período”, lembra o especialista. O Ibovespa mesmo fechou em queda de 1,11% ao final da semana passada, o que encurtou os ganhos semanais do período para menos de 1,5%.
Portanto, “seguidores de Bolsonaro passaram a defender o boicote e a comemorar a queda das ações da companhia, ignorando os fatores externos do mercado”, reforçou a Suno Asset, em um reels no Instagram. Aliás, na sexta-feira, a expectativa de uma inflação pior que a esperada nos Estados Unidos impactou as bolsas pelo mundo.
Já no início desta semana, os BDRs da Mondelez se recuperaram, acumulando ganhos de pouco mais de 4% entre segunda (17) e quarta-feira (18). “Aí alguém vai pensar: o patrocínio foi bom! Não, não foi”, ressalta o consultor da L4Capital.
Afinal, da mesma forma que o fato e a motivação não servem como justificativa para a queda, tampouco são válidos para a alta dos BDRs. “Estatisticamente, não houve qualquer evidência científica de algum efeito positivo ou negativo”, reitera Pontes.
Os números (não) mentem
Fica, então, a dúvida sobre o que exatamente levou a ação a cair naquela sexta-feira, 13. Afinal, por mais que os números (e os gráficos) não digam nada em relação ao contrato de publicidade entre Felipe Neto e a Mondelez, isso não significa que nem o empresário ou a empresa não irão sofrer consequências negativas devido à campanha de marketing.
“Isso não quer dizer que a Bis não tenha sofrido. Acho que sofreu”, avalia Pontes, referindo-se a uma eventual recusa coletiva de consumidores, especialmente apoiadores de Bolsonaro, de comprar o produto ou outras marcas da fabricante, como Oreo, Club Social, Halls etc.
Porém, contrariando as leis do livre mercado, nem sempre a concorrência ganha. Para implicar com Felipe Neto e a Mondelez, os chamados “bolsonaristas” passaram a defender o consumo do chocolate KitKat, da Nestlé.
A tradicional empresa suíça não tem BDRs listados na B3. Na Bolsa de Zurique, as ações vêm caindo desde o último dia 13.
Além disso, a Mondelez é subsidiária da Kraft Heinz, empresa que tem como principal acionista a Berkshire Hathaway, de Warren Buffett, mas que também tem a participação de fundos ligados ao 3G Capital, dos brasileiros Jorge Paulo Lemann, Marcel Hermann Telles e Carlos Alberto Sicupira, os mesmos da Americanas (AMER3).
Aliás, a lista de credores da varejista, após anunciar o rombo contábil de mais de R$ 40 bilhões no início deste ano, inclui ambas as fabricantes de chocolate. Em janeiro, a Americanas tinha dívidas de quase R$ 100 milhões com a Mondelez, valor inferior aos R$ 260 milhões de pagamentos devidos pela brasileira à rival Nestlé.
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Leis do mercado
Portanto, o “boicote” do bolsonarismo pode ter impacto mais nas vendas de guloseimas no Brasil do que no setor financeiro. Vale lembrar que Bolsonaro obteve mais de 58 milhões de votos válidos no pleito do ano passado. Ainda assim, é difícil saber o tamanho do impacto e o quanto as marcas Bis e KitKat representam do faturamento total de ambas as empresas.
Seja como for, a Mondelez, que tem ações listadas na Nasdaq, vem sendo uma opção para os investidores, que estão procurando empresas capazes de resistir às mudanças nos hábitos de consumo após a pandemia, uma vez que a empresa elevou seus dividendos ao longo dos ciclos de negócios e, historicamente, têm sido capazes de capturar fatia de mercado (market share) mesmo quando o consumo está enfraquecendo.
Portanto, optar por ações como Mondelez, entre outras nos EUA, é uma estratégia montada para concentrar-se mais em empresas que possam suportar os ventos contrários vindos do cenário macroeconômico com avaliações atraentes. “Ou seja, não é apostar na resistência do consumidor”, disse Matt Dmytryszyn, diretor de investimentos da Telemus Capital ao TradeNews, com informações do The Wall Street Journal (WSJ).
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