Em meio à guerra comercial de Donald Trump, a Gerdau — única brasileira entre as 50 maiores siderúrgicas do mundo — tem tomado decisões que podem redefinir seus negócios. No início de agosto, a empresa centenário informou que vai rever para baixo seu plano de investimentos no Brasil a partir de 2026. Além disso, o grupo já demitiu 1,5 mil funcionários no primeiro semestre deste ano por conta da deterioração do ambiente de negócios no país.

Nos Estados Unidos, o cenário é diferente. A empresa mantém trajetória de expansão, apoiada pela tarifa de 50% imposta pelo governo Trump sobre o aço importado, medida que favorece suas fábricas locais. O mercado americano já responde por cerca de 40% do faturamento da companhia, e a expectativa é de alta na demanda.

Se, de um lado, a tarifa impulsiona a operação norte-americana da Gerdau, de outro, cria obstáculos para o Brasil. Parte do aço chinês que antes seria exportado aos EUA agora desembarca no mercado brasileiro, pressionando preços e margens.

“Não faz sentido a gente continuar com patamar de investimentos tão grande no Brasil, já que a gente não consegue competir aqui de forma igualitária, isonômica”, afirmou o presidente da Gerdau, Gustavo Werneck, em entrevista recente. Primeiro executivo de fora da família Gerdau Johannpeter a comandar a empresa, Werneck é um dos principais críticos das ações tomadas pelo governo brasileiro com a crescente entrada do aço chinês.

O aço chinês é subsidiado pelo Estado e por isso chega ao mercado brasileiro mais barato, pressionando os preços internos e criando um cenário difícil para os produtores locais. As empresas brasileiras cobram mais medidas por parte do governo para barrar a entrada ou influenciar o preço do aço chinês. 

“Por conta da ineficácia do sistema de cotas e da ineficiência das autoridades brasileiras para evitar um ambiente de concorrência desleal, tomamos a decisão de reduzir os investimentos no Brasil”, declarou Werneck.

Expansão nos EUA

A Gerdau completa 124 anos em 2025. Fundada em Porto Alegre, a companhia teve o Brasil como base de crescimento nas primeiras décadas. A internacionalização começou nos anos 1980, em meio à instabilidade econômica do país, e se tornou a principal estratégia da empresa nas décadas seguintes.

Nos Estados Unidos, o crescimento ganhou força com o pacote de infraestrutura lançado pelo governo Biden em 2021. Atualmente, a companhia investe na modernização da estrutura produtiva já existente. Com cerca de 30% de capacidade ociosa no país, a Gerdau pode ampliar a produção sem a necessidade de novas usinas.

O papel da família

Gustavo Werneck assumiu o comando em 2018, logo após a companhia concluir uma reestruturação que envolveu a venda de mais de R$ 7 bilhões em ativos. A escolha abriu espaço para que a quinta geração da família Gerdau Johannpeter deixasse os cargos executivos e passasse a atuar apenas no conselho de administração, sem perder influência nas decisões estratégicas.

Atualmente, André Gerdau, Guilherme Chagas Gerdau e Cláudio Johannpeter ocupam três das seis cadeiras do conselho. Além de acompanhar a operação de perto, eles também participam do plano de sucessão familiar.

A sexta geração, com cerca de 40 integrantes, vem sendo preparada para assumir responsabilidades no futuro. Por enquanto, o foco é oferecer conhecimento profundo sobre os negócios, de modo que possam ocupar assentos no conselho mais adiante. Para organizar os interesses da família, há ainda um family office e um conselho de família, responsáveis por gerir o patrimônio e preservar a coesão de valores.

Um século de aço

O negócio começou em 1901, quando o imigrante alemão João Gerdau comprou uma pequena fábrica de pregos em Porto Alegre para tocar ao lado de seu filho, Hugo. O salto veio em 1946, quando Curt Johannpeter, genro de Hugo, assumiu a empresa. Com uma visão técnica e foco em gestão, ele verticalizou a operação e expandiu para a produção de aço.

Os filhos de Curt se juntaram cedo ao negócio e ajudaram a transformá-lo em líder nacional, especialmente no setor da construção civil. A partir dos anos 2000, a família iniciou um planejamento formal de sucessão, que culminou em 2007 com André Gerdau como CEO e seu primo Cláudio como vice-presidente industrial. Os cargos foram ocupados até 2018, quando Werneck assumiu.

No centro de um setor em transformação, afetado por disputas comerciais e pressões globais, a Gerdau hoje busca equilibrar tradição e inovação — tanto na escolha de gestores quanto na definição de suas estratégias. 

O InvestNews procurou os membros da família Gerdau Johannpeter que fazem parte do conselho de administração da Gerdau, mas eles não concederam entrevista.