A Petrobras corre contra o tempo. Com tanta pressa, o jeito foi deixar o discurso da transição energética em segundo plano e abraçar a missão de buscar com todas as forças novos campos de petróleo. E, assim, garantir a ampliação de sua capacidade de produzir óleo e gás.

O que pressiona a petroleira é que em menos de três anos sua maior fonte de recursos, o pré-sal, começa a entrar em declínio. Esse é o pano de fundo dessa recente mudança de postura da estatal.

Não significa que a Petrobras abandonou qualquer ambição verde, mas está claro agora que a prioridade é garantir que a exploração de petróleo se mantenha em crescimento. Nos últimos meses, a companhia assumiu de vez a sua vocação petrolífera. Nesse novo direcionamento estratégico, a chamada Margem Equatorial virou a engrenagem principal dos planos da empresa para os próximos anos.

A teleconferência de resultados do primeiro trimestre de 2025 deixou evidente essa guinada. “Temos que continuar a fazer o que fazemos bem: explorar, produzir petróleo e derivados e a comercializar com a melhor margem de lucro possível”, sintetizou a CEO da Petrobras, Magda Chambriard.

A executiva já tinha traçado essa linha de maneira explícita durante uma conferência mundial do setor realizado na cidade americana de Houston, no início de maio. “Let’s drill, baby“, afirmou, sem pudores, a chefe da petroleira brasileira a uma plateia repleta de investidores e executivos.

A fala da presidente da Petrobras fez alusão ao um mote proferido com frequência pelo presidente americano Donald Trump, o “drill, babe, drill” (perfure, babe, perfure, em tradução livre do inglês). O slogan lançado na primeira campanha do republicano em 2008 sintetiza a visão do mandatário dos EUA sobre priorizar o ganho econômico no curto prazo em relação às políticas de transição energética e combate ao aquecimento global.

Magda Chambriard, CEO da Petrobras
Magda Chambriard, CEO da Petrobras: “Let`s drill, baby” (Bloomberg)

A versão brasileira do ‘drill, babe, drill’ foi apresentada ao setor internacional com apoio do governador do Amapá, Clécio Luís (Solidariedade). Ao lado do político, a CEO da Petrobras defendeu a exploração da Margem Equatorial, que compreende uma região próxima à foz do rio Amazonas e se espalha por seis Estados, que incluem, além do Amapá, Pará, Maranhão, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte.

Futuro da Petrobras na Margem Equatorial

A área é crucial para manter a Petrobras no auge. Nas projeções do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a exploração das novas reservas podem acrescentar mais 1,1 milhão de barris ao dia na cota de produção nacional até 2029. Isso se a companhia obtiver a autorização dos órgão ambientais do país para perfurar a região ainda neste ano.

Isso significa que a extração de óleo da gigante nacional poderia subir para até 4,5 milhões de barris por dia nos próximos cinco anos. Tal volume consolidaria a Petrobras entre as cinco maiores do mundo.

Além disso, o crescimento da exploração na nova área pode compensar o declínio natural do pré-sal. A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) estimou que a produção da região de águas profundas comece a recuar a partir de 2027.

A Margem Equatorial tem reservas que podem ultrapassar 30 bilhões de barris recuperáveis. Só para se ter uma ideia do que representa esse potencial, hoje o Brasil conta com um volume de 15 bilhões de barris em reservas provadas, ou seja, validadas como viáveis comercialmente.

A exploração de petróleo na nova área, porém, ainda enfrenta incertezas diante da polêmica sobre o impacto ambiental. Nos planos da petroleira, há previsão de instalar 15 plataformas por lá até 2028. Isso, claro, se o Ibama deixar.

Crise na energia renovável

A mudança de discurso da Petrobras coincide ainda com uma crise recente em dois dos principais segmentos de geração de energia renovável no Brasil. Desde o apagão de agosto de 2023, o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) tem limitado a quantidade de energia que usinas eólicas e solares adicionam ao sistema.

Segundo empresas do setor, essa restrição levou a um prejuízo de R$ 1,6 bilhão aos geradores que utilizam esses dois tipos de fontes renováveis em 2024. Além disso, a medida desestimula a ampliação dos parques que geram energia elétrica a partir do vento e do sol.

A própria Petrobras tinha intenção de investir mais na geração eólica em alto-mar, chamada de offshore. A companhia chegou a anunciar no fim de 2023 a intenção de instalar 10 pontos de geração offshore, com capacidade para acrescentar 23 gigawatts ao sistema. Tal produção equivale a 78% de toda a geração eólica atual do país. Mas a redução de atratividade para investidores do segmento coloca em cheque a estratégia.

O pico da demanda por petróleo no mundo só será atingido no fim desta década. Isso segundo as projeções da Agência Internacional de Energia (AIE). Já a Organização de Países Produtores de Petróleo (Opep) se mostra mais otimista. Na visão do grupo, o consumo de petróleo ainda vai continuar a crescer ao longo da próxima década.

Essas estimativas se contrapõem à visão propagada no fim dos anos 2010 de que o pico do consumo já havia passado. Em 2020, por exemplo, tanto a AIE quanto a British Petroleum (BP) divulgaram relatórios nos quais afirmavam que o consumo de combustíveis fósseis iria cair ao longo dos anos seguintes como reflexo da transição energética e das mudanças de hábitos de consumo. A previsão se mostrou equivocada, uma vez que a demanda global continua a crescer.

Enquanto isso, a Petrobras segue acelerando na exploração do pré-sal no rumo de se tornar uma das cinco maiores petroleiras do mundo, posição que só vai poder segurar com ajuda da Margem Equatorial. A estatal anunciou em maio a descoberta de um novo reservatório de petróleo de “excelente qualidade e sem contaminantes” no bloco Aram, área na Bacia de Santos. “Estamos apostando fortemente na busca de novas reservas e os resultados estão vindo. Este ano, já anunciamos descobertas também em Brava e em Búzios”, disse Chambriard, em coletiva.

Gigante dos lucros

Os números da gigante brasileira reforçam que o petróleo se mantém como um dos setores mais importantes da economia global. Nenhuma companhia do país chegou perto dos resultados da petroleira, em números absolutos, no primeiro trimestre de 2025.

No período, a Petrobras registrou um crescimento de 48,6% no lucro líquido, que atingiu R$ 35,2 bilhões. Para se ter uma ideia, o segundo maior resultado de uma empresa brasileira listada na atual temporada de balanços pertence ao Itaú Unibanco, de R$ 11,128 bilhões, cerca de três vezes menor do que o ganho da estatal.

As receitas de vendas da Petrobras somaram R$ 123,14 bilhões nos três primeiros meses do ano, com uma alta de 4,6% frente ao mesmo período de 2024. De janeiro a março, a estatal investiu US$ 4,06 bilhões, o que representa uma elevação anual de 33,6%.

A petroleira tem elevado o volume de recursos para exploração e produção. Quase 90% do total investido no trimestre foi destinado a essa área. A companhia explicou no comunicado que esse aumento tem como objetivo “aumentar a capacidade de ativos existentes, implantar novos ativos de produção, escoamento e armazenagem”.

Em contraste, os recursos para o desenvolvimento de projetos de gás e “energias de baixo carbono”, como eólica e solar, receberam meros US$ 55 milhões, coisa de 63 vezes menos. Outros US$ 405 milhões foram destinados a áreas de refino e logística.