A receita líquida do terceiro trimestre da Mercado Libre, dona do marketplace Mercado Livre, ficou abaixo das estimativas dos analistas, apesar do salto na receita impulsionado pela expansão das políticas de frete grátis no Brasil e pelo crescimento contínuo das ofertas de cartão de crédito da companhia.

O Mercado Livre afirmou que a receita subiu 39% em relação ao ano anterior, para US$ 7,4 bilhões, acima da expectativa dos analistas de US$ 7,2 bilhões. Este é o 27º trimestre consecutivo em que a empresa registra crescimento anual acima de 30%.

O lucro líquido no terceiro trimestre foi de US$ 421 milhões (R$ 2,2 bilhões) abaixo da estimativa de US$ 489 milhões dos analistas, segundo dados compilados pela Bloomberg. Este é o segundo trimestre consecutivo em que os lucros da empresa decepcionam.

A companhia, sediada em Montevidéu, no Uruguai, e mais valiosa da América Latina em valor de mercado, registrou quase 77 milhões de compradores únicos em sua plataforma, um aumento de 26% em relação ao ano anterior.

Os resultados chegam às vésperas da primeira troca de liderança no topo da MercadoLibre, com o chefe de comércio Ariel Szarfsztejn assumindo o cargo de diretor-presidente em 1º de janeiro. Ele sucederá o fundador Marcos Galperin, que deixará o posto após 26 anos para se tornar presidente executivo, permanecendo envolvido na definição de estratégia e no direcionamento do uso de tecnologia pela empresa.

Pressão nas margens

Concorrentes internacionais como a Shopee, a Amazon e a Temu vêm ganhando espaço no Brasil, maior mercado da companhia. Recentemente, a Mercado Livre reduziu no país o valor mínimo para frete grátis de R$ 79 para R$ 19 para defender sua participação de mercado. A medida elevou os volumes e resultou na maior adição trimestral de compradores únicos da história da empresa, mas pressionou as margens.

“Neste trimestre, investimos em frete grátis, o que colocou alguma pressão de curto prazo nas margens, mas estamos extremamente satisfeitos com os resultados desses investimentos”, disse o diretor financeiro, Martin de los Santos, em entrevista. “Quando você reduz o patamar para frete grátis, você destrava muitos novos usuários e muito volume que vem para o online.”

O Mercado Pago, unidade de tecnologia financeira da companhia, processou mais de US$ 71 bilhões em volume total de pagamentos — alta de 41% em relação ao ano anterior — enquanto o marketplace da Mercado Livre cresceu 28% na comparação anual, para US$ 16,5 bilhões em volume bruto de mercadorias, o valor total dos bens vendidos. A carteira de crédito disparou 83% desde o ano passado, para US$ 11 bilhões, após o lançamento do cartão de crédito Mercado Pago na Argentina. O produto já é o cartão de crédito mais usado no Brasil.

Ainda assim, a lucratividade segue sensível a perdas de crédito maiores e a despesas logísticas, à medida que a Mercado Livre expande sua carteira de empréstimos e investe pesadamente em capacidades de distribuição diante da crescente competição tanto em e-commerce quanto em fintech nos principais mercados.

“O efeito líquido foi uma modesta queda anual na nossa margem de lucro operacional — um trade-off razoável por investimentos que ampliam nossos mercados endereçáveis, semeiam crescimento futuro, fortalecem nossa posição competitiva e impulsionam escala de longo prazo”, disse a empresa em carta aos acionistas.

No front de fintech, rivais como o Nubank, que amplia sua oferta de produtos no México, e a britânica Revolut, que vem construindo presença na América Latina, desafiam o Mercado Pago. O braço de pagamentos digitais da companhia tem crescido a um ritmo mais rápido que o de e-commerce devido ao uso crescente da carteira, do crédito e dos produtos de investimento.

“O importante para nós é o ecossistema, o fato de que os dois ramos se alimentam mutuamente — o negócio de comércio se beneficia de ter o Mercado Pago, e o Mercado Pago também se beneficia porque mais de 50% dos cartões de crédito são emitidos dentro do próprio marketplace”, disse de los Santos. “Ter um ecossistema de dois lados é uma vantagem competitiva única que nos ajuda a fazer crescer o ecossistema como um todo e as duas partes do nosso negócio ao mesmo tempo.”

A empresa também vem investindo fortemente em inteligência artificial para melhorar busca, modelagem de crédito e logística, parte de um esforço para aumentar a rentabilidade em seus negócios de e-commerce e fintech. Mais recentemente, lançou uma ferramenta de IA para aconselhar clientes sobre necessidades financeiras do dia a dia. Analistas esperam que Szarfsztejn, de modo geral, dê continuidade à estratégia de Galperin, com foco maior em controle de custos e eficiência operacional.

“A transição será mais uma continuidade do que uma mudança para nós”, disse de los Santos. “Teremos o melhor dos dois mundos — a intensidade do Ari tanto em comércio quanto em fintech, mantendo a visão e a liderança do Marcos como fundador da companhia.”