De um jeito bem mineiro, o grupo vem ampliando aos poucos sua sua participação na varejista. Até que em julho, eles já detinham 18% da companhia – se aproximando da fatia de 22,5% do francês Casino, ex-controlador do GPA e até hoje o maior acionista.
Além deles, Ronaldo Iabrudi e seu grupo têm 12% e Nuveen, 8%. O investidor Rafael Ferri detém algo em torno de 1,5% mas, junto com seu grupo, chega a perto de 5,5%. O restante do capital é bastante pulverizado.
A aposta do mercado agora é de que os mineiros vão avançar para uma fatia maior do GPA e assumir o controle da rede. Expectativa respaldada pelo fato de que os franceses já tratam a empresa como um ativo a ser vendido. Mas isso não quer dizer que os Coelho Diniz estejam com o queijo e a faca na mão.
O apetite da família despertou o interesse dos bancos, com a perspectiva de que há pouco fôlego de capital próprio para os Coelho Diniz ampliarem a participação. Alguns dos bancos têm acionado pessoas ligadas à família, ao setor supermercadista e mesmo ao GPA para saber mais sobre eles. E é aí que está a questão.
“O desafio para eles é que são muito pouco conhecidos pelos bancos mainstream”, diz uma das pessoas ouvidas pelo InvestNews. “Eles são bem mineiros” repetiram quatro pessoas próximas ao conselho do GPA.
Quem são os Coelho Diniz
Os Coelho Diniz são do tipo “come quieto”. Tanto é que há pouca informação sobre a família ou sobre grupo varejista na internet. “É difícil até indicar algum supermercadista que os conheça bem, porque eles não se enturmam nem vão aos eventos”, diz uma pessoa do setor supermercadista mineiro.
Hercílio Coelho Diniz e seus cinco filhos fundaram em 1992 a rede de supermercados de mesmo nome. A primeira loja foi lá em Governador Valadares, cidade da região do vale do Rio Doce e berço dos Coelho Diniz. O negócio prosperou e em 1997 eles inauguraram a primeira unidade em um imóvel próprio.
André é quem tem acompanhado mais de perto os negócios do Coelho Diniz recentemente. Além dele, no quadro societário constam Alex e Fábio, bem como Helton Coelho Diniz e Henrique Mulford Coelho Diniz. Os mesmos que investiram no GPA.
A rede tem um centro de distribuição e 22 lojas espalhadas por Governador Valadares e cidades próximas, como Teófilo Otoni, Ipatinga e Caratinga. A empresa não divulga suas informações financeiras, mas estima-se no setor que o faturamento da rede esteja ao redor de R$ 2,5 bilhões e R$ 3 bilhões ao ano.
Mas essa postura low profile da família não significa que a empresa seja desconhecida na região do Vale do Rio Doce. No Instagram, por exemplo, a rede de supermercados tem 362 mil seguidores – cerca de metade dos seguidores acumulados pelo Pão de Açúcar, que tem nada menos do que 190 lojas.
A família também tem forte ligação com a política local, na contramão desse perfil mais discreto como empresários. Hercílio Araújo Coelho Diniz Filho é deputado federal pelo MDB de Minas Gerais. Ele, porém, se afastou do dia a dia da empresa desde meados do ano passado, depois de conflitos com o então prefeito de Governador Valadares, André Merlo. Fato é que, no investimento dos Coelho Diniz no GPA, o nome de Hercílio não aparece.
Além dele, Alex Diniz, um dos irmãos, também está na política: é suplente do senador Cleitinho Azevedo, do Republicanos de Minas Gerais. Ao contrário de Hercílio, Alex está bem próximo dos negócios.
O grupo começou a se aproximar do GPA no fim de 2024. Mas foi em fevereiro deste ano que sua participação se tornou relevante. Os Coelho Diniz tentaram indicar dois integrantes ao conselho quando uma parte dos acionistas pediu uma assembleia para mudar as cadeiras: André Luiz Coelho Diniz e Leandro Assis Campos, indicação de Fábio Coelho Diniz. Mas só o primeiro foi eleito.
Em maio, após derrota da tentativa de emplacar três assentos no conselho, o empresário Nelson Tanure (dono da rede Dia, e controlador da Prio e da Light) vendeu sua participação, que terminou abocanhada justamente pelos mineiros, chegando a 10%. Em julho, uma nova ida às compras elevou a participação a 18%.
Visão de varejista
Administradores “pé no chão”, segundo uma pessoa com conhecimento do setor e do GPA, os Coelho Diniz viram no GPA um negócio bom a um preço baixo. No fim de dezembro, a ação da companhia tinha dificuldade em superar a barreira dos R$ 3,00.
Todos os conselheiros ouvidos pelo InvestNews afirmam que André faz mesmo o estilo mais discreto: mais escuta do que fala. E se posiciona muito mais sobre questões operacionais do que financeiras ou de governança. “A participação deles é muito de quem é varejista, de quem entende da operação”, diz um deles.
Na região do Vale do Rio Doce, o Coelho Diniz lidera o setor com lojas mais populares, mas também com lojas premium em bairros mais abastados – o que se assemelha mais ao perfil das lojas do Pão de Açúcar, por exemplo.
Nessas lojas, há espaços para adega de vinho, área de sushi ou um açougue com cortes mais nobres. “E eles têm um CD (centro de distribuição), cuja capacidade de operação é algo que se valoriza muito no varejo”, diz uma das fontes.
Outro conselheiro, porém, esperava mais do empresário. “Ele entra mudo e sai calado. Achei que seria mais proativo.”
O olhar especializado é considerado um ganho importante para o GPA que tenta voltar à rota de crescimento e rentabilidade. No primeiro trimestre, as vendas em mesmas lojas (SSS, na sigla em inglês) do Pão de Açúcar registraram alta de 6,5%, reflexo da estratégia recentemente intensificada de posicionar a bandeira como a líder do segmento premium.
Considerando o desempenho consolidado, que abrange também as lojas Minutos Pão de Açúcar e a bandeira Extra, a expansão foi de 7,3%, uma das mais expressivas do setor de varejo alimentar no período.
Nos relatórios dos bancos, os ganhos operacionais são reconhecidos e refletidos nas projeções. Ainda assim, a alavancagem em torno de 3 vezes continua sendo um ponto de atenção que leva os analistas a adotar uma postura mais cautelosa em relação às ações.
Uma saída à francesa
Além da capacidade de levantar capital para ampliar sua fatia no mercado, os Coelho Diniz têm de convencer o Casino a sair do negócio. E isso pode até parecer simples, já que o grupo francês é vocal em seu interesse em desinvestir na América Latina, mas não é bem por aí.
Antes da cisão do Assaí, o GPA valia algo em torno de R$ 7 bilhões. Hoje, o papel está na casa de R$ 3,50. O Casino vendeu toda sua fatia no Assaí, que já não tem mais nenhuma relação com os franceses, mas manteve pouco mais de 40% no GPA até vender quase metade da participação em um follow-on em abril de 2024, a R$ 3,20.
Agora, com o impacto do câmbio, a venda dos atuais 22,5% está menos atrativa para os franceses. Por enquanto, nada mudou para o Casino, que continua comprometido com o GPA pelo curto e médio prazo, segundo uma pessoa familiarizada com a gestão. E, nesse cenário, vender e levar a esse preço hoje faz pouca diferença para as contas do Casino na Europa.
E aí vira quase o “dilema da Tostines”, observa um conselheiro ouvido pelo InvestNews: “eles não vendem a esse preço, mas o preço não aumenta porque eles não vendem e continuam no negócio.” Há uma grande expectativa do mercado de que a saída do grupo francês melhore a governança no GPA.
A presença do Casino é, ainda que de forma velada, uma das razões para os debates no conselho, totalmente reformulado em maio. Parte dos conselheiros considera que é preciso ter mais olhar de dono e acelerar as melhorias, bem como a venda de ativos non core (fora da atividade principal) para lidar com os problemas de alavancagem e de passivos fiscais. E a remuneração dos conselheiros foi a primeira vez de discordância na nova formação, mas que terminou apaziguada e sem alterações.
Mais recentemente, um dos acionistas chegou a pedir para que a retirada da cláusula de poison pill fosse avaliada pelo conselho. A “pílula de veneno” no estatuto do GPA obriga a realização de uma Oferta Pública de Ações (OPA) caso um dos acionistas superar 25% do capital social.
O tema, porém, não avançou entre os conselheiros, que chegaram ao consenso de que o assunto precisa ser tratado na assembleia de acionistas. E de que não tem urgência no momento em que o grupo vive. “Combinamos de voltar ao assunto mais para frente”, diz um dos acionistas relevantes.
No ano, as ações do GPA se valorizaram 34%.