O lançamento de The Life of a Showgirl, novo álbum da megaestrela pop Taylor Swift, é a atualização de uma engrenagem de negócios que desafia o modo como a indústria da música opera. Aos 35 anos, Swift ocupa um lugar único no mundo do entretenimento: é, ao mesmo tempo, produto, marca, empresária e fenômeno macroeconômico.

A Bloomberg já definiu bem em uma matéria de capa, anos atrás: “Taylor Swift é a indústria da música”.

A frase resume uma carreira construída como quem ergue um edifício, pilar por pilar, cada andar mais sólido que o anterior. O resultado é a presença constante no topo das paradas e um impressionante império econômico sustentado por quatro pilares centrais: a música, os fãs, a autonomia sobre a própria carreira e os espetáculos que a loirinha oferece ao seu dedicado e crescente público.

O InvestNews mergulhou nesse modelo de negócios para entender como uma adolescente do country se transformou em força econômica capaz de movimentar PIBs nacionais e ser citada em relatórios de bancos centrais.

1) A música como narrativa pessoal

Ao contrário de muitas estrelas pop, Taylor Swift escreve praticamente tudo o que grava. Suas canções têm origem em diários pessoais, o que cria uma conexão íntima com a base de fãs. Para eles, ouvir cada faixa é como compartilhar a vida da artista em tempo real, acompanhando amores, conflitos e recomeços.

Esse componente narrativo é a base de um mecanismo de renovação constante na música dela, o que se reflete nos álbuns cuidadosamente planejados, de tal forma que cada um deles constitui também uma “era”: Fearless, marcada pelo romantismo country; 1989, a guinada para o pop cosmopolita; Reputation, mais sombria e confrontadora; Folklore, introspectivo e minimalista.

A cada era, um pacote completo: estética, letras, performances e identidade visual. Essa estratégia evita a saturação da imagem, cria expectativa em torno da próxima transformação e abre espaço para reposicionamentos de marca. Os álbuns de Taylor Swift funcionam como capítulos de uma saga que milhões de pessoas querem consumir e reinterpretar.

2) Os swifties: comunidade como ativo econômico

Mas não há narrativa sem público. É aqui que entram os swifties, a comunidade de fãs que funciona como exército voluntário. Eles são a prova contundente de como a música em tom pessoal de Taylor Swift, a personalidade e o carisma da cantora são capazes de se conectar de maneira íntima com milhões de pessoas ao redor do planeta.

Os swifties têm em comum a devoção pela artista, e Taylor cultiva como ninguém o fervor que faz de seus fãs a base de sua estratégia de marketing. Seus lançamentos começam sempre pelos seguidores mais fiéis, alimentados por easter eggs escondidos em clipes, figurinos, unhas, posts de rede social. Cada pista desencadeia uma avalanche de teorias, debates e viralizações.

Quando o consenso entre os fãs é de que “algo está por vir”, forma-se a primeira onda de divulgação. Quando o anúncio oficial chega, os mesmos fãs amplificam a mensagem, gerando a segunda onda. O efeito é uma máquina de marketing descentralizada e incrivelmente eficiente.

“Quanto será que eu consigo antecipar? Será que eu posso insinuar algo com uma antecedência de três anos? Acho que vou tentar fazer isso”, disse ela ao apresentador Jimmy Fallon em 2022.

Essa relação é reforçada por gestos de proximidade. Swift já realizou as chamadas Secret Sessions, encontros em que selecionava fãs para ouvir álbuns antes do lançamento. Cada detalhe reforça a sensação de intimidade com a cantora. É comum que Swifties se relacionem com a artista como se ela fosse uma amiga pessoal, alguem a quem confiam segredos, ainda que a grande maioria nunca tenha a chance de falar com Taylor.

O resultado aparece nos números. Durante a Eras Tour, fãs gastaram em média US$ 1.300 por show nos Estados Unidos, considerando ingressos, hospedagem, transporte e consumo. É um efeito que ultrapassa a música: a artista ativa cadeias inteiras da economia, como veremos mais adiante.

3) CEO de si mesma

No cerne do modelo está uma característica rara na indústria fonográfica: o controle de tudo por parte do próprio artista. Swift sempre deixou claro que queria ser dona de todos os seus masters — as gravações originais de estúdio. Isso levou a uma longa batalha pública com os proprietários dos masters de seus seis primeiros discos.

Ela podia não ter as gravações, mas tinha os direitos autorais sobre as obras por ser compositora das canções. Taylor decidiu, então, regravar as canções, criando o selo “Taylor’s Versions“. Era um apelo para que seus fãs abandonassem as versões originais, aderissem às novas, e ainda uma estratégia para apresentar a uma nova geração de fãs as músicas que ela criou quando era adolescente.

O público aderiu, o que provavelmente fez as gravações antigas perderam valor de mercado – um fundo de investimentos chegou a pagar US$ 300 milhões pelas masters. Agora, em 2025, a cantora fechou um acordo para recomprar os masters dos seis primeiros discos. Taylor Swift não revelou quanto pagou para obter a propriedade neste novo acordo.

O gesto foi coroado com uma carta aberta aos fãs, onde ela escreveu:

“Toda a música que eu fiz agora pertence a mim. Todos os meus clipes, todas as filmagens dos meus shows, a arte dos álbuns e a fotografia. As músicas ainda não lançadas, as memórias, a mágica, a loucura, cada uma das minhas eras, todo o trabalho da minha vida.”

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Capa da revista Bloomberg Businessweek de novembro de 2014.

Foto: Reprodução

Essa postura “dona de mim” vai além da regravação. Em 2014, Swift removeu todo o catálogo do Spotify por considerar injusta a remuneração. Voltou apenas três anos depois. Em 2015, escreveu uma carta aberta à Apple exigindo pagamento aos artistas mesmo durante o período gratuito do Apple Music. Ganhou a batalha em menos de 24 horas.

Swift pode vender docilidade em algumas de suas letras, mas quando o assunto é propriedade intelectual e dinheiro, atua como uma executiva de mão firme. Ela faz questão de estar no controle.

4) Muitos, muitos shows

Se os álbuns são diários musicados, os shows são a tradução máxima do império Swift. A Eras Tour, iniciada em 2023, quebrou todos os recordes conhecidos: US$ 2,1 bilhões arrecadados, mais de 10 milhões de ingressos vendidos em 149 shows que aconteceram em 21 países. É a maior turnê da história da música, praticamente o dobro do US$ 1,1 bilhão faturado pela Music of the Spheres World Tour, da banda inglesa Coldplay, que ocupa a segunda posição no ranking.

O impacto foi além da bilheteria. A U.S. Travel Association calculou que apenas a etapa americana gerou US$ 5 bilhões em gastos diretos. O impacto econômico total dos 53 shows nos Estados Unidos é estimado em US$ 10 bilhões, algo em torno R$ 53 bilhões.

O fenômeno entrou até em relatórios do Federal Reserve da Filadélfia. A representação do banco central americano disse que a Filadélfia registrou o mês mais forte em receita hoteleira desde a pandemia “em grande parte devido ao fluxo de visitantes para os shows de Taylor Swift”. No Reino Unido, o Barclays estimou que a turnê acrescentaria £1 bilhão ao PIB britânico. Em Singapura, seis apresentações provocaram alta de 0,5 ponto percentual no PIB local.

E não faltaram efeitos inusitados. Em Seattle, o público pulando em uníssono durante Shake it Off gerou tremores equivalentes a um terremoto de magnitude 2,3, registrados por sismógrafos como um “Swift-quake”.

A turnê histórica foi responsável por tornar Taylor Swift bilionária, marco atingido em outubro de 2023, segundo a Forbes – o que fez dela a primeira artista e se tornar bilionária somente com o dinheiro ganho por meio das músicas e dos shows, sem contar outros empreendimentos empresariais.

A Forbes calcula a fortuna de Taylor em US$ 1,6 bilhão, divido em US$ 800 milhões advindos de royalties e rendas com os shows, US$ 600 milhões pelo catálogo próprio e mais de US$ 100 milhões em imóveis.

Uma nova era

O novo álbum, The Life of a Showgirl, surge como produto e reflexo desse momento. Foi concebido durante o período da Eras Tour e funciona como síntese de uma artista que transformou, com muito sucesso, a própria vida em espetáculo.

A lógica é circular: experiências viram letras, letras se transformam em eras, as eras movimentam fãs, fãs sustentam turnês, turnês criam impactos econômicos que retroalimentam a narrativa de poder. O ciclo se fecha, pronto para recomeçar.