Moraes reagiu com ironia à medida, citando a célebre frase “Sempre teremos Paris”, do filme Casablanca. No entanto, sob o tom bem-humorado do ministro, residem implicações profundas no campo da diplomacia, que podem afetar relações bilaterais e impactar os direitos individuais de estrangeiros.
As relações entre EUA e Brasil encontram-se particularmente tensas. Além da revogação imediata do visto de entrada de Alexandre de Moraes, o presidente Donald Trump anunciou a imposição de tarifas de 50% sobre produtos brasileiros, com vigência prevista a partir de 1º de agosto.
Essas ações foram justificadas como retaliação à atuação do ministro em processos envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, atualmente submetido a uma série de medidas cautelares em razão de investigações relativas à articulação de um suposto complô golpista após a eleição de 2022. As apurações também sugerem indícios de coação, obstrução de Justiça e possíveis atentados à soberania nacional, inclusive por meio de articulações internacionais para pressionar o STF e autoridades brasileiras.
Para advogados consultados pelo InvestNews, o episódio evidencia que nenhum visto tem caráter absoluto. Todo país, respaldado pelo direito internacional, exerce sua soberania ao decidir quem pode cruzar suas fronteiras. Esse poder, reconhecido pelo artigo 2º da Carta das Nações Unidas, é detalhado nas legislações de imigração de cada nação.
No Brasil, ele ganha contornos específicos na Lei de Migração, e, nos Estados Unidos, tem amparo no Immigration and Nationality Act (INA). Na União Europeia, o controle é compartilhado por regulações e diretivas próprias.
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Por que um país pode cancelar o visto de alguém?
Países podem revogar (ou cancelar) vistos por vários motivos:
- Segurança nacional: suspeita de ameaça ao país
- Fraude documental: uso de documentos falsos ou informações erradas no pedido de visto
- Antecedentes criminais: envolvimento em crimes graves
- Descumprimento de regras: trabalhar ilegalmente, estudar sem autorização ou ultrapassar o tempo permitido de permanência
- Envolvimento em crimes graves: terrorismo, tráfico de pessoas, drogas ou até questões de saúde pública (como pandemias).
Essas regras valem tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil e em grande parte da União Europeia, cada um com detalhes em sua legislação.
Cancelamento pode ocorrer sem aviso?
Sim. Quando existe risco à segurança ou ao interesse público, o país pode cancelar o visto sem avisar antes o estrangeiro. Mas, nas democracias, geralmente existe possibilidade de contestar a medida depois, apresentando recurso administrativo ou na Justiça. No Brasil, normalmente a defesa vem antes do cancelamento, salvo exceções. Já nos Estados Unidos, o governo pode cancelar até de modo sumário, mesmo com o estrangeiro já no país.
Quem pode cancelar: consulado ou alto escalão?
- Oficiais consulares: podem negar vistos ainda no momento do pedido, por motivos simples ou técnicos.
- Departamento de Estado (nos EUA): pode cancelar vistos já em vigor, com base em investigações ou informações sensíveis. Quando isso acontece, pode até dificultar pedidos futuros do mesmo estrangeiro.
O que acontece após o cancelamento?
As consequências dependem da situação:
- Não embarcou ainda: a pessoa simplesmente não consegue viajar.
- Já está no país: pode ser detida para deportação ou remoção, dependendo da lei local. Em alguns casos, pode se defender antes de ser expulsa.
- Sanções graves: se houver envolvimento com crimes como terrorismo ou lavagem de dinheiro, pode haver bloqueio de contas, bens e inclusão em listas internacionais de pessoas sob restrições.
Quando o cancelamento é claramente político, ou seja, motivado por disputas entre governos, o caso pode virar pauta diplomática, gerando protestos e discussões em órgãos internacionais. Muitos países e organismos, como a Convenção de Viena e a Corte Europeia de Direitos Humanos, já intervieram para revisar casos considerados injustos ou arbitrários.
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O que fazer se seu visto for cancelado?
Se você for afetado, pode seguir alguns passos:
- Apresentar recurso administrativo: tentar reverter a decisão no próprio órgão responsável
- Recorrer à Justiça: buscar revisão judicial, caso exista essa possibilidade no país
- Habeas Corpus: se houver detenção, é possível recorrer para garantir liberdade enquanto a legalidade do ato é analisada
- Pedido de liminar: No Brasil, por exemplo, é possível solicitar uma decisão urgente ao juiz para suspender os efeitos do cancelamento até o fim do processo
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Agradecimentos: Daniela Poli Vlavianos, sócia do escritório Poli Advogados e Associados; e Ricardo Yamin, sócio do YSN advogados