Ao menos 33,4 milhões de malas foram extraviadas globalmente em 2024, segundo levantamento da SITA, companhia especializada em tecnologia para o setor aéreo. Na América Latina e Caribe, a taxa caiu para 5,5 malas extraviadas a cada mil passageiros — uma melhora de 15% em relação ao ano anterior, mas ainda longe do ideal. No Brasil, o problema de bagagens perdidas ou danificadas segue no topo das reclamações registradas pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), representando quase um terço das queixas de passageiros em voos domésticos e internacionais.
O prejuízo financeiro é expressivo: o setor aéreo global gastou cerca de US$ 5 bilhões em 2024 para lidar com extravios, devoluções e indenizações. Apesar dos avanços, cerca de 8% das malas extraviadas, em média, nunca mais são encontradas.
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Esses números ganham rosto em histórias como a de Fernanda Almeida, que viajou na ponte aérea Rio-São Paulo durante o Carnaval deste ano. Sua mala, recheada de fantasias, foi despachada no aeroporto de Congonhas, mas não chegou ao Santos Dumont. Após horas de espera e frustração, Fernanda descobriu que, por erro de etiquetagem, sua bagagem havia sido enviada para Belo Horizonte (MG). Só conseguiu recuperar seus pertences no dia seguinte, perdendo um dia inteiro de folia.
Já a estudante de medicina Heloísa Naomi viveu outro tipo de transtorno: ao desembarcar em Guarulhos (SP) após um voo vindo de Buenos Aires, em 2023, encontrou sua mala danificada. No balcão da companhia aérea, recebeu a oferta de R$ 200 para resolver o problema na hora, mas optou por abrir uma solicitação formal — e, quase um mês depois, foi indenizada em R$ 620, mais do que o triplo do valor inicial. “Não dá para ser imediatista. Quem passa por esse problema precisa saber que tem direitos”, afirma.
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Aumento do fluxo de passageiros, conexões apertadas e falhas humanas ainda travam a eficiência na logística das bagagens. O manuseio incorreto em transferências responde, segundo dados oficiais, por 41% dos casos de extravio, e o cenário se agrava em períodos de alta temporada, como no mês de julho, quando a pressão operacional aumenta.
De quem é a responsabilidade?
A responsabilidade das companhias aéreas é objetiva: se a mala sumiu, foi danificada ou violada, a empresa deve indenizar, sem necessidade de comprovação de culpa. Em voos internacionais, a Convenção de Montreal limita o valor da indenização a cerca de R$ 10 mil (1.288 Direitos Especiais de Saque – DES).
Em voos nacionais, não há teto — vale o Código de Defesa do Consumidor. O passageiro deve estar atento aos prazos: a reclamação deve ser feita até 7 dias após o recebimento da mala ou da data prevista de entrega.
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O que fazer?
O ideal é procurar imediatamente o balcão da companhia aérea, registrar o Relatório de Irregularidade de Bagagem (RIB/PIR) e, em caso de furto, fazer também um boletim de ocorrência. A empresa tem até 7 dias (voos nacionais) ou 21 dias (internacionais) para localizar ou indenizar. O consumidor pode pedir indenização material (pelos bens), emergencial (itens essenciais) e moral (transtornos graves).
A comprovação dos itens extraviados ou danificados pode ser feita por meio de notas fiscais, comprovantes de compra, fotos do conteúdo da mala e até testemunhos. Muitas vezes, o passageiro acaba aceitando propostas rápidas e de valor baixo, mas especialistas recomendam cautela: é possível obter ressarcimentos mais justos ao formalizar a solicitação e apresentar documentação adequada. O caso de Heloísa ilustra como a persistência pode fazer diferença no valor da indenização.
Para evitar dores de cabeça, especialistas recomendam:
- Identificar a mala com etiquetas e sinais únicos, usar cadeados e malas com proteção TSA (cadeados especiais que podem ser abertos por agentes de segurança aeroportuária com uma chave mestra, permitindo inspeções sem danificar o cadeado ou a bagagem);
- Não despachar eletrônicos, joias ou dinheiro;
- Fotografar o interior da mala antes de viajar;
- Guardar o comprovante de despacho; e
- Considerar a contratação de um seguro-viagem para cobrir prejuízos extras.
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O seguro-viagem, inclusive, pode ser um aliado importante, já que cobre não apenas extravio, mas também atrasos na entrega da bagagem e danos, especialmente em viagens internacionais, onde o valor da indenização pode ser limitado.
Se a companhia aérea não resolver ou oferecer valor insuficiente, o passageiro pode recorrer ao Procon, registrar queixa no consumidor.gov.br, acionar a Anac ou buscar o Juizado Especial Cível. O importante é guardar todos os documentos, inclusive o protocolo de atendimento e eventuais respostas da empresa, para fortalecer o pedido de indenização.
Agradecimentos: Arystóbulo de O. Freitas, sócio do Arystobulo Freitas Advogados; Daniela Vlavianos, sócia do Poli Advogados & Associados; e Luiz Philipe Ferreira de Oliveira, advogado e professor de direito.