Há dez anos, Dianna Huff tenta comprar apenas produtos ‘Made in USA‘. Isso tem funcionado para itens como lençóis, meias e sofás. Mas para outras coisas, como seu celular, óculos e cortador de grama, é quase impossível. 

Ela se lembra de ter olhado a sua geladeira em busca do rótulo de um fabricante e ter lido ‘Made in México‘ e devolvido uma balança de banheiro porque, apesar da garantia de que a empresa fabricava os produtos em suas instalações nos EUA, isso não acontecia. 

“Foi uma verdadeira jornada que trouxe frustrações e reveses”, disse Huff, moradora de New Hampshire de 62 anos que quer apoiar os trabalhadores da indústria americana com seus gastos. 

Made in USA

Muitos americanos dizem que querem comprar produtos nacionais, mas as cadeias de suprimentos globais desenvolvidas ao longo de décadas de terceirização tornaram isso desafiador. Por mais empenhados que esses compradores estejam, alguns produtos simplesmente não são feitos nos EUA

A metade dos veículos de passeio vendidos nos EUA em 2024 foi montada fora do país, de acordo com dados da S&P Global Mobility. E todos (ou quase) os smartphones vendidos nos EUA são fabricados no exterior. 

As empresas muitas vezes tentam promover seus produtos autenticamente fabricados nos Estados Unidos, mesmo que produzam apenas uma pequena parte de seus produtos nos EUA. Políticos de diferentes partidos também abraçaram a causa. O candidato presidencial independente Ross Perot protestou contra a perda de empregos na indústria manufatureira dos EUA no exterior. O presidente democrata Barack Obama tentou promover a produção nacional.

A estratégia tarifária do presidente Trump visa trazer a produção de volta às cidades de todo o país. Na sexta-feira (23), Trump ameaçou impor uma tarifa de 50% sobre produtos importados da União Europeia e novas taxas sobre iPhones fabricados no exterior. Os EUA importam da UE carros, vestuário e produtos alcoólicos, entre outras coisas.

Símbolo de grandeza

“‘Made in USA’ não é apenas um rótulo colocado em um produto; é um símbolo da grandeza americana”, disse o porta-voz da Casa Branca, Taylor Rogers. “É um rótulo que o mundo inteiro se acostumará a ver quando nos tornarmos uma potência global de manufatura novamente.”

Os fabricantes transferiram a produção para o exterior, onde os custos de mão de obra eram muito mais baixos, estimulados em parte pelos acordos de livre comércio.

Muitas pessoas interessadas em comprar produtos fabricados nos Estados Unidos não o fazem — ou não podem fazê-lo — porque os produtos fabricados nos EUA costumam ser mais caros.

Em uma pesquisa da Morning Consult realizada em maio com cerca de mil adultos nos EUA, mais da metade disse que intencionalmente comprava produtos produzidos internamente pelo menos algumas vezes, mas apenas 11% daqueles que estavam dispostos a pagar mais por produtos dos EUA, conseguiriam suportar um aumento de preço maior que 15%. Americanos mais velhos e republicanos seriam mais propensos a comprar produtos nacionais.

Troca de produtos

Matt Braynard, consultor político republicano que tenta comprar produtos americanos há cinco anos, disse que ele economizou dinheiro com a mudança porque seus itens duram mais. O homem de 47 anos trocou sua cueca boxer Hugo Boss (cinco por US$ 69) por uma da Hard Hat Apparel (cinco por US$ 85,99) e começou a comprar meias da Fits Socks (US$ 13,99 ou mais o par) e da Made in America Sock Co. (a partir de US$ 14,99 por dois pares).

Braynard, que mora no norte da Virgínia, trabalha com candidatos políticos e dirige uma organização cujo trabalho inclui defender os réus envolvidos no ataque de 6 de janeiro de 2021 ao Capitólio.

Depois de decidir comprar produtos americanos, ele doou suas camisas e gravatas Zegna e comprou camisas da White Dress Shirts e gravatas da R. Hanauer. Ele ainda não encontrou um terno produzido nacionalmente, então ele continua com um que comprou em um shopping de Cleveland há quase uma década.

Existem outros produtos fabricados nos Estados Unidos por uma empresa americana que são mais difíceis de encontrar. Ele dirige um carro fabricado nos EUA pela BMW e tem um smartphone da Samsung Electronics no bolso. 

“Nem sempre é fácil”, disse Braynard. “Quando ando por um shopping, não encontro nada para mim lá.”  

Ele diz que encontrou uma empresa que fabricava algumas de suas panelas antiaderentes nos EUA, mas ele não conseguiu comprar um conjunto de panelas que eram todas fabricadas nos EUA. Quando estava procurando uma nova furadeira elétrica, Braynard leu um thread no Reddit no qual um trabalhador de uma fábrica dos EUA que produziu o produto entrou em uma discussão sobre de onde vieram as peças da furadeira. Ele não conseguiu encontrar lâminas de barbear de fabricação americana, então ele as compra da Gillette, de propriedade da Procter & Gamble, que tem algumas instalações nos EUA.

Exceções

Fazer exceções faz parte da vida dos mais radicais. Anne Collins, 75 anos, começou a comprar produtos nacionais como hobby depois de se aposentar de seu emprego como designer gráfica em 2016.

Ela criou o grupo no Facebook Have Fun Buying Not Made in China (em português: “Divirta-se Comprando Produtos que Não São Feitos na China”). O grupo dobrou de tamanho para cerca de 2 mil membros neste ano com as notícias das tarifas.

Collins, que mora em Laurel, Maryland, ajudou os membros do grupo a encontrar esfregões, assadeiras e flores artificiais produzidos internamente. 

Mas quando ela decidiu fazer uma cesta de Páscoa com a temática de patos para sua irmã, os únicos itens feitos nos Estados Unidos que ela conseguiu encontrar foram um cartão de felicitações e um pacote de Peeps, uma marca americana de marshmellows. De qualquer forma, ela encheu a cesta com bugigangas de grandes varejistas.

“Eu não ia abrir mão da diversão só porque algumas coisas eram feitas na China”, disse ela.

Em um fórum do Reddit para pessoas interessadas em comprar produtos feitos nos Estados Unidos, um dos membros questionou: “É possível uma vida totalmente feita nos EUA?”.

Uma pessoa respondeu que seria necessário viver como Ted Kaczynski, o infame recluso conhecido como Unabomber, que vivia um estilo de vida primitivo em uma cabana remota.

Lynne Sterling, 72, vira produtos para ver onde eles são feitos, uma prática inspirada por seus pais, que acreditavam que qualquer gasto deveria beneficiar a comunidade local. Ela também quer que os fabricantes sejam empresas americanas. Compra tênis New Balance fabricados nos EUA e toma café Folger’s, de propriedade da J.M. Smucker, de Ohio. Sua grande concessão é um rímel azul feito pela L’Oréal, que tem sede na França. “É o único produto para o qual me permito fazer isso”, disse Sterling.

A L’Oréal informou que o rímel L’Oréal Voluminous na cor cobalto que Sterling usa é feito em sua fábrica em North Little Rock, Arkansas.

Sterling disse que bebe água engarrafada Crystal Geyser, proveniente de sete fontes nos EUA. A Crystal Geyser é de propriedade da Otsuka Holdings, sediada em Tóquio — um fato que não é divulgado no rótulo.

Quando Sterling foi informada por um repórter do Wall Street Journal sobre a estrutura de propriedade, ela disse: “Ah, não! Que pena!”.

Traduzido do inglês por InvestNews

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