A realidade de uma guerra comercial global está começando a levar líderes corporativos a fazer o que tentaram evitar por meses: criticar as políticas do presidente Donald Trump.
Desde a semana passada, quando as tarifas começaram a ser anunciadas por Trump, CEOs mantiveram privadas as suas frustrações, que foram ouvidas reservadamente em pequenos de empresários e lobistas. Alguns chegaram a organizar reuniões com funcionários de Trump para falar a respeito das tarifas, mas as respostas não correponderam às expectativas dos CEOs, de acordo com fontes consultadas pelo The Wall Street Journal.
Agora, após uma queda de três dias do mercado e de advertências de titãs de Wall Street, como Bill Ackman e Jamie Dimon, mais líderes empresariais estão expressando suas preocupações – e de forma aberta.
Ken Griffin, bilionário que dirige a empresa de fundos de hedge Citadel, chamou as tarifas de “grande erro de política” em um evento na segunda-feira (7) na Universidade de Miami, de acordo a Bloomberg.
É errado dizer a uma família de classe média ou com dificuldades econômicas “que comprar uma torradeira, um novo aspirador de pó ou um carro novo vai custar 20%, 30%, 40% a mais”, disse Griffin. “Mesmo que o sonho de empregos voltando para os EUA se concretize, esse é um sonho para daqui 20 anos. Não são 20 semanas. Não são dois anos. São décadas.”
Em uma economia global, “tarifa não é uma palavra bonita”, disse Bahram Akradi, CEO da rede de fitness Life Time Group Holdings, em uma entrevista na segunda-feira. “Você não pode criar esse tipo de impasse e gerar atrito no comércio mundial.”
Brett Schulman, CEO da Cava, rede de restaurantes de comida mediterrânea, disse que se sente muito confuso ao tentar descobrir quanto as tarifas podem aumentar seus custos. As tigelas de papel usadas pela Cava, por exemplo, vêm do Canadá. Há ainda o azeite e as azeitonas Kalamata, vindas da Grécia. E mais: a Cava está focada em levantar novas lojas e os custos da construção também devem aumentar.
“É como ir a um restaurante onde o cardápio muda constantemente antes de você fazer o pedido”, disse ele. “Ninguém se sente confiante em tomar uma decisão.”
O fundador da Bridgewater Associates, Ray Dalio, disse que está “muito preocupado” com os aspectos práticos, apesar de concordar que os EUA têm um problema por não fabricar bens suficientes.
“Concordo que há o problema, [mas] estou muito preocupado com a solução”, disse o bilionário fundador do fundo de hedge em entrevista à CNBC.
O plano atual de Trump fará com que os custos das empresas aumentem e a receita caia, acrescentou. “Isso vai emperrar as engrenagens de produção em todo o mundo”, disse ele.
A pressão sobre CEOs deve aumentar nesta semana conforme as empresas fazem as conferências de divulgação dos resultados trimestrais. Investidores querem saber como as tarifas de Trump poderão afetar as operações e os resultados financeiros das companhias.
Nesta quarta-feira (9), será a vez dos executivos do Walmart enfrentarem os acionistas em um dia do investidor. A Delta Air Lines também divulgará nos mesmos dias o seu balanço. Na sexta-feira (11) o Wells Fargo apresentará seus resultados, seguido por outros grandes bancos na semana que vem.
Entre os primeiros líderes a se manifestar estão alguns apoiadores vocais de Trump. Ackman, o bilionário gestor de fundos de hedge por trás da Pershing Square, pediu uma pausa de 90 dias nas tarifas para negociar com outros países, alertando que a alternativa era “um inverno nuclear econômico autoinduzido”.
“Estamos no processo de destruir a confiança em nosso país como parceiro comercial, como um lugar para fazer negócios e como um mercado para investir capital”, escreveu Ackman em um post na plataforma X no fim de semana.
Ryan Cohen, CEO da varejista de videogames GameStop, que apoia Trump, postou no X na semana passada que as tarifas “estão me transformando em um democrata”.
Um dia depois, ele brincou: “Mal posso esperar pelo meu iPhone de US$ 10 mil feito nos EUA”. A GameStop já começou a sofrer: a Nintendo disse que suspenderia indefinidamente as pré-encomendas do Nintendo Switch 2 nos EUA por causa das novas tarifas.
Até Elon Musk, um dos conselheiros mais influentes de Trump, criticou a agenda comercial da Casa Branca. Na segunda-feira, o bilionário postou um conhecido vídeo do economista Milton Friedman falando sobre o livre comércio, explicando como as partes que compõem um lápis exigem cadeias de suprimentos complexas.
Trump está prometendo manter os planos tarifários, chamando-os em sua plataforma Truth Social esta semana de “coisa linda de se ver”, que geraria prosperidade econômica. Quando perguntado na segunda-feira se as tarifas são permanentes ou estão em negociação, Trump disse: “As duas coisas podem ser verdade”.
Uma das razões pelas quais os líderes corporativos relutam em falar é porque muitos temem retaliação do governo Trump, disse Jeffrey Sonnenfeld, professor da Escola de Administração de Yale. No mês passado, o governo impôs ordens executivas punitivas a vários escritórios de advocacia com laços com adversários políticos e legais do presidente. Também pediu às agências federais que identifiquem empresas e outras entidades para possíveis investigações sobre práticas de diversidade.
Desde a semana passada, Sonnenfeld disse que ouviu de CEOs de várias grandes empresas de capital aberto que os grupos comerciais deveriam se opor com mais veemência às tarifas ou apresentar declarações coletivas de grandes empresas membros.
Individualmente, “eles não querem ser um para-raios”, disse Sonnenfeld. “Pode virar uma coisa pessoal.”
O chefe da Ethan Allen, que fabrica 75% de seus móveis na América do Norte, pediu ao presidente que interrompa a ampla ofensiva tarifária porque isso poderia assustar os consumidores já cautelosos. “Não há nada de errado em voltar atrás — não é um fracasso”, disse Farooq Kathwari, CEO da fabricante de móveis com sede em Danbury, em Connecticut.
Kathwari disse que aplaudiu os esforços para trazer a indústria de volta aos EUA, mas questionou a forma como as tarifas foram implementadas.
“A mudança é importante. Era necessária. A questão sempre é: quão rápida, quão ampla?” disse. “As tarifas subiram demais. O presidente precisava chocar as pessoas — e foi o que fez — e fazer mudanças, porque sem um choque, as mudanças não acontecem. Então eu acho que haverá algum equilíbrio.”
Outros executivos estão seguindo uma abordagem cautelosa. Bruce Champeau, CEO da rede de móveis Room & Board, disse que evitou falar sobre tarifas publicamente porque há muitas incógnitas.
“Vamos ver como isso se desenrola”, disse ele. “Resta saber se será ou não, em última análise, o que o presidente Trump e seu governo estão procurando alcançar.”
Escreva para Chip Cutter em [email protected] e Heather Haddon em [email protected]
Traduzido do inglês por InvestNews
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