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Conflitos que seu consultor financeiro prefere que você ignore 

Consultores que cobram taxas às vezes recomendam pedir a aposentadoria da previdência pública mais cedo e manter hipotecas

Por Anne Tergesen The wall street Journal
Publicado em
7 min
traduzido do inglês por investnews

Uma forte mudança na forma como os americanos pagam por consultoria financeira alinhou melhor as fortunas dos investidores com as dos indivíduos que administram seu dinheiro. Contudo, não evitou conflitos de interesse.

Na última década, as pessoas movimentaram trilhões de dólares seguindo consultores que cobram taxas em vez de comissões. Esses consultores normalmente cobram uma quantia anual dos clientes, em geral entre 0,75% e 1,25% de uma carteira de investimentos.

Os consultores financeiros adeptos das taxas são um sucesso entre os reguladores e defensores do consumidor, em parte porque muitas vezes não ganham comissões, uma prática que encorajou alguns corretores a incentivar produtos caros ou recomendar movimentações potencialmente mais custosas, incluindo negociações frequentes.

Ainda assim, a estrutura baseada em taxas pode tentar os consultores a fazer recomendações que maximizem o equilíbrio da carteira, mesmo quando isso não é do interesse do cliente, de acordo com acadêmicos e pesquisadores. Por exemplo, aqueles que pagam taxas a consultores solicitam a aposentadoria previdenciária mais cedo do que muitas vezes é considerado o ideal, e na mesma idade daqueles que não estão sendo aconselhados.

“A remuneração baseada em taxas é geralmente considerada menos propensa a abusos do que as comissões, mas estamos vendo alguns comportamentos entre consultores que também representam claros conflitos de interesse”, afirmou Michael Finke, professor do Colégio Americano de Serviços Financeiros.

Solicitar a aposentadoria da Previdência

David Blanchett, chefe de pesquisa de aposentadoria da PGIM DC Solutions, uma afiliada da Prudential Financial, foi coautor de um estudo que mostrou que as pessoas que usavam os serviços de consultores que cobram taxas solicitavam a pensão federal aos 65 anos, em média.

Embora seja possível solicitar a aposentadoria a partir dos 62 anos, deixá-la para mais tarde garante uma renda mensal mais alta. Em geral, o ideal é que o cônjuge com rendimentos mais altos adie a solicitação para os 70 anos.

Porém, os consultores podem ganhar mais taxas quando seus clientes o fazem logo após pararem de trabalhar, porque assim não retiram tanto dinheiro de suas carteiras. 

Porcentagem de americanos de 65 anos ou mais que ainda pagam financiamento imobiliário (Créditos: dynamic-chart)

“Eu acreditava que as pessoas com um consultor reivindicariam a aposentadoria mais tarde, já que quem os aconselha deveria estar ciente dos benefícios”, disse Blanchett. Ele concluiu que a forma como os consultores são pagos provavelmente está influenciando suas recomendações.

Aqueles com consultores que recebem taxas fixas solicitaram a pensão federal mais tarde do que os com corretores, que receberam benefícios aos 64 anos, de acordo com o estudo. Ambos obtiveram seus benefícios mais cedo do que as pessoas que pagavam uma taxa por hora aos consultores, independentemente do tamanho da carteira. Eles a obtiveram aos 66 anos, em média.

O estudo examinou 260 famílias com US$ 500 mil ou mais em ativos de uma pesquisa de 2019 do banco central americano.

Considere um homem que se aposenta aos 65 anos com US$ 2 milhões e gasta US$ 7.500 por mês. Se ele tiver a opção de tirar US$ 3.400 mensais com sua pensão federal aos 65 anos, ou US$ 5 mil por mês a partir dos 70 anos, maximizará seus benefícios esperando até os 70, desde que ele ou seu cônjuge vivam até cerca de 83 anos, explicou Blanchett.

Se esperar até os 70 anos, precisará sacar US$ 450 mil de seus investimentos para se sustentar entre os 65 e os 70 anos. Se, em vez disso, começar a receber sua aposentadoria aos 65, só precisaria sacar US$ 246 mil, já que sua pensão de US$ 3.400 cobriria algumas de suas despesas. 

Quitar o financiamento do imóvel

A eliminação de dívidas já foi considerada uma parte fundamental da preparação para a aposentadoria. Conforme as taxas de juros caíam na última década, manter o pagamento da hipoteca tornou-se algo mais comum. Os consultores têm um motivo financeiro para concordar com a estratégia.

Considere alguém com uma hipoteca de US$ 500 mil e uma carteira de US$ 1 milhão, que paga a seu consultor uma taxa anual de 1%, ou US$ 10 mil.

Se o cliente retirar R$ 500 mil da carteira para eliminar a hipoteca, o saldo da conta e o pagamento do consultor caem pela metade.

Nos últimos anos, a porcentagem de famílias com 65 anos ou mais com hipotecas aumentou, de cerca de 15% em 1989 para 29% em 2019, de acordo com o Centro de Pesquisa de Aposentadoria do Boston College.

Um motivo: “Há uma notável concordância entre a comunidade de consultores em manter as hipotecas na aposentadoria”, disse Michael Kitces, cofundador da XY Planning Network, cujos 1.800 consultores cobram taxas.

Os consultores argumentam que seus clientes têm mais chances de obter maiores retornos ao deixar seu dinheiro no mercado de ações do que obteriam quitando uma hipoteca.

Ativos gerenciados, de acordo com tipo de consultor (Taxa / Comissão)

A história recente provou que eles estavam certos: nos últimos cinco anos, as ações do S&P 500 renderam 14,7% anuais, de acordo com a FactSet, superando em muito o custo de uma hipoteca refinanciada quando a taxa de 30 anos caiu abaixo de 3% há alguns anos. Algumas pessoas também podem obter uma dedução fiscal com o pagamento de juros de hipoteca.

Contudo, nem todo mundo se sente confortável em usar uma dívida para apostar no mercado de ações, afirmou Alan Moore, executivo-chefe da XY Planning Network.

“Se um consultor escolhe recomendar a coisa certa para o cliente ou não, seria ingênuo pensar que seu próprio salário não entra na equação”, acrescentou Moore.

Comprar uma anuidade

Alguns consultores que cobram taxas evitam anuidades, incluindo um tipo que alguns economistas recomendam.

A anuidade imediata exige que um aposentado pague uma quantia única a uma seguradora em troca de uma renda fixa vitalícia, muitas vezes uma opção irrevogável. Atualmente, um indivíduo de 65 anos que quer garantir US$ 3 mil mensais para o resto da vida pagaria cerca de US$ 480 mil.

As anuidades recebem críticas, em parte porque muitas delas têm taxas altas. Mas alguns economistas gostam de anuidades imediatas em parte porque estas eliminam a possibilidade de falência na velhice e normalmente têm comissões de cerca de 3%.

Os consultores geralmente não compartilham do entusiasmo dos economistas, disse Finke, talvez porque uma anuidade geralmente significa tirar dinheiro de uma conta de investimento.

“Elas são tão pouco usadas por consultores que seria preciso questionar se conflitos de interesse estão impedindo a apresentação de uma solução que provavelmente seria melhor para os clientes”, disse ele.

Por exemplo, a Fisher Investments, que administra US$ 265 bilhões e cobra taxas anuais de até 1,25% dos ativos, diz em seu site: “Nosso fundador, Ken Fisher, gosta de dizer: ‘Odeio anuidades’, porque acredita que a quantia de uma anuidade pode ser melhor aproveitada com outros investimentos”. 

O que Fisher não diz é que sua empresa ganha mais afastando os clientes das anuidades, disse Finke. “Se ele recomenda pegar 25% do patrimônio de um cliente para pagar uma anuidade, perde 25% de seus honorários.”

Um porta-voz da Fisher declarou que a empresa sempre trabalha visando o interesse de seus clientes. “Não aconselhamos anuidades, mas se elas fizerem sentido para um cliente após nossa avaliação, eles saberão disso.”

Escreva para Anne Tergesen em [email protected]

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