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Kevin Plank quebrou a Under Armour. Será que ele consegue consertar a empresa?

Fundador da marca de vestuário retoma cargo de CEO após quatro anos e dois sucessores

Por Inti Pacheco The wall street Journal
Publicado em
9 min
traduzido do inglês por investnews

Quando Kevin Plank reassumiu o cargo de CEO da Under Armour este ano, disse que a marca de roupas esportivas fundada por ele sofreu com a rotatividade de executivos e com as mudanças de estratégia.

“Minha principal prioridade é trazer clareza e estabilidade ao nosso negócio”, disse em maio a investidores, quando também os alertou de que as vendas da empresa cairiam pelo menos 10% este ano. 

O bilionário de 52 anos nunca havia se afastado da empresa que fundou há quase 30 anos. Depois de deixar o cargo de CEO no final de 2019, permaneceu como presidente do conselho e chefe da marca. E, por deter ações com supervoto, manteve-se como acionista controlador.

Vários ex-executivos afirmaram que Plank foi responsável por grande parte da turbulência e complexidade que ele agora promete resolver. Eles explicaram que, nos últimos anos, Plank frustrou os planos de marketing implementados por outras pessoas, impôs ideias de produtos que fracassaram e não estabeleceu limites claros entre seu papel como chefe de marca e as atribuições dos CEOs que o sucederam.

Assim como Bob Iger na Disney e Howard Schultz na Starbucks, que foram reintegrados como CEOs, Plank e o conselho da Under Armour decidiram que o negócio que ele administrou por tanto tempo precisa ser resgatado e que ele é a melhor pessoa para fazê-lo. 

“A Under Armour continua tentando resolver o que nos desviou de nossa missão principal”, disse um porta-voz da empresa. “Sob a liderança de Kevin, estamos determinados a mudar a trajetória deste negócio.”

A Under Armour disse que Plank e o conselho apoiaram os CEOs que foram selecionados para sucedê-lo e que eles tiveram a oportunidade agir como achassem melhor. Plank “continuou a opinar como fundador do negócio que construiu, particularmente nas áreas de marketing de marca, produto e inovação.” 

O problema do desconto

Plank está apostando que a empresa pode se tornar uma marca esportiva diferenciada cortando o número de produtos que vende em 25%, reduzindo os descontos e entregando uma publicidade mais impactante. O plano dele é reconstruir uma marca que perdeu seu efeito sobre os clientes depois de ter registrado um explosivo crescimento de vendas que atingiu seu ápice em 2017. 

Alguns investidores e ex-executivos duvidam que a estratégia de Plank de transformar a empresa fará diferença para uma marca que diluiu seu valor vendendo grande parte de seu estoque com desconto para atingir metas de receita. Ex-funcionários disseram que a Under Armour corre o risco de seguir o caminho da BlackBerry, um alerta já usado por Plank para ilustrar como uma empresa líder de um setor pode se tornar irrelevante.

Créditos: Minh Connors/Bloomberg

As ações da Under Armour caíram 23% no ano passado e 87% em relação à alta de 2015, uma perda de US$ 18 bilhões em valor de mercado. A queda começou durante o primeiro mandato de Plank como CEO, quando as vendas começaram a cair na América do Norte – o principal mercado da empresa. Desde então, a Under Armour já passou por três reestruturações, tendo gasto cerca de US$ 1 bilhão nesses processos.

Esta semana, a empresa alertou que haverá um prejuízo anual maior do que o esperado por conta dos custos de reestruturação mais altos, o que inclui o fechamento de uma distribuidora na Califórnia que foi aberta por Plank durante seu primeiro mandato como CEO.

A empresa com sede em Baltimore não é mais a ameaça que foi há uma década para gigantes como Nike e Adidas. Recentemente, Plank a chamou de “marca de pódio”, ou seja, uma das três ou quatro marcas esportivas globais reconhecidas mundialmente. Mas em um mercado cada vez mais fragmentado, empresas como Skechers, New Balance, Puma e Lululemon tiveram mais altas no ano passado. 

Desde 2020, a Under Armour tem sido apontada por adolescentes homens de renda alta como a marca que eles mais deixaram de usar, segundo pesquisa semestral conduzida pelo banco de investimento Piper Sandler. “Continuamos acreditando que a Under Armour perdeu relevância com seu público-alvo”, diz o último relatório.

O envolvimento de Plank após deixar o cargo 

Plank mudou de CEO para chefe da marca, função recém-criada, no final de 2019, no que ele disse ser um plano para levar seu principal vice, Patrik Frisk, à sua sucessão. A mudança ocorreu em meio a uma tentativa de reestruturação para cortar custos e aumentar as vendas. 

Em reportagens anteiores, O WSJ mostrou que os funcionários também reclamaram da cultura de trabalho da Under Armour e que o conselho questionou Plank sobre seus laços com a jornalista de TV Stephanie Ruhle. Plank substituiu alguns dos principais executivos, disse que Ruhle era só uma amiga e prometeu melhorar a cultura da Under Armour. 

Ex-funcionários e executivos disseram que após Plank deixar o cargo de CEO, ele compareceu a reuniões de produto e marketing e questionou as direções que estavam tomando, apesar de não ter o título de CEO. O estilo de gestão do bilionário é jogar dois pitbulls em uma sala e ver qual deles sai vivo, disseram vários deles.

Frisk, que entrou na Under Armour em 2017 como presidente, assumiu o cargo de CEO depois que Plank concordou em participar de sessões regulares com um coach executivo, o equivalente corporativo de um conselheiro de casais, disseram alguns ex-executivos. Frisk esperava que a terapia mantivesse o fundador tranquilo.

Frisk criou uma unidade de Equipes Especiais, um grupo que trabalhava diretamente com Plank em suas ideias para tentar manter o fundador fora das operações do dia a dia. Logo, as criações de Plank, como uma máscara esportiva durante a Covid e o tênis SlipSpeed — com salto dobrável — foram priorizadas em relação aos planos de Frisk, incluindo o foco em projetos de sustentabilidade.

O CEO e fundador da Under Armour, Kevin Plank Créditos: Michael Nagle/Bloomberg

Alguns, inclusive Plank, sentiram que o estilo de liderança com apoio de consultores adotado por Frisk estava prejudicando a imagem cool da marca. Outros achavam que Frisk trouxe a disciplina necessária para uma empresa que estava constantemente mudando de direção. As tensões entre os dois levaram à saída de Frisk em meados de 2022.

Plank teve a ideia do SlipSpeed, que pode ser usado para correr ou como slip-on, depois de ver como sua filha usava o salto dos sapatos. Ele o chamou de “Exterminador de Crocs” da Under Armour — depois de ver o sucesso que a marca de chinelos de espuma fez entre os jovens compradores durante os primeiros anos da pandemia. 

No final de 2021, as equipes de produto aceleraram a ideia do tênis de Plank para entregar o produto na metade do processo de desenvolvimento usual de dois anos, evitando testes regulares, redesenhos e percepções do consumidor. O orçamento de marketing para o SlipSpeed superou o de outros lançamentos da empresa e incluiu uma loja pop-up na cidade de Nova York no início de 2023.

“Essa inovação revolucionária de US$ 150 com um bom design está sendo autenticamente adotado por atletas em todos os lugares”, disse Plank durante uma teleconferência com analistas em meados de 2023. “O SlipSpeed da UA está funcionando.” 

Plank disse à equipe que esperava que o SlipSpeed fosse o produto de maior sucesso da Under Armour até aquele momento e que ele rivalizaria com o tênis de corrida Pegasus, da Nike. Mesmo com todo o trabalho duro da empresa, o tênis não pegou. Os preços de algumas das mais novas versões, como o SlipSpeed Mega, foram reduzidos pela metade pelos maiores parceiros de varejo da empresa.

Lifestyle ou performance

No início de 2023, a Under Armour encontrou um novo líder. No refeitório da sede em Baltimore, Plank apresentou a ex-presidente da Marriott, Stephanie Linnartz, como a nova CEO. 

Plank ainda tocava o show mesmo sem ter o título de CEO. Na verdade, ele manteve o mesmo escritório que tinha como CEO — o maior do prédio.

Em maio de 2023, em uma conferência com analistas, Linnartz apresentou sua estratégia de três anos para retomar o crescimento da Under Armour. Seu plano era se apoiar nos produtos focados em lifestyle para gerar mais reconhecimento da marca, especialmente nos EUA.

“Estamos trazendo especialistas em tênis e em construção de marca que somarão à nossa equipe a potência de design já comprovada pela indústria, especialmente à medida que expandimos nossos catálogo esportivo”, disse Linnartz durante a teleconferência.

Algumas pessoas da Under Armour disseram ter percebido que Linnartz não era a opção certa. Ela queria mudar a forma como a indústria era administrada e impôs alguma disciplina às operações. Suas escolhas irritaram alguns trabalhadores que a viam como uma sargento.

Linnartz disse aos funcionários que a oportunidade de fazer produtos melhores para as mulheres se perdeu e que elas poderiam comprar produtos para si mesmas e também para suas famílias. Em reuniões com designers, Linnartz disse que não gostava dos produtos femininos da empresa.

Desempenho das ações da Under Armour desde 2015

As vendas anuais caíram 3,4% em seu ano fiscal mais recente, e a empresa projetou menor demanda das lojas. Cerca de um ano depois de ter começado, Linnartz estava fora.

Agora, novamente como CEO, Plank está desfazendo algumas decisões de seus antecessores. Ele prometeu cortar consultores que tiveram grande destaque durante o mandato de Frisk e disse que a empresa se concentrará em produtos focados em performance. 

Parte de sua estratégia reproduz ideias de outros líderes. Frisk já havia tentado reduzir os descontos. Linnartz também falou sobre fazer da marca algo diferenciado, experimentar novos formatos de loja e ter uma narrativa melhor para os produtos. 

Escreva para Inti Pacheco em [email protected]

traduzido do inglês por investnews