A Copa do Mundo do Catar começou recheada de discussões absolutamente previsíveis. A supressão de direitos básicos do país anfitrião do campeonato mundial levou a uma queda de braço nunca antes vista na história do futebol.
Federações internacionais e os próprios atletas decidiram não se calar diante das proibições impostas pela Fifa, amparadas pelo Catar, a manifestações em favor de minorias.
Desde 2010, quando o Comitê Executivo da entidade máxima do futebol decidiu que o mundial iria pela primeira vez para o Oriente Médio, que debatemos o Catar e a supressão de direitos humanos. Veto a manifestações de homossexualidade, obrigatoriedade ao uso da burca pelas mulheres, condições desumanas de trabalho, análogas à escravidão, são alguns dos itens que sempre acompanharam o mundial do Catar.
Muito antes de pensarmos na pandemia, já se questionava a escolha da sede da Copa. Com os novos debates oriundos de uma nova visão de mundo, passamos a questionar ainda mais a escolha feita pela Fifa, e federações e atletas decidiram assumir protagonismo nesse debate.
Isso ajudou a Copa a ganhar o campo da política como nunca havia acontecido. Se, antes, o que a entidade mandava dirigentes e atletas obedeciam, agora a situação é outra.
Impulsionados pelas redes sociais, as federações internacionais entenderam que têm de se posicionar e defender as minorias. A Fifa, até agora, parece fechar os olhos para a óbvia realidade. A ponto de proibir braçadeiras de capitães com as cores do arco-íris como pretendiam sete países europeus nesta primeira rodada do mundial.
Se a ideia era reduzir o alcance das ações em defesa dos direitos LGBTQIA+, a Fifa viu o resultado ser exatamente o contrário. Os jogadores da Inglaterra se ajoelharam antes do apito inicial da partida contra o Irã para mostrar sua indignação à supressão de direitos no Catar.
Antes, os iranianos já haviam protagonizado um momento histórico na hora do hino nacional. Os atletas ficaram em silêncio, enquanto nas arquibancadas as mulheres iranianas, aos prantos, viam-se representadas pelo gesto. O silêncio era a forma de contestar a lei iraniana que não permite a presença de mulheres em jogos de futebol.
Se a polêmica de permitir ou não a venda de bebida alcoólica nos estádios do Catar já havia jogado ainda mais luz para as discussões do choque cultural trazido pela Copa, agora o debate é outro. Nunca um mundial foi tão utilizado como plataforma para manifestações políticas. Sinais do tempo. E a Fifa, infelizmente, parece que ainda não acordou para qual é o seu papel dentro dessa realidade.
*Erich Beting é jornalista formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) e especialista em Gestão do Esporte pelo Instituto Trevisan. Começou a carreira no jornalismo esportivo na Folha de S.Paulo e, em 2005, idealizou e lançou a “Máquina do Esporte”, principal veículo sobre negócios do esporte no país. Foi ainda analista de negócios do esporte no UOL e Sportv, além de ter atuado como comentarista de futebol do BandSports. Venceu por duas vezes o Prêmio Comunique-se, na categoria de Melhor Jornalista de Marketing & Publicidade. |
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