A movimentação está grande em torno da criação de uma Bolsa de Valores Verde que negocie ativos ambientais como os créditos de carbono. Será que isso fará com que esse mercado realmente decole?
Hoje, ele é ainda muito pequeno, e tentarei explicar nesse texto o que falta para termos realmente a possibilidade do investidor poder investir em créditos de carbono.
Toda semana, lemos alguma notícia sobre o potencial que o Brasil possui de entrada de capital com a criação de um mercado de crédito de carbono. Isso é natural, tendo em vista que somos um país com grande extensão de florestas, enorme biodiversidade e um dos maiores produtores de alimentos do mundo, sim, também podem ser gerados créditos de carbono ao se produzir soja, por exemplo.
Esse potencial é confirmado por diversas entidades renomadas. Na semana passada veiculamos notícia aqui no InvestNews que o SEBRAE está com a expectativa de que o Brasil movimente US$ 100 bilhões no mercado de crédito de carbono até 2030. Hoje o mercado não existe, os investidores não podem colocar créditos de carbono em suas carteiras de investimentos.
Para que essa expectativa se concretize e o mercado possa realmente existir precisamos mais do que a vontade da Ministra do Meio Ambiente como informado na mesma matéria, precisamos definir 3 itens fundamentais para que o crédito de carbono seja transacionado na Bolsa: qual a sua natureza jurídica, a sua forma de contabilização e quais tributos incidirão nesses créditos.
Começando pela natureza jurídica, é necessário que haja uma Lei que regerá uma série de questões cruciais relacionadas com a sua existência, negociação e utilização. Conforme artigo acadêmico publicado por 4 representantes da Secretaria de Planejamento do Rio de Janeiro recentemente, a natureza jurídica é o primeiro passo para determinar a legislação aplicável e a autoridade competente responsável pela regulação e supervisão dos negócios com créditos de carbono.
A legislação deverá tratar dos aspectos jurídicos relacionados a originação do crédito de carbono, se foi criado a partir da captura de carbono na floresta ou do biogás proveniente do lixo. Além disso, tais Leis dirão quais são as regras para transferência desses ativos, seu uso, o que fazer em casos de insolvência ou punição por atividades criminais. A legislação também orientará as regras relativas à contabilização e sobre a forma de tributação a ser praticada pelo governo.
No que tange a contabilização, tive a oportunidade de participar de reunião do Grupo de Trabalho do CPC – Comitê de Pronunciamento Contábeis – que está em discussão final sobre como contabilizaremos os créditos de carbono. O que posso adiantar é que pela norma internacional de contabilidade que seguimos no Brasil ele não é um ativo financeiro. Ele é um ativo intangível, fungível (intercambiável sob a mesma medida, nesse caso uma mesma unidade ou tonelada de carbono equivalente) e transacionável.
Ou seja, por conta da contabilidade o que será transacionado na Bolsa de Valores não será o crédito de carbono em si, assim como o ouro, será o contrato de crédito de carbono, esse sim, um ativo financeiro. O que permitirá também que os contratos sejam vendidos no mercado futuro.
A tributação normalmente é ditada pela contabilidade, nesse caso, o contrato de crédito de carbono, ou o direito a esses créditos terão incidência de IOF como no contrato do ouro. No entanto, a contabilização dependerá da originação do crédito de carbono definida na natureza jurídica.
Dito tudo isto, para que os créditos de carbono ou seus contratos sejam vendidos em bolsa de valores para os investidores o governo terá papel fundamental, espera-se que ele consiga com urgência se organizar para que os Projetos de Lei necessários sejam aprovados para que possamos ter a natureza jurídica que ditará a contabilidade e a tributação, com isso criaremos o Mercado de Carbono tão esperado no Brasil.
Alexandre Furtado é Presidente do Comitê de Informações ESG da Fundação Getúlio Vargas, Sócio e Diretor de ESG da Grant Thornton.
As informações desta coluna são de inteira responsabilidade do autor e não do InvestNews e das instituições com as quais ele possui ligação.
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