Nos últimos anos chama atenção a quantidade e qualidade de estudos, relatórios e levantamentos que têm como centro ou parte importante das avaliações a pauta ESG. Essas pesquisas são nacionais, internacionais, de organizações tão diversas como a Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial) e XP Investimentos, mas todas apontam para a importância do tema como prioridade nas agendas corporativas e de consumidores, investidores, governos, setores da economia.
O levantamento da Aberje – realizado em 2021 – traz um número impactante na pesquisa ”ESG e sua Comunicação nas Organizações no Brasil”: o tema já estava presente como prioridade para 95% das agendas corporativas das organizações. O resultado demonstra que os mais diversos setores da economia já absorveram a necessidade de ter ações para causar impactos positivos diante da sociedade, demonstrando que há alinhamento com expectativas de clientes, posicionando melhor as marcas.
No final de 2022, uma série de relatórios e análises da XP Investimentos demonstram que investidores priorizam empresas com ESG e apontam a tendência para este ano, indicando que ganhará mais atenção de quem investe empresas que tenham certificações e relatórios de ESG, assim como de transparência, atualizados.
Há dois aspectos principais nesse conjunto de estudos, bem diferentes, mas não divergentes: investidores buscam empresas que já estão alinhadas com a pauta ESG e algumas dessas organizações conseguem lucros e crescimento acima da média em seus setores. Ter lucro e ter agenda ESG em andamento não se estabelecem como contrários, oposto, o que vemos – cada vez mais – é a convergência desses objetivos.
Sobre o bom desempenho de empresas éticas e com ESG, o Índice de Ética da Ethisphere, revela que estas apresentam crescimento 24% maior que as empresas que ainda não adotaram as práticas e implementaram estratégias da pauta.
Com a agenda ESG e suas pautas aferidas como prioridade por diversas pesquisas, com tendência de crescimento entre organizações, é importante também identificar onde há gargalos, espaço para qualificação de práticas e avanços, para mudanças mais profundas e efetivas.
No início do mês de fevereiro deste ano, o Pacto Global da ONU no Brasil divulgou uma nova edição do Observatório 2030, que traz a análise de 82 empresas de capital aberto que reportam seus resultados nos padrões do Global Reporting Initiative (GRI). A avaliação é que ainda há muito o que avançar no país, em relação à agenda ESG, além de faltar a devida velocidade, embora a preocupação esteja presente, assim como mais engajamento efetivo, mais práticas e ações, que atendam à Agenda 2030.
Outra lacuna identificada pelo relatório do Pacto Global da ONU no Brasil é a ausência de dados sobre diversidade. Segundo matéria do jornal O Globo sobre esse relatório: “A maioria das empresas não divulga nos indicadores o percentual de colaboradores negros em seus quadros funcionais. Das empresas analisadas, só 18% (15) divulgam esse dado. Sobre a equidade de gênero, em todos os cargos o percentual de mulheres foi maior nas empresas que são signatárias dos WEPs (Women’s Empowerment Principles). Porém, menos da metade das empresas analisadas aderem a esse compromisso (43,9%).”
É na seara da diversidade e equidade de raça e gênero que há mais espaço para fortalecimento da agenda ESG nacionalmente, pois o Brasil ainda mantém estruturas sociais e econômicas que avançam muito lentamente nesses pontos. Mesmo com prioridade e preocupação com a agenda ESG, expressa em alguns estudos mencionados, o relatório do Pacto Global da ONU confirma a persistente desigualdade, também revelada na ausência ou omissão de dados em relação ao número de mulheres e pessoas negras em cargos estratégicos das organizações analisadas.
Nas empresas, a desigualdade de remuneração está intrinsecamente relacionada aos cargos que os grupos minorizados ocupam. Estudo da auditoria Grant Thornton de 2021 com 250 empresas no Brasil mostra que as mulheres ocupavam só 38% dos cargos de liderança no país. E representavam apenas 14,3% dos assentos em conselho de administração, segundo a consultoria Spencer Stuart.
Dados apresentados em reportagem publicada em 15 de fevereiro no Valor Econômico, da qual também destacamos a seguinte avaliação, reforçam as contínuas desigualdades: “Os negros têm ainda uma grande dificuldade de quebrar a barreira de 5% de cargos C-Level e em conselho, segundo o Índice de Equidade Racial Empresarial (IERE). Como cargos mais elevados tendem a pagar mais, o menor espaço para mulheres e negros em posições de liderança se reflete na remuneração média desses grupos.”
Nas últimas décadas essas desigualdades de raça e gênero se tornaram pauta obrigatória na sociedade e no mundo corporativo, a partir da relevância crescente da Agenda ESG e da atuação de movimentos sociais. Em relação ao Brasil, se mostra fundamental a busca e implementação de soluções específicas, além daquelas já bem-sucedidas em outros países, por que além da equidade de gênero, há muito a superar por conta do racismo estrutural e suas consequências para mulheres e homens negros.
Como mostra o levantamento do Pacto Global da ONU, o que está em andamento no país não se mostra suficiente ou é muito lento para trazer mudanças expressivas. Nesse momento, as lutas históricas das mulheres e da população negra, apoiadas pela urgente necessidade de inclusão e promoção de igualdade, que também são identificadas na pauta ESG, convergem para a emergência de outras mentalidades, ações e condições que acelerem as necessárias mudanças.
Governos, empresas, organizações e sociedade, nas suas práticas e em resultados de pesquisas, têm no horizonte uma convergência poucas vezes identificada na História.
Em 2023, estão abertas mais janelas para a oportunidade única de diminuir as desigualdades, promover justiça social, racial e de gênero sem renunciar a lucros, posicionando marcas positivamente, conquistando novos mercados e investimentos.
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