O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a aplicação legal que desde 2013 instituiu a chamada “presunção de boa fé” dos compradores do ouro, iniciativa que facilitou a ampliação do garimpo ilegal no país e está no cerne da crise humanitária no território Yanomami.
Na decisão, Mendes deu prazo de 90 dias para que o governo federal adote um novo marco regulatório para a fiscalização do comércio do ouro no país. Cobrou que sejam tomadas medidas para que se inviabilize a aquisição desse minério extraído de “áreas de proteção ambiental e de Terras Indígenas”.
A liminar de Mendes, que tem validade imediata, será levada a julgamento pelo plenário virtual do STF para ser confirmada ou derrubada.
A decisão do ministro do Supremo acontece num momento em que o governo Lula vinha preparando uma nova legislação tanto para derrubar a “presunção de boa fé” para o comércio do ouro como estabelecer regras mais rígidas para as transações, mostrou reportagem publicada pela Reuters em fevereiro.
Nesta quarta-feira, o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse à Reuters que o texto para novo marco legal proposto pelo governo está em análise na pasta, onde estão sendo feitos últimos ajustes de redação, e deve ser enviado à Presidência semana que vem.
Dino disse que ainda não há decisão sobre qual instrumento jurídico será usado para fazer a mudanç. Se for uma Medida Provisória, por exemplo, dependerá de ratificação pelo Congresso. Segundo o ministro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva será consultado a respeito.
A liminar de Gilmar Mendes ocorre também dias depois de a Receita Federal instituir a utilização de nota fiscal eletrônica para o ouro quando classificado como ativo financeiro ou instrumento cambial, a partir de julho, outra medida que já estava no radar desde a crise dos Yanomami.
Fim da “declaração de boa fé”
Com a decisão do Supremo, deixa de valer regra que previa que os compradores de ouro podiam aceitar a palavra do vendedor sobre a origem legal do metal e não podem ser responsabilizados no caso de se descobrir, depois da venda, que o ouro vinha de um garimpo ilegal.
“É preciso que esse consórcio espúrio, formado entre garimpo ilegal e organizações criminosas, seja o quanto antes paralisado. O provimento de medida cautelar, pelo Supremo Tribunal Federal, é o meio adequado e necessário para tanto”, considerou o magistrado.
No governo, segundo minuta inicial do texto que estava sendo preparada a qual a Reuters teve acesso, previa, além do documento eletrônico com diversos dados do comprador e do vendedor, a ideia era exigir dados que dêem precisão ao local de mineração do metal.
Entre outras iniciativas em discussão, as exigências deviam incluir a área de lavra, local de origem do ouro, o número do processo administrativo no órgão gestor de recursos minerais, o número do título autorizativo de extração, o número da licença ambiental e o respectivo órgão emissor, bem como a massa de ouro objeto da transação.
A Polícia Federal foi um dos órgãos que tinha proposto sugestões ao governo federal de modificação dessas regras. Em entrevista à Reuters no mês passado, o diretor de Meio Ambiente e Amazônia da PF, Humberto Freire, defendeu mudanças na regra.
“A gente precisa ter realmente uma estrutura que não seja baseada na boa fé, tem que ser na comprovação da origem ilícita desse minério e uma estrutura de rastreio legal através dos documentos fiscais bastante robusta”, disse Freire.
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