Não foi sem motivo que o peso argentino desvalorizou quase 18% na segunda-feira (14), puxando para baixo os títulos em dólar da Argentina. A inesperada vitória do candidato de ultradireita Javier Milei nas eleições primárias presidenciais de domingo (13) na Argentina aumentou suas chances de sentar na cadeira da presidência caso vença o pleito de outubro.
O país que celebrou a vitória da Copa do Mundo de 2023, capitaneado por Leonel Messi, indica estar mais propenso à direita na política, dado o apoio ao candidato que defende pautas como livre venda de armas, criminalização do aborto, encerramento do Banco Central, até a adoção do dólar como moeda oficial do país – que ele vende como solução para a desvalorização do peso.
Antes de estudar economia e trabalhar no setor financeiro, Milei foi integrante de uma banda cover dos Rolling Stones, a “Everest”.
Vitória nas primárias mexeu com mercados
No começo da semana, a vitória nas eleições primárias do candidato de ultradireita assustou os mercados, fazendo o banco central da Argentina fixar a taxa de câmbio em 350 pesos por dólar até a eleição geral de outubro, assim como elevar a taxa básica de juros em 21 pontos básicos, para 118% ao ano.
Apesar de as primárias serem um processo que antecede a votação final prevista para acontecer em 22 de outubro deste ano, ela é uma espécie de termômetro do que pode estar por vir. E a chapa de Milei “La Libertad Avanza” (A Liberdade Avança), teve 30,04% dos votos válidos.
Segundo o professor de economia da Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP), Sillas Cezar, se forem analisados aos números frios, a quantidade de votos para Milei na prévia o colocariam na cadeira da presidência.
“Os latino-americanos topam recorrentemente ter um candidato populista, caso do Brasil e da Argentina novamente, e por isso não me surpreende se ele [Milei] levar essa corrida”.
Sillas Cezar, professor de economia na faap
Caçador de recompensas
O candidato de 52 anos foi eleito deputado federal em 2021 e é considerado “ultraliberal” na economia e autodeclarado “anarcocapitalista” (quando se defende um modelo de capitalismo sem regulação do Estado). Mas temas controversos, como a venda de órgãos humanos, também fazem parte de seu discurso, segundo a mídia argentina. Não diferentemente de Donald Trump, Milei considera as mudanças climáticas “uma farsa de esquerda”.
Mas o que levou uma expressiva massa de argentinos a confiarem seus votos a uma versão de Trump latino-americano? A inflação que supera 115% ao ano, segundo especialistas ouvidos.
De acordo com Cezar, da FAAP, Milei não é um fenômeno novo e suas ideias já são bastante divulgadas. No entanto, ele colhe recompensas entre um eleitorado frustrado com a inflação galopante do país, o empobrecimento da população e uma recessão iminente.
“O eleitor médio de Millei não está interessado em como a economia será dolarizada, mas sim, em resolver as questões econômicas do país. Aliás, dolarizar a economia argentina seria um tiro de bazuca no pé”.
cezar, da faap.
Mais Doria, menos Bolsonaro
Segundo o professor da Faap, isso acontece porque, apesar de ser possível adotar a moeda de um outro país, não é possível dominar a produção dessa moeda. “O que não garante como suprir a economia com mais emissão de dólares, caso estes venham a faltar”, diz ao InvestNews.
Ainda segundo o professor, as comparações do presidenciável argentino com Jair Bolsonaro, ex-presidente do Brasil, até podem ser feitas dentro de alguns parâmetros, mas não todos, sendo a mais coerente com a figura João Doria, ex-prefeito de São Paulo e ex-candidato ao governo do Estado.
“Quando Bolsonaro foi eleito, ele já era político há 20 anos, era militar de carreira, enquanto Miles nem tem conexão com o exército, não tem extensa carreira política e se mostra mais ao lado de um empresariado liberal, assim como Doria se mostrou”, observa Cezar.
O candidato argentino defende a privatização total das estatais, o que se demonstrado ao mercado como irá ser feito, “não há problema”, segundo o especialista.
“Ele se define como libertário, mas é tipo um ‘breganejo’: é sucesso de público, mas fracasso de crítica. Já existiram vários candidatos do tipo, com ideias superficiais e inconsequentes, como acabar com o Banco Central”.
CEZAR, DA FAAP.
Reação dos mercados
O especialista acrescenta que o problema de confiança pelo qual passa a Argentina – já com extenso histórico de calotes de dívidas – abre espaço para “um político de perfil aventureiro e demagogo, que fala em destruir institucionalmente o que resta de sólido na economia”.
Logo, a reação dos mercados foi devido as propostas de banimento do BC e dolarização da economia proveniente de um candidato que ganharia a corrida eleitoral caso o resultado das prévias fosse o veredicto final.
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