Desde 2007, nos trabalhos que realizei na área de Desenvolvimento Sustentável do Banco Real, já falávamos sobre como o aquecimento global afetaria, em um futuro breve, a nossa vida, bem como nossos negócios. Lembro-me de que o banco fez uma sessão exclusiva e levou os funcionários para assistir, em meados de 2006, ao filme “Uma Verdade Inconveniente” de Albert Arnold “Al” Gore Júnior.
O documentário falava sobre o avanço do aquecimento global e as suas consequências ainda nesta geração. Pois bem, estamos aqui, o ano de 2023 ainda nem acabou e já foi considerado o mais quente da história, ou seja, no período de 125 mil anos, como aponta o observatório europeu Copernicus. A temperatura média global entre janeiro a novembro de 2023 foi de 1,46°C acima dos níveis pré-industriais. Mesmo os mais céticos terão que concordar que nunca antes na história passamos por dias tão quentes!
Para sermos claros na análise, precisamos encarar os impactos sob dois prismas:
- Individual: As pessoas estão, literalmente, sofrendo com calor, sobretudo, aquelas que não têm ar-condicionado em casa, usam transportes coletivos lotados, também ser ar-condicionado, e vivem em regiões pouco arborizadas, sem planejamento urbano e afins.
- Empresarial: As áreas de RH das empresas já estão começando a se preocupar em como apoiar, de forma adequada, funcionários mediante às altas temperaturas. Como fica a questão do home office? Todo profissional tem em sua casa condições adequadas para o trabalho em dias de temperaturas extremas?
Além disso, teremos cada vez mais impactos setoriais, o melhor exemplo recente vem do setor de eventos, que passou a ser obrigado a disponibilizar água em dias quentes.
Lembremos da determinação do ministro da Justiça, Flávio Dino, para que a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) estabelecesse regras de proteção à saúde de consumidores em shows, festivais e grandes eventos nos períodos de alta temperatura. Trata-se de uma medida com vigência de 120 dias, tomada após o show da cantora norte-americana Taylor Swift, no Rio de Janeiro, em novembro deste ano, que resultou na morte de uma estudante de apenas 23 anos por conta do calor excessivo que fazia na cidade na ocasião. A sensação térmica no Rio naquele dia era de 50 graus.
Em meio a este cenário, a COP28, aconteceu em Dubai e o acordo final da Conferência, divulgado em 13/12 representa um passo significativo no enfrentamento da crise climática. No entanto, os quase 200 países presentes no evento, não alcançaram um consenso quanto à urgência com que irão eliminar o uso de petróleo, carvão e gás em seus sistemas energéticos.
Ainda assim, o documento final assinado traz alguns avanços ao estabelecer um plano de ação embasado em dados científicos, com o intuito de reduzir emissões, promover adaptações e assegurar financiamento global, mantendo o foco na meta crucial de limitar o aquecimento global a 1,5°C. Outros pontos que podemos destacar referem-se a mobilização de mais de US$ 85 bilhões em novos compromissos financeiros e o lançamento da ALTÉRRA, considerada a maior plataforma de investimento privado para soluções climáticas.
Outro aspecto interessante do documento é que ele propõe medidas como triplicar a capacidade de energia renovável em todo o mundo, dobrando a taxa média anual de eficiência energética até 2030 e, até 2050 a meta é reduzir a produção e o consumo de combustíveis fósseis de maneira justa até atingir a neutralidade de carbono.
Em termos de decisões ou imposição de metas, o texto final foi bem sútil. No entanto, o mais importante para nós é entendermos as problemáticas que estão sendo debatidas e como elas impactam a nossa vida, neste sentido o texto declarar a intenção de redução já é muito expressivo.
Outra decisão importante foi a definição do Brasil como sede da COP30, que deve ser realizada entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025, na cidade de Belém, capital do Pará. Desde maio deste ano, o Brasil já havia recebido o apoio de praticamente todos os países sul-americanos e caribenhos para sediar o evento, uma exigência dos organizadores da Cúpula na definição do país sede.
Após a confirmação, Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, falou sobre o anúncio. “Estou especialmente tocada pela indicação da Amazônia, onde nasci e cresci, para receber esta conferência. A Amazônia é um símbolo vivo da semente que plantamos na Rio 92. Uma região onde é evidente a conexão entre as três convenções que assinamos naquela ocasião: a Convenção de Biodiversidade, a Convenção-Quadro de Clima e a Convenção sobre Desertificação. A Amazônia nos mostra o quanto as convenções estão entrelaçadas nos seus desafios, mas também nas soluções sinérgicas que abarcam”. Esse comentário foi destaque nos principais veículos de imprensa em todo o mundo.
A realização da COP30 em Belém, marca o 10º aniversário do Acordo de Paris, principal convenção climática da ONU, ratificada em 2015 durante a COP21, estabelecendo objetivos concretos para a redução das emissões de gases de efeito estufa. A expectativa do Ministério das Relações Exteriores (MRE) é que cerca de 50 mil visitantes participem da COP30 em Belém.
Busquei trazer aqui uma síntese que te ajude a compreender por que este tema diz respeito a você e ao seu negócio e como seremos impactados nos próximos anos pelas mudanças climáticas. Como me disse Christianne Canavero em meados de 2008 “se seguirmos neste caminho, em breve restará somente a sociedade e as instituições se adaptarem às ondas de calor mais intensas que estão por vir”. Sua frase dita naquele ano é o que hoje chamamos de “Resiliência Climática”, ou seja, vamos ter que aprender a viver de formas diferentes, porque não temos como voltar atrás nos impactos já causados ao planeta.
Acrescento, que apesar de todo o esforço que esse tema nos demandará individualmente e coletivamente, não temos, principalmente as empresas como fugir à responsabilidade. Não há caminho fácil, trata-se de escolher qual o caminho difícil que vamos querer enfrentar e agir para transformá-lo.
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