Não é surpresa que as ruas na China estejam cada vez mais ocupadas por carros elétricos, com centenas de montadoras de lá dedicadas à produção (e venda) deles. O que espanta é o ritmo acelerado da tendência. Dados parciais de abril, da associação local de montadoras, mostram que pela primeira vez na história do maior mercado mundial de carros a venda de eletrificados ultrapassou a dos automóveis tradicionais, com mais de 50% das vendas.
Em março, eles tinham respondido por 40% do total, também pela primeira vez – o que dá uma ideia mais nítida do fenômeno dos eletrificados no mercado chinês.
Por “eletrificados”, neste contexto, entenda carros movidos puramente a bateria, como os da Tesla e o BYD Dolphin, mais os híbridos plug-in, como o Volvo XC-60 Recharge (que combinam um motor a combustão e um elétrico, e são recarregáveis via tomada).
Tesla, Li Auto (uma especializada em híbridos) e outras montadoras travam uma guerra de preços na China há meses, com reduções constantes em busca de market share. As margens das empresas têm reduzido, claro (daí a primeira queda trimestral na receita da empresa de Elon Musk no 1T24 desde 2020).
Por outro lado, o volume de vendas responde de forma excepcional. Nos três primeiros meses deste ano, a BYD vendeu 261,6 mil unidades, alta de 33,8% em base anual. Em segundo lugar, vem a Tesla, com 132,7 mil unidades (+8,0%).
Até outro dia, elétricos só lideravam as vendas em países “de nicho”. Nações estupidamente ricas, mas sem grande relevância para o mercado global – como a Noruega, onde mais de 80% dos carros novos têm motor elétrico.
A China joga em outra liga, naturalmente: eles emplacaram 25,8 milhões de carros em 2023 (entre eletrificados e comuns), uma estrada à frente do segundo colocado, os EUA, com 15,4 milhões (o Brasil, só para constar, vem num bom sexto lugar, com 2,2 milhões).
O apetite chinês por motores elétricos impressiona. Em 2023, 60% dos elétricos e híbridos plug-in que saíram das fábricas foram emplacados na China; contra 25% na Europa e apenas 10% nos EUA.
Mas as proporções tendem a aumentar no mundo todo. A Agência Internacional de Energia (AIE), que reúne os maiores consumidores de petróleo do mundo, estima que as vendas de eletrificados devam atingir 17 milhões em 2024 – contra 14 milhões em 2023, quando o número foi recorde.
Eletrificação em massa
No ano passado, um em cada cinco carros vendidos no mundo (20%) era 100% elétrico ou híbrido plug in, sendo que a frota dos carros puramente a bateria representa 70% dos eletrificados. Já nos três primeiros meses deste ano, o número de elétricos e híbridos vendidos globalmente equivale aproximadamente ao total vendido em todo o ano de 2020.
Das 17 milhões de vendas previstas pela AIE para este ano, 10 milhões serão na China – 25% a mais do que em 2023. A AIE estima que, ao final do ano, 45% do total de carros vendidos na China terá sido de elétricos e híbridos plug in (e já nem parece muito quando se olha os números de abril).
Na Europa, a estimativa da AIE é de que os eletrificados representem 25%. Nos EUA, 11%.
Se confirmada a previsão para este ano, o total de eletrificados nas rodovias espalhadas pelo mundo deve subir para 40 milhões. Até 2030, segundo a AIE, um a cada cinco do total de carros circulando nas ruas dos EUA e da União Europeia serão elétricos ou híbridos plug in. Na China, essa proporção deve pular para um a cada três.
A agência prevê que 60% dos eletrificados vendidos na China já são mais baratos do que os carros com motor de combustão. Em outros países, a paridade de preços deve ser alcançada por volta de 2030.
Embora a procura tenha se concentrado na China, nos EUA e na Europa, o crescimento de veículos elétricos também acelerou em mercados emergentes. No Brasil, as vendas praticamente triplicaram em 2023, para mais de 50 mil unidades, com os eletrificados representando 3% do mercado.
Em seu relatório Global Electric Vehicle Outlook 2024, a AIE destacou que, apesar das margens apertadas e da volatilidade dos preços dos metais usados em baterias, além da inflação elevada e do fim gradual dos incentivos de compra em alguns países, as vendas globais de veículos elétricos permanecem robustas.
A AIE destaca que, apesar da eliminação progressiva dos subsídios em alguns países – inclusive na China – a expectativa é de que investimentos na cadeia de produção de componentes (como baterias) ajudem a reduzir o paulatinamente o custo dos elétricos.
A promessa de Musk: modelos mais baratos
O fenômeno na China e a análise recente da AIE ressoam com o caso da Tesla – que anunciou planos para fabricar veículos elétricos de custo mais baixo já no início de 2025. Para se ter uma ideia, a linha atual é premium: começa com o Model 3, de US$ 40 mil – ou mais de R$ 200 mil na conversão direta.
Por conta desse anúncio, as ações da Tesla registraram na última quarta-feira (24) o maior ganho diário de 2024, fechando em alta de 12%, mesmo depois de divulgar uma queda de 55% nos lucro líquido no primeiro trimestre.
A crença dos investidores na promessa de Elon Musk alimentou o movimento. Falar de novas ofertas em um cronograma mais rápido fez com que as ações da Tesla disparassem, observou o estrategista-chefe da Avenue, William Castro Alves.
Porém, o sócio-fundador da Arbor Capital, Leonardo Otero, ressalta que os cortes de preços já promovidos pela Tesla para estimular as vendas prejudicaram o lucro por veículo entregue.
Para se ter uma ideia, no primeiro trimestre de 2022, a margem bruta por carro entregue da Tesla era de US$ 18 mil. Já no trimestre passado, esse valor despencou para US$ 8,3 mil a unidade.
Margens menores, no entanto, poderão ser compensadas por volumes maiores, caso a massificação dos elétricos siga em ritmo acelerado. E, ao que tudo indica, esse é um caminho sem volta.
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