“Daqui a cinco anos, vamos ver muitos write-offs em inteligência artificial”, disse Fábio Schmidt, da VTEX, multinacional brasileira de soluções de e-commerce. O alerta sobre desinvestimentos em IA no futuro próximo vem de uma constatação lógica: as empresas que apostam na tecnologia por conta do hype, por “medo de ficar de fora”, dificilmente chegarão a algum lugar.
A pergunta que elas devem fazer enquanto investem em IA, segundo Schmidt, é simples: “Tenho um problema sendo efetivamente resolvido?”. Se não tiver, pense duas vezes.
Essa foi uma das reflexões que fizeram parte do lançamento do documentário “Brasil em Wall Street”, uma produção do InvestNews. O evento teve um painel com a presença de Cristina Junqueira, cofundadora do Nubank, Elder Rapachi, diretor executivo da Gerdau Next (braço de inovação da metalúrgica) e Fábio Schimidt, cofundador e vice-presidente de engenharia da VTEX. As três companhias têm capital aberto na bolsa de Nova York (NYSE) – tema do nosso documentário. A mediação foi da jornalista Raquel Balarin, diretora de redação do InvestNews.
O ponto que Schmidt levantou sobre investimentos em IA veio justamente após uma reflexão de Cristina Junqueira: a de que, sim, criou-se um hype em torno da inteligência artificial. Mas empresas que trabalham com tecnologia aplicada há muito tempo encaram o fenômeno de maneira natural. “Até aqui eram redes neurais, ou machine learning. Agora é inteligência artificial”, diz, notando que não há exatamente uma linha que separe esses conceitos.
“O que eu posso dizer é: sempre tivemos a mentalidade de usar a tecnologia mais poderosa, a mais avançada do mundo; o tempo todo, em todos os âmbitos possíveis e imagináveis”, afirma. E relembra: “Há 11 anos, quando o Nubank começou, escolhemos usar de base uma linguagem de programação que tinha acabado de ser inventada – que pouca gente conhecia”.
Cristina Junqueira complementa: “Pensando em IA, se você não tem dados armazenados de maneira segura, limpa e com um longo histórico para treinar os modelos de linguagem, vai levar um tempo para você sequer conseguir usar essa tecnologia.”
Logo após o fim do painel, vale registrar, o Nubank anunciou a compra da empresa americana Hyperplane, que treina modelos de linguagem que alimentam serviços financeiros. No comunicado à imprensa, o banco destacou que a aquisição vai abrir caminho para uma personalização nos serviços ao cliente “em nível granular”.
Algo em linha com o que a cofundadora do banco mencionou no painel. “Pessoas que têm um volume financeiro muito grande contam com acesso a um private banker. A gente quer entregar isso para qualquer um dos nossos clientes. Um banqueiro seu, que vai entender o que você diz, avaliar qual é o melhor cenário para você e executar a ação que você pediu – instantaneamente, via nosso aplicativo”.
Last mile
Na Gerdau, a fronteira entre o machine learning de ontem e a IA de hoje também é difusa. Elder Rapachi, diretor executivo da Gerdau Next, braço de inovação da metalúrgica, lembra que a empresa usa redes neurais há mais de 20 anos.
E a metalúrgica sente o progresso na pele. “Processamentos que antes levávamos 12 horas para concluir, agora conseguimos fazer em quatro minutos. E com uma quantidade maior de variáveis, que nos permite rodar muitos cenários”, diz.
A Gerdau já emprega o recurso de “gêmeo digital” em todos os processos da companhia – ou seja, rodar simulações virtuais de tudo o que está acontecendo, ou pode acontecer, no mundo real. “Isso nos permite ter ganhos que não tínhamos antes.”
A grande batalha agora é usar essas vantagens tecnológicas para aprimorar o last mile, o momento em que o produto chega ao cliente, diz Rapachi. “A capacidade de penetração de mercado do produtor de aço chinês é ilimitada“, afirma. De fato, a invasão do aço produzido na China é hoje um dos grandes desafios da indústria siderúrgica global. “Mas a inteligência artificial é um poderoso aliado para vencer essa competição.”
Menos é mais
Fábio Schimidt, da VTEX, fez outra provocação relevante no painel. A de que inovação só funciona se vier de mãos dadas com a simplicidade.
“Sofisticação é ser simples. Se ficar complicado e caro, nós damos um passo para trás”, avalia. “Desde o início, nos preparamos para ganhar a ‘Copa do Mundo’ das soluções de digital commerce e, para isso, temos que entregar soluções que sejam unificadas e padronizadas.”
Schimidt cita como exemplo um cliente da Arábia Saudita. O site dele trabalha com o alfabeto arábe, o que poderia ser um enorme empecilho para a integração aos serviços da VTEX. Não foi, o que serviu de amostra para a capacidade de adaptação do código. Não fosse simples, o código certamente não seria versátil.
Outro lance com o objetivo de “vencer a Copa do Mundo”, diz Schimidt, foi justamente a iniciativa de abrir capital na NYSE. “Quando vamos vender para europeus, por exemplo, o fato de você ser uma empresa listada em Nova York tem outro peso”, diz.
Talvez dê para constatar isso no deal mais recente da VTEX: um contrato de fornecimento de infraestrutura de e-commerce para a alemã OBI, uma das principais varejistas de construção do continente, fechado no mês passado. “Conseguimos ganhar da SAP na terra deles, isso mostra que temos um diferencial.”
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