Se você carregou seu celular durante o dia, boa parte da energia que ilumina a sua tela neste momento veio de painéis solares. É um fato. Às 12h49 da última terça (17), por exemplo, 38% da eletricidade do país todo vinha do Sol, contra só 32% das hidrelétricas – que são a maior fonte, de longe, em capacidade instalada.
Completavam a lista a energia térmica (15%), a eólica (12%) e a nuclear (2%, cortesia das velhas Angra I e Angra II).
Esse recorte, o de quais fontes de energia alimentam o país a cada minuto do dia é pouco usual. Mas é necessário numa realidade em que as fontes “intermitentes” (solar e eólica) representam uma fatia gigantesca do total. E o grande assunto aqui é a solar.
Porque o crescimento dessa fonte nos últimos anos advoga fortemente a favor da volta do Horário de Verão, extinto por Jair Bolsonaro em abril de 2019, e que o governo atual cogita resgatar.
O Ministério das Minas e energia estuda quais seriam os impactos desse retorno – principalmente porque a seca ameaça os reservatórios das hidrelétricas. E dá para adiantar um.
Em 2019, a energia solar era irrisória. Respondia por 1,97% da matriz elétrica. Logo, não fazia grande diferença para o sistema acabar com o Horário de Verão.
Primeiro, porque a economia de energia em si era pequena (0,5%). E ainda é, já que esse fator não mudou. Segundo, porque uma hora a mais de energia solar não contaria grande coisa numa realidade em que 98% da matriz era composta por outras fontes.
Agora não. A energia solar está massificada. As usinas solares respondem por 6,4% da energia no país. Não parece muito perto dos números que demos lá no início. E não é mesmo. Quem mudou o jogo nos últimos anos foi aquilo que as autoridades do sistema elétrico chamam de “geração distribuída”.
São as casas, empresas e propriedades agrícolas com painéis solares próprios, e que vendem seus excedentes para o sistema. 13,5% da nossa energia elétrica vem dessas fontes.
Somando as usinas e as placas “avulsas” que estão conectadas ao grid, temos que 19,9% da matriz elétrica no Brasil já é fotovoltaica. São 47,4 GW de potência instalada – o equivalente a 3,4 Itaipus.
O total, somando todas as fontes, dá 237,5 GW. O Brasil não usa tudo isso o tempo todo, naturalmente – se não estaríamos sempre com um apagão à espreita. Lá às 12h49 da terça, o consumo no país era de 80,3 GW.
Nesse horário, com o sol quase a pino no país todo, o grosso da capacidade fotovoltaica estava disponível (ao menos onde não choveu). Nisso, 30,5 GW vinham da energia solar – os 38% que mencionamos lá no início.
Ao longo da tarde, a proporção vai diminuindo, conforme a irradiação solar se apequena. Às 15h15, eram 21 GW de um consumo total de 84,1 GW; ou seja, 25%. Depois…
17h01: 5,6%
17h30: 2,0%
18h35: 0,03%
Pois é. O sol teima em desligar. Mas existem dois jeitos de ao menos adiar essa morte diária. Um é frear a rotação da Terra; o outro, certamente mais simples, adiantar o relógio em uma hora.
Às 18h, com o consumo caminhando para o pico, teríamos o sol das 17h; às 17h, com o ar condicionado dos escritórios ainda a todo vapor, o sol das 16h… Horário de Verão.
Essa hora a mais de luz faria diferença na ponta da geração. Com mais energia fotovoltaica disponível, a necessidade de acionar termelétricas diminui. A carga sobre os reservatórios das hidrelétricas, que valem ouro em tempos de seca, idem.
É isso. Aquele futuro em que energia solar teria relevância já chegou. Natural, então, que a volta do Horário de Verão venha com ele. A ver se o governo concorda.
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