Ao final deste ano, a cidade de Nova York terá recebido quase 65 milhões de visitantes, ultrapassando o número pré-pandemia. A notícia é boa. O desafio é arrumar cama para toda essa gente.
Desde 2022, dezenas de hotéis foram convertidos em abrigos para imigrantes fugidos de seus países em busca de asilo. Essa é uma das razões que provocaram o recorde nos preços das diárias, que oscilam em torno de US$ 300 (cerca de R$ 1,64 mil) – antes dos impostos adicionais.
Os turistas que recorrem ao Airbnb também enfrentam uma maré baixa: é notável a falta de estoque de apartamentos inteiros em qualquer bairro, seja por cinco ou dez dias ou até três semanas.
No último ano, a maior parte das ofertas disponíveis na plataforma são unidades adjacentes às residências de proprietários (quartos em casas/apartamentos, porões ou um segundo andar) ou quartos de hotéis – que são anunciados como “apartamentos” e com a ;frase “sem taxa de limpeza” como forma de fisgar os hóspedes.
Nesses casos, além de pagar preço de hotel, o hóspede desembolsa a porcentagem de serviço do Airbnb. “Trata-se de um quarto de hotel”, avisam usuários do Airbnb ao descreverem suas experiências na plataforma. Apesar da mordomia, não há como cozinhar e nem ter a flexibilidade de horários para chegar e partir, grandes atrativos do Airbnb.
A nova realidade resulta da implementação da Short-Term Rental Registration Law, mais conhecida como Local Law 18, uma lei posta em prática em setembro de 2023 e que proíbe aluguéis de curto prazo em residências particulares. Só estão liberadas as estadias de no mínimo 30 dias corridos. A regra vale para o Airbnb ou qualquer plataforma do gênero, como Vrbo e Booking.com. Quem descumpre a lei está sujeito a multas que podem chegar a US$ 7.500 (cerca de R$ 41,1 mil) para reincidentes. As plataformas são igualmente penalizadas financeiramente.
Festa para uns, decepção para outros
A Local Law 18 foi criada em 2022 e recebida com confete e serpentina pelas redes hoteleiras, que vinham sofrendo drasticamente com a concorrência das milhares de opções de alojamento que pipocavam em todos os cantos da cidade. O setor ainda se recuparava dos anos sombrios da pandemia, período em que o setor de turismo da cidade perdeu cerca de US$ 11 bilhões.
Para o Airbnb, a imposição da Local Law 18 foi uma decepção. A plataforma e um grupo de anfitriões vinham travando, paralelamente, duas batalhas judiciais contra a cidade de Nova York tentando evitar a implementação da nova lei. Ambos os processos foram indeferidos.
Desde a Local Law 18, a demanda por curtas estadias migrou para cidades próximas a Nova Jersey, que fica do outro lado do rio Hudson.
Hoboken, Jersey City, Weehawken, New Bergen e Union City viram a demanda por apartamentos disparar nos últimos 12 meses. Hoboken, onde nasceu Frank Sinatra, é ligada à Manhattan pelo PATH, uma espécie de metrô que conecta as duas cidades em menos de 20 minutos.
Os preços acompanharam a escalada. Duas noites em apartamento em Hoboken para quatro pessoas dormindo no mesmo ambiente pode chegar a quase US$ 700 (cerca de R$ 3,8 mil).
Regras para nova-iorquinos
Os anfitriões nova-iorquinos que desejam manter seus apartamentos em plataformas de curta locação devem registrar os imóveis para aprovação na prefeitura obedecendo a rígidos critérios, incluindo a presença do anfitrião no apartamento durante a hospedagem, além de acomodar duas pessoas por vez – uma forma de evitar festas e aglomerações que outrora importunavam vizinhos.
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Outra alternativa para anfitriões é enquadrar o apartamento no status Class B, um desafio à parte, dado que nessa categoria figuram imóveis criados exclusivamente para estadias, como hotéis e dormitórios de estudantes. É por isso que, ao procurar apartamentos no Airbnb, o hóspede recebe como resultado quartos de hotéis postados por redes como o Hilton ou M Social em regiões comerciais como a Times Square.
As farpas judiciais entre a cidade e o Estado Nova York e o Airbnb começaram há um bom tempo – lá em 2013. Em diversas tentativas de banir hospedagens ilegais, governantes estabeleceram regras e fizeram gastos milionários para encontrar anfitriões que agiam ilegalmente e multá-los (com multas também às plataformas).
A cidade tinha razões para tal: alguns cidadãos administravam simultaneamente centenas de apartamentos não enquadrados na categoria Class B, que geravam uma quantidade colossal de lixo, barulho e entra-e-sai de estranhos em prédios residenciais.
A ilegalidade dessa atividade, no entanto, difere de residentes que alugavam um quarto extra para turistas a fim de aumentar a renda mensal ou aqueles que ofereciam seus apartamentos por poucos dias, enquanto estavam fora da cidade. Esse perfil de anfitrião continua obedecendo às regras.
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Em regiões onde o Airbnb é popular, como Brooklyn, o número de apartamentos inteiros para estadias curtas minguou, enquanto há muitas opções para estadias de 30 dias ou mais. O perfil da demanda mensal vem de estudantes de cursos sazonais, recém-chegados à cidade que precisam se alojar antes de encontrar seus apartamentos, ou familiares de nova-iorquinos, como avós e avôs, que visitam por longos períodos.
As brigas na Justiça entre o Airbnb e a cidade continuaram até 2023, quando o Airbnb perdeu a queda-de-braço. Em primeiro de junho do ano passado, os anfitriões da cidade receberam uma carta dolorida por email. Na mensagem, Theo Yedinski, diretor de políticas globais do Airbnb, resumia as novas regras e detalhava a década de luta em prol de seus usuários.
Na carta, Yedinski se despede lembrando que o Airbnb foi criado durante a Grande Recessão [de 2008] e a cidade de Nova York foi uma das primeiras comunidades a aderir à plataforma.
“À medida que a cidade se recupera dos impactos da pandemia e mais famílias procuram fontes adicionais de rendimento para navegar nesses tempos de incerteza econômica, continuaremos a lutar pela capacidade dos nova-iorquinos de compartilharem suas casas, como outros anfitriões fazem em cidades de todo o mundo.”
Theo Yedinski, diretor de políticas globais do airbnb
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