Os fundos multimercado sofreram com apostas nos mercados de juros em 2024, ano em que prolongaram o período de performance abaixo da taxa de referência do CDI e viram uma fuga recorde de recursos.
Em meio à alta da Selic e um ciclo de alívio monetário mais lento que o esperado nos EUA, as apostas em renda fixa tanto no Brasil quanto no exterior pesaram nos resultados de algumas das principais gestoras.
A Vinland Capital, cujo fundo principal caiu 3,3% em doze meses, perdeu 6 pontos percentuais em posições em ativos globais de renda fixa, enquanto o mercado de juros doméstico representou um retorno negativo de 0,8 p.p. para o fundo. Na Ibiuna Investimentos, uma das principais gestoras independentes, as posições das taxas em países emergentes e do G10 tiveram o impacto mais negativo nos retornos.
As perdas nas chamadas posições aplicadas — que ganharam com juros locais menores — “tiveram papel importante” nos retornos do fundo principal da Verde Asset Management no primeiro semestre do ano, afirmou a gestora. Uma parte significativa desse recuo foi compensada no segundo semestre do ano, disse em carta de gestão.
Entre as melhores performances da indústria, fundos de JGP Asset e Genoa Capital entregaram retornos de mais de 12% após taxas em 2024, justamente com apostas em juros.
No início de ano, gestores têm ajustado o posicionamento em ativos locais após a forte pressão tanto no câmbio quando nos juros futuros vista em dezembro. A Kapitalo Investimentos começou o ano desmontando a aposta pessimista no real e espera que o governo brasileiro proponha novas medidas para controlar os gastos.
O índice de hedge funds da Anbima subiu 5,8% no ano passado, contra ganho de 10,9% da taxa CDI, que serve de referência para aplicações financeiras no país. O resultado ampliou o baixo desempenho da indústria local de hedge funds, já que o IHFA subiu 9,3% em 2023, abaixo do ganho de 13% do CDI.
Em meio à performance abaixo da taxa de referência, os multimercado registraram retiradas de R$ 357 bilhões no ano passado, o dobro dos R$ 181 bilhões de 2023 e quase quatro vezes mais que os R$ 86 bilhões um ano antes. Considerando os dados disponíveis desde 2002, esta foi uma saída recorde para a esse tipo de fundo, de acordo com a Anbima.
O desempenho decepcionante combinado a um cenário de juros elevados fez com que os investidores direcionassem mais recursos para fundos de renda fixa. Conforme a indústria do crédito privado cresce, esses fundos atraíram R$ 243 bilhões em 2024.
“O que acontece é que teve muita volatilidade. Volatilidade na moeda, volatilidade nos juros, volatilidade em ações. Está difícil para o gestor conseguir gerar” retorno, disse Cristiano Cury, coordenador do comitê de renda fixa da Anbima, em entrevista. Segundo ele, a classe de multimercado tem apresentado “dificuldade de entregar resultados” em meio a um “ciclo difícil”, de juros mais altos.
“Esse ciclo de alta de juros acaba beneficiando os produtos de renda fixa e os fundos dessa categoria captaram bastante ao longo de 2024”, disse Cury. Com taxas reais elevadas, “ninguém diversifica o portfólio”, acrescentou.
Para Ricardo Eleuterio, diretor da Bradesco Asset Management, o momento se assemelha ao período durante a crise de 2008 — quando houve uma turbulência global que atingiu os ativos também no Brasil. “Foi talvez o segundo pior semestre para a indústria de risco, de multimercado e ações”, disse ele em um evento em novembro, em referência à primeira metade de 2024.