A reação dos mercados após os ataques dos EUA e Israel contra o Irã e a retaliação da nação islâmica foi mais de nervos do que de preços. Mas não se iluda: a percepção de imprevisibilidade na região está mais forte do que nunca e vai manter a volatilidade da commodity em alta.

No cenário atual, onde tudo pode mudar a qualquer momento, as ações das petroleiras funcionam como uma proteção contra os picos de tensões geopolíticas. O analista de commodities da Levante Corp, João Abdouni, recomenda aos investidores incorporar às carteiras de renda variável papéis do setor.

O especialista recomenda aplicar em torno de 15% do portfólio de renda variável em ações de companhias de óleo e gás. O especialista cita especificamente dividir a alocação com 10% em Petrobras e 5% em Prio, uma “júnior oil” brasileira.

As crises em série desde o início da guerra entre a Rússia e Ucrânia, em fevereiro de 2022, ajudaram a manter os preços do petróleo acima dos US$ 70 e com picos de mais de US$ 120 nos últimos anos. Diante da escalada dos conflitos envolvendo Israel, o grupo palestino Hamas, o Hezbollah, no Líbano, e agora o Irã, Abdouni projeta que a cotação do barril deve se manter na atual faixa entre US$ 70 e US$ 75 nos próximos meses.

Para as empresas brasileiras do setor, o atual patamar da cotação do petróleo pode ser visto como confortável. Dá até para dizer que, de certa forma, as companhias têm se beneficiado desse pano de fundo de crise constante. Isso porque os preços mais elevados da commodity ajudam a manter uma margem de lucro elevada e um fluxo de caixa mais robusto. E isso se refletiu até aqui em maior retorno de valor aos acionistas.

Mas não é só o movimento do petróleo que tornam as petroleiras brasileiras atrativas hoje. No caso da Petrobras, a política de distribuição de dividendos (que beneficia primeiramente o governo, embora essa seja uma outra história) tem sido muito favorável ao investidor. E, portanto, ajuda a explicar a valorização do papel.

A companhia distribuiu R$ 422 bilhões em proventos de 2022 até o momento. No período, a ação preferencial da petroleira saiu de R$ 19,50 em janeiro de 2022 para R$ 32 no fechamento desta segunda-feira. Trata-se de um ganho de 64% no período só com o papel.

Já a Prio aproveitou o maior fluxo de caixa para investir na aquisição de novos campos de óleo e gás. A companhia concluiu em 2023 a aquisição do campo de Albacora Leste pelo qual pagou cerca de US$ 2 bilhões. Em maio de 2025, comprou da Equinor 60% do campo de Peregrino por US$ 3,5 bilhões. A empresa aproveitou ainda os recursos da alta do petróleo para revitalizar o campo de Frade, que assumiu em 2020.

O resultado foi um salto na cotação da ação da Prio. O papel saiu de R$ 20,29 em janeiro de 2022 para R$ 43,25 no fechamento da segunda-feira. A variação representa uma alta de mais de 113% no período.

Outras “junior oils” brasileiras, a Brava e a PetroReconcavo, também são boas opções de investimento no cenário de crises no Oriente Médio. Mas, diferentemente do que acontece com Petrobras e Prio, essas companhias ainda não conseguem se beneficiar tão diretamente da alta do petróleo. A Brava, por exemplo, tem um custo de produção mais elevado. E a PetroReconcavo tem operações predominantemente em terra firme. Isso significa que o potencial se produção também é menor. Com isso, a companhia reage com menor intensidade às escaladas de preços da commodity.

Vai subir mais?

A ameaça do Irã de fechar o estreito de Ormuz, por onde passam entre 20% a 25% da produção mundial, poderia levar a uma nova escalada nos preços do barril, o que reforçaria os ganhos das petroleiras. O Morgan Stanley estimou em relatório que a cotação do referencial global, o Brent, pode superar de novo os US$ 100 o barril, caso os ataques se concretizem

A probabilidade de uma ação tão radical, porém, é considerada baixa. “Um bloqueio total tem baixa probabilidade”, afirma o economista-chefe da Suno, Gustavo Sung. O analista da Levante acrescenta haver riscos muito elevados para o Irã apertar esse botão.

“Grande parte do petróleo que circula pela região se destina à China, que faz pressão para o Irã não adotar esse tipo de retaliação.” Além disso, ataques a navios na região podem tornar outras nações, como a Arábia Saudita e Omã, suas inimigas.

Além disso, no médio prazo, as perspectivas são de retomada de uma retomada dos preços do petróleo. Os fatores que levaram os preços da commodity para perto dos US$ 60 o barril entre abril e junho deste ano ainda persistem. Sung vê os eventos recentes como choques de curtíssimo prazo.

“Os fundamentos do mercado no médio prazo que têm pressão baixista continuam: a ampla oferta liderada por países fora da OPEP+ e o retorno gradual da produção do cartel continuam definindo a dinâmica do mercado, reforçada pela perspectiva de menor demanda global e pela recomposição dos estoques internacionais.”

As companhias brasileiras, entretanto, navegam em águas favoráveis em termos de perspectivas no médio e longo prazos. A possibilidade de desbravar uma nova fronteira de produção, a Margem Equatorial, que pode representar quase um novo pré-sal para o país, representa um trunfo para o setor. A região se tornou, por exemplo, a engrenagem principal dos planos da Petrobras para os próximos anos.

A produção da área localizada no Norte do país pode levar a Petrobras a disputar um lugar no pódio das maiores produtoras de petróleo até 2030. Caso o preço do petróleo se mantenha estável, significa turbinar ainda mais a distribuição de dividendos. E a corrida já começou. No leilão realizado pela Agência Nacional de Petróleo (ANP), em 17 de junho, o consócio liderado pela Petrobras arrematou cinco blocos na Margem Equatorial.